quinta-feira, 8 de setembro de 2016

Como Suportar o Sofrimento

  Todos os que entram na gnose querem imediatamente desenvolver poderes ocultos; isso é grave. Nesses estudos achar pessoas com fé é difícil. As pessoas acreditam que o caminho para a realização do Eu Interior é como praticar futebol ou jogar tênis. As pessoas ainda não aprenderam como encarar isso com seriedade. É comum começarem esses estudos com o desejo de adquirir poderes em poucos meses. Quando, porém, caem em si de que precisam ter paciência e dedicarem-se duramente para isso, então, desapontados, partem em busca de outra escola. É desse modo que desperdiçam suas vidas: fugindo de uma escola para outra, de uma loja para outra, indo de instituto a instituto, até se tornarem velhos e morrerem sem terem conquistado nada. Assim é a humanidade. Pode contar-se nos dedos das mãos quem esteja se preparando com verdadeira seriedade para a prática do adeptado.
trials of job
  Amados discípulos, vocês precisam desenvolver intimamente cada um dos vinte e dois Arcanos Maiores do tarô. Vocês são “imitatus”, ou melhor: daqueles a quem outros os colocaram no caminho do Fio da Navalha. Exortem-se a si próprios a tornarem-se Adeptos: aqueles que são produtos de suas próprias obras; que por si só conquistam a ciência; que são os filhos de seus próprios trabalhos. – Curso Esotérico de Cabala Alquímica [The Esoteric Course of Alchemical Kabbalah]

  Sucedeu um dia, em que seus filhos e suas filhas comiam e bebiam vinho na casa do irmão primogênito, que veio um mensageiro a Jó, e lhe disse: os bois lavravam, e as jumentas pasciam junto a eles; de repente deram sobre eles os sabeus, e os levaram, e mataram aos servos ao fio da espada; só eu escapei, para trazer-te a nova. Falava este ainda quando veio outro e disse: Fogo de Deus caiu do céu, e queimou as ovelhas e os servos, e os consumiu; só eu escapei, para trazer-te a nova. Falava este ainda quando veio outro e disse: dividiram-se os caldeus em três bandos, deram sobre os camelos, e os levaram, e mataram os servos ao fio da espada; só eu escapei, para trazer-te a nova. Também este falava ainda quando veio outro, e disse: est ando teus filhos e filhas comendo, e bebendo vinho, em casa do irmão primogênito, eis que se levantou grande vento da banda do deserto, e deu nos quatro cantos da casa, a qual caiu sobre eles, e morreram; só eu escapei, para trazer-te a nova. Então Jó se levantou, rasgou o seu manto, rapou a cabeça, e lançou-se em terra, e adorou, e disse: nu sai do ventre de minha mãe, e nu voltarei; o Senhor o deu, e o Senhor o tomou; bendito seja o nome do Senhor. Em tudo isto Jó não pecou, nem atribuiu a Deus falta alguma”. – Jó 1.13-22

  A história de Jó é uma de iniciação. Jó, na Bíblia, é um personagem que nos ensina sobre esta paramita [ou perfeição], da paciência. Porém, essa paramita, ou atitude consciente, não é paciência no sentido de ser passivo. Ou no sentido de deixar as pessoas fazerem para nós o que achem melhor. Paciência é uma força muito ativa e requer grande esforço. Outra palavra que podemos usar é disciplina – de resistência. E esses termos alternados descrevem mais acuradamente a base, a função e o sentimento da paramita da paciência.

  Até agora, em nossa análise das paramitas, temos já olhado duas com alguns detalhes. A primeira é generosidade e a segunda é disciplina ou ética. E essas são atitudes conscientes, ou em outras palavras, qualidades da mente. Não são aforismos ou regras de ouro que repetimos a nós próprios ou lembramos-nos deles; essas são estados do ser que são inerências da natureza da mente, mas se tornaram obscurecidas por nossos próprios egos, pela natureza de nossas próprias psiques subjetivas. Então, para completa experiência, completo desenvolvimento ou inteira ativação dessas atitudes ou conscientes qualidades, precisamos remover os obscurecimentos, os filtros, as garrafas que aprisionam as Consciências.

  Quando tratamos das paramitas em termos de níveis Bodhisattva ou bhumis, essas três podem assim serem chamadas:
   1. Generosidade: alegria perfeita.
   2. Disciplina: imaculada.
   3. Paciência: luminoso.

  Luminoso significa “luz, iluminação, algo que dá luz; algo que proporciona luz ou irradia”. A primeira paramita, generosidade, é a intenção do Bodhisattva, a verdadeira natureza de Bodhichitta, que é “o despertar da mente da compaixão e compreensão do Vazio”. A generosidade do Bodhisattva é aquele amor bondoso, a compaixão combinada com sabedoria, que configura uma intenção; é o caminho à frente, o sentido de direção, o propósito, uma meta, uma razão de ser.

  O Bodhisattva, como o termo define, é a encarnação da essência da sabedoria, o veículo para a luz de Cristo. Então, um Bodhisattva é aquele que expressa a vontade de Deus em todas as suas ações. E essa expressão deve convergir através de uma mente clara e límpida, algo que não detenha obscuridade para aquela expressão ser perfeita. A motivação diretora da luz é o amor, a generosidade, amor por todos os seres sem distinção, sem restrição. Há uma oração muito antiga a mencionar: “Que todos os seres sejam felizes. Que todos os seres sejam ditosos. Que todos os seres sejam em paz”.

  Ela não diz: “Que todos os seres sejam felizes..., exceto meu chefe, meus inimigos, meus vizinhos”. São todos os seres, sem exceção. Esta é a intenção, a vontade, aquilo que guia a luz de Cristo, a sabedoria que ilumina todos os Budas, todos os Anjos, todos os Deuses. E aquela luz – expressada – torna-se o caminho, torna-se Bodhichitta.

  Assim, como um aspirante, como alguém que tenta encarnar àquilo, temos esses passos, as práticas, os processos aos quais adentrarmos. O primeiro é esta generosidade; é começar a cultivar a atitude de Bodhichitta. E lembrar que atitude são ambos: a compaixão a todos os seres sem exceção, e compreensão do Vazio. Compreender o inerente Vazio de todos os fenômenos é crítico. E cabe-nos entender que precisamos das demais paramitas. Quando essa intenção esteja sedimentada e comecemos a definir-nos, dizendo-nos: “Eu quero cultivar aquela qualidade do amor”, então começamos com aquela inspiração, aquela intenção. Esta é a primeira paramita, ou, em outras palavras, o primeiro fator, porém é o fator que necessita ser trabalhado, por que detemos obscurecimentos, temos problemas em nossas mentes, sofremos.

  Sofremos pelo orgulho, medo, inveja, ciúme, gula, incerteza, dúvida e por causa disso precisamos aprender a disciplina de que já tratamos em anterior palestra. Esse é o segundo fator. Em outras palavras é como aprendermos a disciplinar nossas mentes.

  Ao observarmos essas duas forças, precisamos considera-las à luz das três forças que estudamos na Gnose. Essas três são simbolizadas na forma de um triângulo. Temos três triângulos na Árvore da Vida e cada triângulo é uma expressão da Lei dos Três. É a estabilidade da Lei dos Três que cria quando três fatores estão em equilíbrio.

  A primeira força é a intenção, a ideia, a vontade; esse é o primeiro Arcano do Tarô, que é chamado o Magista, e o magista é o “mago”, o sacerdote, o Ser, a Consciência, aquela que expressa o Cristo, o amor. Desse modo, no caso das paramitas, o primeiro Arcano, o primeiro fator, a primeira força, seria a generosidade, amor, a intenção de se tornar um Bodhisattva. Porém, há fatores que se opõem a isso: fatores em nós. Podemos ter a intenção, mas dentro de nossas próprias mentes há muitas resistências a isso; forças opostas a essa intenção. E aquelas forças opositoras as conhecemos como ódio, orgulho, vergonha, medo e toda uma multiplicidade de entidades existentes dentro de nossas mentes. Todos aqueles fatores opõem-se a essa intenção, a pura intenção de nos tornarmos um Bodhisattva. Podemos também ter intenções egoístas de nos tornarmos um Bodhisattva, por que nosso orgulho quer ser admirado, quer ser especial, diferente. Esse desejo egoísta é realmente um fator opositor a real, sincera, devotada intenção de cultivar o Bodhichitta.

  Então, coloquemos isso em nossa imaginação, esses dois fatores opositores:
  1. A intenção
  2. A resistência

  A resistência é nossa própria mente, nosso ego. Eis por que indicamos a segunda paramita: disciplina. Ela está lá para controlar os fatores de oposição que são nossas próprias psiques. Porém, com esses dois sozinhos há unicamente conflito e observaremos isso em nós próprios.

  Quando desenvolvemos uma ideia de fazer algo, imediatamente brotam, como mágica, todas as forças opositoras. Digamos que precisemos encontrar um emprego e tão logo esta intenção se pronuncie e a ideia esteja em mente, então todas as dificuldades se levantam; ali estarão todas as coisas que necessitamos superar a fim de, realmente, conseguirmos o emprego. Haverá dificuldades dependendo das circunstâncias, do carma.

  A fim de alcançarmos completamente nosso objetivo não bastará a mera intenção de realizarmos. Necessitamos de disciplina e resistência, tolerância e paciência. De novo, lembremos-nos que paciência não é passividade; é sermos ativos. Assim, se necessitamos de um emprego e o queiramos, mas estejamos face a todas as oposições e dificuldades e, digamos que a carreira que buscamos seja muito competitiva, não havendo muitos empregos disponíveis, então teremos de competir contra tudo isso, mais ainda: teremos nosso próprio orgulho que nos fará pensar que merecemos coisa melhor do que esse emprego disponível; e ainda, poderemos ter nossa própria preguiça que não nos queira a preparar nosso currículo, que não nos queira realmente a enfrentar uma processualidade de entrevistas, que não nos queira de fato a lidar com o assunto. Todas essas são forças da resistência. Se nós simplesmente tivéssemos a intenção e víssemos aquelas forças da resistência, pararíamos sem mesmo tentarmos. Assim, concluindo, temos de nos disciplinar para fazermos as coisas que necessitamos fazer; esta é a segunda paramita. Mas para isso precisamos da [contra]resistência para combatermos aquelas dificuldades e trabalharmos sobre elas a fim de as ultrapassarmos. Esta é a terceira força: paciência, aceitação, resistência.

  Em outras palavras, paciência é a capacidade de superarmos e transformarmos dificuldades. Paciência não significa simplesmente recebermos o sofrimento e sofrermos. Significa transformarmos o sofrimento para nosso benefício, e há um significado muito distinto entre aquelas duas proposições. A diferença é a vontade. O que estamos realmente discutindo quando evocamos resistência, aceitação, paciência, é a força de vontade.

  Voltando ao nosso exemplo, tenhamos a intenção de conseguirmos aquele emprego. Então, possuímos a disciplina para controlarmos nossas mentes, já que ela luta contra nós tentando nos obstar de conseguirmos o emprego para desistirmos e ficarmos a lastimar. Assim, temos a vontade para sermos pacientes e finalmente conseguirmos.

  De modo geral, quando observamos grandes obras como as sinfonias de Beethoven, ou uma grande pintura, como de Botticelli, temos a ideia de que foi fácil para aquelas pessoas assim as realizarem e desejamos que pudéssemos ter a mesma capacidade. Mas, verdadeiramente, nada que valha a pena é fácil realizar, nada. Os grandes Mestres que produziram fantásticas e imortais obras de arte não alcançaram o momento daquelas criações meramente por acaso, por um presente de Deus; mas trabalharam, praticaram, tiveram disciplina e resistência.

  Yogananda deu-nos um verdadeiro bom exemplo disto; ele disse que todos admiramos a habilidade de um pianista concertista, e é verdade se realmente observarmos que um hábil pianista clássico faz tudo parecer tão fácil que desejaríamos fazer aquilo. Porém, o que desejamos é sermos capazes de nos sentarmos diante do piano e fazermos aquilo sem termos trabalhado para tal. Esquecemos-nos do fato de que para chegar àquele nível, aquela pessoa vem praticando por oito ou dez horas diariamente há anos; ela não consegue realizar aquilo tirando do nada. Tudo é baseado em causas e condições; tudo tem raízes que produzem resultados. Assim, pessoas que tenham habilidade para tocar um instrumento daquela maneira devem ter praticado e estudado. Elas têm o desejo, a intenção, a motivação para aprender, e todas têm pessoalmente uma resistência; todas elas têm suas preguiças, as dificuldades da vida, dificuldades de sobreviver financeiramente para realizar-se num tipo de carreira como aquela, mas a paciência, a resistência, o autodomínio entram em cena. Assim, quão verdadeiro é isso que Yogananda diz, "of Meditation?"

  Todos – como estudantes desses ensinamentos – amaríamos ser mestres do samadhi, como ressalta Mestre Samael. Porém, queremos que isso seja fácil; que possamos ler um par de páginas de um livro, irmos meditar e “buumm”, termos mestrado em samadhi. Mas, a realidade não é assim. Adquirir mestrado em samadhi requer mestrado em nossas próprias mentes, e isso não nos chega pelo estalar dos dedos, ou lendo um livro; vem mesmo através da resistência, da abnegação. No budismo, essa paramita da paciência, ou resistência, é vista como tendo três formas primárias, ou há três caminhos em que é analisada para ser compreendida.

  1. Resistência quando magoado.
  2. Resistência quando em dificuldade / sofrimento.
  3. Resistência, com segurança, pela natureza do problema / realidade.

RESISTÊNCIA QUANDO ESTIVERMOS SENDO MAGOADOS

  Isso se refere à habilidade de manter o controle sobre a mente, controle sobre a tensão para reter a concentração, a consciência desperta naqueles momentos quando alguém nos está magoando. Por exemplo: se alguém nos está criticado devemos ser capazes de manter a generosidade – a primeira perfeição – manter a disciplina da mente, e administrar essas duas com a força de vontade, com a resistência. Então não podemos assim ver como essas três inter-relacionam? A qualidade da paciência ou resistência está ali e é necessária nesse estágio, uma vez que temos já adquirido algum grau de generosidade, a motivação para a disciplina. A resistência está ali para nos ajudar a manobrar com elas, sustenta-las, a proteger nosso Bodhichitta. Uma vez que tenhamos a intenção de nos tornarmos vasos de Cristo e veículos da sabedoria a fim de servir a humanidade sofredora, necessitamos cultivar Bodhichitta e também protegê-lo. A disciplina é parte de como fazê-lo; temos que proteger nosso Bodhichitta com nossa própria bondade e paciência, com nosso próprio amor e disciplina, mas também precisamos ter paciência.

  Paciência, nesse sentido, ou resistência, não significa que busquemos erradicar o nocivo ou a circunstante dificuldade. Temos a intenção de eliminarmos o sofrimento sim, entretanto de forma alguma podemos eliminar todos os seres nocivos que existem e claro está que não é esse o nosso objetivo. Nosso objetivo não é eliminarmos seres nocivos, mas eliminarmos o sofrimento, isso é diferente. Alguns ensinamentos apresentam o ponto de vista de que temos de “eliminar os inimigos, os infiéis, os descrentes” e esse é um caminho errado do pensamento ao acharmos que temos de eliminar outras pessoas, outros seres; isso não é verdade. Ao invés disso, temos de olhar a vida em termos de Bodhichitta.

  Todos os seres são como vocês, como eu, que querem a felicidade e estamos naturalmente imbuídos de encontrarmos a felicidade, a alegria. O Dalai Lama ressalta que se ouvirmos de um reino de felicidade ou lugar paradisíaco onde não haja guerra, pobreza, fome, estupro, abuso, mas ao invés disso haja serenidade, paz, alegria, aceitação, cooperação, amizade, amor: todos nós, sem exceção, haveríamos de querer lá estar. Porém, se ouvirmos de um lugar onde haja guerra, dor, violência, destruição, abuso, estupro, morte, não haveríamos de querer lá estar. Isso ilustra um aspecto fundamental da natureza de nossa psique, que é exatamente de todos querermos amor e paz. Por conseguinte, precisamos compreender que todos compartilhamos dessa aspiração, e a meta de Bodhichitta é prover-nos disso. Não é eliminando pessoas, mas provendo-as com felicidade.

  Quando estivermos sendo maltratados por alguém, isso se torna num importante ensinamento para usarmos a fim de treinarmos nossas mentes. Lembremos que a pessoa que nos está maltratando é um ser como nós, porém aquela pessoa que maltrata se encontra simplesmente identificada com sua raiva e seu ressentimento, com seu ódio e seu orgulho. Nossa tarefa, nesse caso, é transformar nossa mente, a nossa reação.

  Quando analisamos uma pessoa que esteja enraivecida, vemos que ela está sofrendo; a raiva não é de forma alguma agradável. E quando a experienciamos, podemos provar de seu gosto por nós mesmos. O objetivo, a intenção da raiva é ferir. Dessa forma, a raiva pode ser vista como o oposto de Bodhichitta, o oposto do amor. Raiva é realmente ódio, que é uma qualidade [oposta] ou emoção negativa que procura fazer as pessoas sofrerem, os seres sofrerem. Não somente isso, pois quando experienciamos a raiva, ela nos faz sofrer também.

  Então, o que há de bom na raiva? De que bem pode a raiva nos prover? Infelizmente, nesses tempos há aqueles que debatem a raiva com o fito de protegê-la, de encorajá-la. E isso está claro quando assistimos programas de TV ou filmes em que a raiva está glorificada, mostrada como algo admirável. Porém, em verdade não é; a raiva é uma forma de sofrimento, uma forma dolorosa de sofrimento. Ainda mais se insistimos em alimentá-la e isso acontece quando ignoramos suas raízes; assim falhamos em abranger o que a raiva realmente seja; assim perpetuamos o sofrimento.

  Naturalmente que a base desse ensinamento é aprendermos como nos observarmos e mudarmos. Se aprendermos realmente olhar a raiva, observando-a, entenderemos que ela é uma forma muito conturbada de energia. Quando estamos tomados de raiva não conseguimos dormir, podemos perder o apetite, nos tornarmos obsessivos. A mente se põe tão fixada naquilo que imagina ser a fonte da raiva, que se transforma numa besta, num animal fora de controle. Alguém que esteja realmente identificado com sua raiva se torna completamente aquela besta e é capaz de extrema violência. Podemos atestar isso em casos de pessoas quando não inseridas naqueles conflituosos momentos, que são bastante agradáveis, cativantes, até mesmo doces. Porém, quando a raiva toma suas mentes elas não possuem a capacidade de controlá-la, e aquela pessoa doce é capaz de matar. Cada um de nós tem aquela docilidade intima. Entretanto, temos também aquela raiva, a capacidade para a violência. É possível que não a tenhamos ainda experimentado; talvez não tenhamos estado em circunstâncias de aflorá-la, mas o que seríamos? O que faríamos se tais circunstâncias acontecessem? Podem acontecer. É importante para nós aprendermos a proteger a mente, a nos disciplinarmos.

  Quando realmente prestamos atenção à raiva vemos que uma pessoa ao ficar enraivecida começa a comportar-se como um lunático. Alguém ao tornar-se enraivecido tem até a capacidade de maltratar aqueles a quem ama. Isso é de fato a grande tragédia em que nossa sociedade desses tempos mergulhou, falhando ao não entender do extremo perigo da raiva. É por isso que os vários mestres de diferentes ensinamentos, quando observam às causas raízes do sofrimento, atribuem à raiva como sendo sempre uma delas. No Bhagavad-Gita, Krishna identifica três portas para o inferno e a raiva é uma porta. Nos escritos de Samael Aun Weor ele identifica três portas para o sofrimento e a raiva é uma delas. Não podemos nos perder com a raiva. Nas tradições tibetanas eles têm um ditado que diz: “Não ceda mesmo a uma agulha por que ela demandará mais espaço”. Então não saberíamos quão pequena é uma agulha? Assim mesmo, precisaríamos trazer nossa atenção tão focada e refinada que não permitíssemos às nossas mentes até mesmo a uma fresta de negatividade, pois aquela fresta poderia corromper algo inteiro, imiscuindo-se por todo um caminho e vir destruindo. Realmente, é isso que toda a raiva quer, a destruição. A raiva quer causar danos, nada mais. Desse modo, ao voltarmos nossa atenção para a raiva, estando, pois, anelados a algo como dificuldade, dor, frustração, precisaríamos analisar o que estará vindo de nossos íntimos e nos inquirirmos: por que fiquei enraivecido?

  Tenho ouvido alguns professores afirmar que a raiva emerge por causa do orgulho ou medo, porém por minha experiência eu discordaria; diria que isso não é o quadro completo. Diria que a raiva emerge por causa do desejo; desejo frustrado. O desejo frustrado pode advir de um número qualquer de agregados da mente e não exatamente do orgulho e medo. Podemos descobrir isso ao viajarmos. Viajar é muito frustrante, especialmente se viajamos a um país ou a uma parte do mundo que tenha poucas amenidades. Digamos, por exemplo, que ao irmos em viajem, a natureza de nossas experiências nos impeça de termos acesso à comida – o que pode facilmente acontecer dependendo a qual parte do mundo viajemos. Podemos estar com dificuldades de encontrarmos alguma coisa boa e segura para comermos por um dia ou mais. Não ficaríamos então com raiva? Quão facilmente ficamos enraivecidos por causa de comida! Se estivermos atrasados para conseguirmos nossos almoços ou jantares, alguns de nós ficaremos enraivecidos. E pelo que estaremos com raiva? Essa é a coisa mais interessante de todas: pelo que nos tornamos enraivecidos? O mundo todo é imprecado por que estaremos com fome... Essa é uma boa experiência para passarmos se a transformamos, pois demonstrará a fraqueza da mente. A mente que temos é muito fraca. Necessitamos da vontade para dominarmos esse tipo de mente e treiná-la.

  Assim, por exemplo, se estamos preparando a nossa refeição e nos cortamos com a faca; pelo que ficamos com raiva por isso? Conosco ou com a faca? Ou se fechamos a porta do carro em nosso dedo? Pelo que ficamos com raiva por isso? Tenho visto pessoas que fazem isso e ao ficarem com raiva dão chutes no carro. Não é culpa do carro; é a estupidez das pessoas que não as deixaram prestar a devida atenção. Entretanto, elas não ficam ensandecidas consigo próprias, ficam com raiva do carro. Mesmo nesse aspecto a raiva não tem serventia, não resolve nada. O que ela nos passa? Se fecharmos a porta do carro em nosso dedo e ele doer, por que a raiva iria resolver? O dano está feito, então por que ficarmos com raiva?

  Se alguém nos critica, nos ataca, nos endereça algo magoante, então nesse caso é fácil ficarmos com raiva; é uma reação bastante habitual respondermos com raiva a uma critica a nós direcionada, mas não nos ajuda em nada e só demonstra uma falta de compreensão e entendimento. É-nos sobremodo importante nos fecharmos a analisar nossas experiências com a raiva.

  Vejamos outro exemplo a uma dada experiência que nos torna agressivos. Esse exemplo é trazido por Shantideva em Bodhicharyavatara, que é naturalmente “O Caminho de Vida do Bodhisattva” de que estamos tratando. Nesse livro, ele ressalta e analisa o caso em que alguém nos fere com uma arma. Normalmente, quando somos agredidos ou feridos, ficamos com raiva e nossa raiva é direcionada à pessoa que nos golpeou. Porém, precisamos analisar. O que realmente causa a interação entre a arma e o corpo? O sofrimento que sentimos está realmente no corpo, pois o corpo é aquilo que produz a dor, então por que não ficarmos com raiva do corpo? A dor estará ali. Outro ponto: a arma nos fere e causa-nos dor; então, por que não ficarmos com raiva da arma? Ao invés disso, ficamos com raiva da pessoa. Entretanto, será a pessoa realmente a portadora da total responsabilidade daquilo? Se não estivéssemos lá, logicamente não teríamos sido feridos. Assim, por que não estarmos com raiva de nós mesmos? Colocamos-nos lá e somos parcialmente culpados. Não somente isso, mas há também circunstantes fatos – uma situação por inteira – há todos os fatores que provocaram o conjunto desses vários elementos. Por que não ficarmos com raiva de tudo isso? Dai, por esse exemplo, nos é possível analisarmos da miopia, ignorância e loucura da raiva.

  A raiva não é lógica, é uma forma de paixão que não é agradável; E temos esse problema de nos tornarmos vitimizados pela nossa própria raiva. A raiva cresce e detém seus próprios pensamentos, sentimentos e intenções; dai precisarmos entender profundamente a isto. Quando a raiva nos vem o que ela pretende? Precisamos ter autoconhecimento, completa atenção e analisar a intenção. A raiva que sentimos, o que ela quer? Quando fizermos uma autoanálise sejamos sinceros. Ao sentirmos raiva será ela realmente justificável?

  A raiva existe em harmonia com nossa real intenção, que é Bodhichitta? As escrituras dizem não, os ensinamentos dizem não. Não há um caso em que a raiva seja justificável, nunca. Nesse instante vocês provavelmente estarão pensando: “Como então Jesus ficou raivoso com os vendedores no templo? Como então aqueles ferozes Deuses que vemos? E as divindades ferozes nas diferentes tradições que pareceram raivosas?”.  Entretanto, não confundamos ferocidade com raiva. Raiva é um ego, um defeito, é uma forma de sofrimento. E ferocidade, ou natureza feroz não é assim. A raiva é um estado de sofrimento e se conseguirmos analisa-la como tal podemos começar a nos libertarmos de sua influência.

  Quando experienciamos um estado de raiva, uma coisa muito boa que permanece em nossas mentes é que a raiva é temporária, desse modo sejamos pacientes: que não ajamos. Quando o estímulo da raiva está lá incitando-nos, a melhor coisa a fazer é relaxar. Eis por que os psicólogos de nossos tempos nos dizem sempre para contar até dez! Quando ficarmos raivosos, contemos até dez, é um bom conselho, muito bom conselho: relaxe, controle-se, não aja, espere! A raiva, notamos isso, nos estimula a ferirmos os outros e isso é tudo o que ela realmente faz; pretende ferir. Dessa maneira, se estamos levando seriamente a intenção de desenvolvermos o Bodhichitta, de desenvolvermos a compaixão mental, precisamos estar muito coesos com esse inimigo da raiva e não nos permitirmos ceder mesmo a um espaço de uma agulha: sejamos muito rigorosos.

  Quando estivermos tratando com alguém que esteja com raiva, isso também é muito desafiador. Nossa tendência é replicarmos também raivosos, certo? Se alguém nos vem zangado e enraivecido nos detonando com suas palavras e emoções, nossa reação normal é também nos tornarmos raivosos. Não devemos externar a raiva, expressando-a, devemos internaliza-la de volta. Isso nos torna depressivos. A depressão é a raiva internalizada eis tudo o que ela é. As pessoas em depressão estão com raiva, porém elas não manobram com suas raivas. Então, a melhor coisa a fazermos quando alguém vem a nós com raiva é relaxarmos, olharmos para a pessoa e entendermos como ela sofre, entendermos o sofrimento que ela está suportando, o quanto de sua raiva está causando aquela dor; desse modo teremos a compaixão e amor por ela, por que ela sofre, está em conflitante dor.

  Se nossos filhos estivessem com dor, sofrendo, não ficaríamos zangados com eles. Se fôssemos um médico e tivéssemos um paciente que nos visitasse com muitas dores, jamais ficaríamos zangados com ele, desejaríamos ajuda-lo a aliviar aquelas dores. A raiva é justamente um mal, uma doença, uma enfermidade da mente, do coração. Assim ao estarmos face à raiva devemos nos lembrar disso; a pessoa que esteja sofrendo com a raiva está doente. Ficarmos com raiva dela é somente tornarmos as coisas piores para ambos.

  Ao experimentarmos a raiva sabemos que ela tem uma peculiaridade do fogo, certo? Um sentimento fervente destemperado. O que acontece quando adicionamos fogo ao fogo? Mais sofrimento.  Então, responder à raiva com raiva não tem serventia.

  A melhor coisa a fazermos é responder com docilidade. Não com santimônia! Não finjamos docilidade por que isso tornará a pessoa mais ainda enraivecida: sejamos sinceros. Docilidade é o grande poder para derrotar a raiva. Nada detém maior poder do que a docilidade e se trabalharmos com ela a descobriremos para nós próprios.

  Administremos primeiro nossa própria raiva; quando ela crescer sejamos disciplinados, mas também doces conosco. Se alguém a quem amamos estiver enraivecido, sejamos doces, pacientes e tolerantes com ele/ela, e descobriremos que a docilidade natural, o amor natural podem transformar completamente não só às nossas próprias mentes bem como às mentes de outras pessoas. Ao descobrirem que suas raivas não nos estão afetando, as raivas se dissiparão; então, poderemos resolver qualquer que seja o problema. Porém, enquanto a raiva estiver ativa o problema jamais será resolvido uma vez que a raiva não ficará satisfeita enquanto não ferir alguém.

Dizem que nunca se deve ir para a cama com raiva; isso é uma coisa verdadeira. É por que ao irmos dormir nosso estado mental, naquela hora, reflete a qualidade daquilo com que entraremos no mundo dos sonhos e se estivermos zangados, agitados ou aborrecidos naqueles momentos, levaremos essa bagagem emocional para dentro dos sonhos e será isso que experienciaremos durante a noite inteira: o Klipoth, o mundo onde o ódio reside – os níveis submersos da mente, o inferno – onde temos pesadelos. O melhor a fazer se estivermos com raiva à noite, é meditar, relaxar, dar-nos algum bom alimento psicológico, ouvir alguma bela música, ler poesia, trabalhar alguma arte, fazer arte, dar um passeio, fazer algo que clareie nossas mentes.

  Então, quando estivermos lidando com pessoas raivosas precisaremos entender que a força da raiva é bastante projetiva. Ao aprendermos a receber aquela impressão – a energia com doçura – poderemos dissipar a outra força. Eis por que nos livros de Samael Aun Weor ele diz: “Precisamos aprender a receber com alegria as manifestações desagradáveis de nossos companheiros”.

  A qualquer coisa que as pessoas nos façam precisamos receber com paciência e tolerância e não replicarmos com raiva. E podemos observar as vidas dos vários Mestres a inspirar-nos nesse particular. Jesus foi torturado, açoitado, agredido, cuspido e ridicularizado e ainda assim não ficou enraivecido. Aquilo não foi falso; ele não estava fingindo docilidade como fingem muitas pessoas que se dizem espiritualistas; suas atitudes face a esses sofrimentos foram para ele naturais, por que ele tinha treinado a si próprio a tal grau que não havia qualquer raiva nele. Por conseguinte, quando as armas o golpeavam não havia um “ai”, em réplica, com raiva, não havia um ego que pudesse reagir; havia somente Bodhichitta, que é a mente compassiva.

  Mestre Samael comenta que se alguém nos critica podemos considerar isso como um cheque de um banco, pois se preenchemos um cheque e não exista dinheiro no banco o cheque não tem valor. É a mesma coisa da crítica: não existindo “eu” a crítica é vazia. As pessoas podem dizer o que quiserem, mas não havendo “eu” não há “a mim”, não há nem ego, orgulho ou reação. No entanto, isso é algo ao que devemos ainda nos trabalhar por que nesse exato instante não nos encontramos nesse nível. Isso é bom ser lembrado nos momentos em que sejamos atacados, em que estejamos face às dificuldades. Dizemos isso por que precisamos disciplinar nossas mentes. Provavelmente, teremos ouvido do ditado que diz: “somente o culpado sente a acusação”. Daí, quando alguém nos critica e fere, devemos nos sentir agradecidos por que no momento em que nós, gnósticos, descobrimos um ego em nossas mentes é motivo de grande alegria.

  O ego é algo que nos causa sofrimento. Se não conseguirmos encontrá-lo não poderemos eliminá-lo, assim nosso sofrimento continuará. Porém, se alguém nos critica e a dor está ali, então temos algo no que trabalhar. Na verdade, devíamos ser agradecidos àquela pessoa por nos criticar. Ela nos fez um favor: ela nos mostrou o que era preciso mudar em nós e isso é uma grande coisa.

  O budismo fala de dois campos nos quais o iniciado trabalha. Assemelham-se ao modo como o fazendeiro trabalha o campo. Assim é que no primeiro campo encontram-se todos os budas e no segundo estão todos os demais seres que existem. Os budas não podem ajudar-nos a desenvolver a paciência. Os budas não podem ajudar-nos a desenvolver a resistência, a tolerância. Os budas não nos podem ensinar o caminho, mas precisamos dele. Na verdade, o que podem fazer é nos prover da assistência ao que precisamos. Não obstante, somente aqueles que nos podem ensinar a sermos pacientes, tolerantes, compassivos, são exatamente os que nos são hostis. Assim, em realidade, necessitamos de ambos a fim de alcançarmos a libertação. Se unicamente existissem budas eles só nos tratariam com amor, docilidade e compaixão; em consequência, nunca enxergaríamos os nossos defeitos e desse modo permaneceríamos em nosso nível da ignorância e sofrimento. Mas, felizmente, temos a nosso redor um grande número de seres hostis. Isso é sorte no sentido de que podemos aproveitar essas circunstâncias que são a base do tantra, ou seja, podemos transformar a energia, tomá-la e fazer dela algo de bom, de utilidade, modificá-la através da vontade.

  Nessa visão, quando as pessoas nos dirigem suas raivas, quando nos criticam, atacam e perseguem, não significa que aquilo que nos fazem seja o certo; que devíamos passivamente permitir-lhes cometer erros contra nós. O que significa é que devemos cultivar a qualidade da mente de não tornar-se enraivecida, mas ao contrário: de receber a impressão e tratar a circunstância com boa aceitação, pois representa uma oportunidade de mudarmos, e precisamos daquilo. Nessa linha, podemos considerar que nesses tempos em que vivemos estejamos profundamente amadurecidos para transformações – para nós próprios – uma vez que são tempos muito difíceis; há muitos seres hostis no mundo, inúmeras dificuldades, inúmeros sofrimentos e enorme ignorância.

  Quando encontramos ignorância, pessoas prejudiciais, devemos aprender a transformar nossas mentes e tratar essas pessoas com compaixão e bondade. Em verdade, devemos tratar os seres e os budas da mesma maneira: com respeito. Essa é a natureza da tolerância. Tolerância consciente trata todos os seres da mesma maneira, mesmo os demônios. Nesses ensinamentos, falamos algumas vezes sobre demônios, magos negros, feiticeiros e por esses termos queremos significar pessoas que pretendem ferir e há incontáveis pessoas com esse propósito. Algumas podem até ter boas intenções em mentes, porém devido às suas ignorâncias elas ferem outras pessoas. Algumas há que pensam estar fazendo o bem, mas na realidade estão ferindo.

  Os budas tratam todos os seres da mesma forma. Um anjo os trata da mesma forma: com respeito, amor e tolerância. Mas isso não significa que perdoam seus crimes, que concordam com as suas ações perversas, que sejam permissivos a assim eles continuarem. Ao observamos uma ação danosa se pudermos fazer algo para cessá-la nós o fazemos. No Tibet, quando os chineses o invadiram e estavam estuprando monjas, alguns monges permitiram que isso acontecesse por que eles pensavam que seria errado ferir os chineses. Porém, isso é um erro. Aqueles monges achavam que a não violência era uma lei absoluta, e o Dalai Lama alertara-os sobre esse erro. Precisamos pesar as circunstâncias. Aqueles monges deviam ter lutado para proteger os inocentes, cessar aquela gente nociva de realizar ações desse tipo. Isso é um ato de compaixão não somente para a pessoa que sofre a ação, mas também para aquela que a está realizando. Se tivermos duas crianças e uma quiser agredir a outra devemos parar a criança agressora. Não devemos contemplar algo assim em favor do “seja paciente”. Paciência não significa passividade, precisamos ser ativos.

  Assim, em nossos esforços de lidarmos com outros seres, a fim de praticarmos a tolerância e a paciência, precisamos aprender como transformar situações para o bem de todos e não unicamente para o nosso próprio bem, mas igualmente para as pessoas praticantes da nocividade.

  Na tradição gnóstica temos diferentes tipos de orações e práticas que podemos usar para nossas proteções contra seres que tentam nos ferir. Infelizmente, porém, há alguns estudantes que assumem o pensamento de que devemos ser também responsivos contra outros seres agressivos. Por exemplo: se eles acreditam que uma determinada pessoa seja um mago negro, ou feiticeiro, ou bruxo esses estudantes então pensam que devemos ser bastante zangados, agressivos, ferozes contra esses chamados “magos negros”, mas isso está errado. Há histórias dos intitulados gnósticos que pegaram feiticeiros e os surraram. Isso também está errado. Não se pode combater a violência com a violência. Não podemos dissolver as trevas com ódio, mas somente com luz, verdade, docilidade e amor.

  Ressaltemos o grande perseguidor dos gnósticos, o homem que assassinava gnósticos. Se ele fosse tratado na bondade, não no olho por olho, não teríamos uma grande parte da bíblia, que é tão importante para nós. Paulo tornou-se um grande gnóstico por que lhe foi dada luz em troca de sua violência, e isso o ensinou, e assim ele mudou. Então, sempre que alguém nos esteja ferindo devemos nos lembrar: “Essa é minha chance de aprender da paciência, a chance de eu praticar”. Sentir-nos-emos agradecidos.

  Isso nos traz agora ao ponto em que há também uma qualidade da mente que é muito prevalecente nesses tempos: uma tendência de ver os outros seres como inimigos. E isso está cultivado em larga escala pelos tipos de alimentos psicológicos que recebemos de notícias e filmes. Temos a inclinação de ver os outros seres como nossos inimigos, detemos esse sentimento de que as pessoas estão para nos acharcar e não podemos confiar nelas. Desse modo, temos medo ou um ressentimento contra a sociedade, contra nossa própria família e mesmo contra amigos; possuímos amizades até certo nível, porém em certo momento, entendemos nossos amigos como inimigos. É bom para nós analisarmos esse estado mental. Com relação a isso, o Dalai Lama disse alguma coisa muito útil: “Se o amor em nossas mentes estiver perdido e vermos os demais seres como inimigos, então não importa o quanto de educação, conhecimento, ou conforto material tenhamos, pois unicamente o sofrimento e a confusão nos cercarão”.

  É bom para nós aprendermos a transformar nossas mentes, vermos os outros seres como a nós. Todos queremos a felicidade, queremos ser aceitos, ser tratados com paciência, bondade, respeito; então, devemos fazer isso também. Disse Gandhi: “Devemos ser a mudança que desejamos ver”.

  Se quisermos que as outras pessoas sejam pacientes e tolerantes conosco, também devemos ser assim, devemos tratar os outros dessa forma; isso é realmente o caminho mais certo para vencermos àqueles a quem realmente temos como inimigos. Quando de fato conseguirmos notar um inimigo, alguém que certamente esteja fazendo algo para nos prejudicar, poderemos então compreender que não é aquela pessoa o nosso inimigo, porém o seu ego (que também possuímos). É seu ódio que é nosso inimigo, mas da mesma forma é inimigo dela. Pensemos sobre isso! Uma pessoa que nos esteja ferindo está também ferindo a ela própria, pois está escutando ao seu próprio inimigo interior; desse modo, devemos ter compaixão dela, devemos ser pacientes com ela. Quando pudermos realmente ser sinceros com esse sentimento – de olharmos normalmente a uma pessoa que é vista como um inimigo e entendermos que ela esteja sofrendo e seja vitima de seu próprio inimigo interior – poderemos realmente ter compaixão dela. E não somente isso; ela pode vir a ser nossa amiga facilmente.

  Ao olharmos a vida numa escala maior, entenderemos que esse corpo físico no qual nele estamos não é o único que já tenhamos tido: houve muitos outros. E através de cada existência que tenhamos interagido com certo grupo de pessoas num percurso cíclico agradável, entendemos que as pessoas que agora são nossas amigas podem um dia ter sido inimigas, e as pessoas que agora são nossas inimigas, podem ter sido nossas amigas. Podemos descobrir que as pessoas que agora são nossas inimigas podem ter sido anteriormente nossos pais, ou podem ter sido nossos filhos. E esse tipo de perspectiva é muito saudável, pois ajuda a tirar-nos do foco da estreiteza mental do ego, que olha de um ponto de vista bastante restrito de circunstâncias, como o nosso exemplo com as armas. Quando sentimos ódio por uma pessoa que nos esteja batendo, falhamos em entender que nos colocamos a nós próprios nessa situação, pois aquelas circunstâncias são aquilo que trouxemos com todos os elementos adicionados. O mesmo é verdadeiro com as pessoas a quem percebemos serem inimigas ou amigas. Por isso, não faz sentido ficarmos enraivecidos.

SUPORTAR QUANDO EM DIFICULDADES OU EM SOFRIMENTOS

  A segunda forma de resistência ou paciência é relativa ao suportar o sofrimento ou dificuldades em geral. Ser paciente ou tolerante com as dificuldades está realmente relacionado com o entendimento de nossos pessoais objetivos. Quando nos determinamos a estudar esse tipo de informação, a esse conhecimento, é por que temos a intenção em algum grau de despertar a Consciência, de nos desenvolvermos como seres humanos, experienciando aquelas coisas que estão além da carne, além das realidades, além dos cinco sentidos. Entretanto, aquelas experiências não nos vêm sem um preço; temos de trabalhar, obter aquelas coisas, precisamos desenvolver capacidades em nós próprios que nesse instante não as temos. Fazemos esforços e os esforços são a tolerância, a resistência; temos de vencer as dificuldades às quais necessitamos enfrentá-las.

  Para nos tornarmos um Mestre do Samadhi, precisamos meditar, mas a meditação não é fácil. Não é fácil por causa de nossas mentes. Em essência, meditação é extremamente simples devido à natureza da mente ser luminosa e clara, sem complicação; por conseguinte, é fácil. Entretanto, chegar àquela experiência é difícil, por que nossas mentes estão lotadas com obstáculos. Então as mentes se revestem com resistência para mover obstáculos do passado, para superar as dificuldades. Os obstáculos que enfrentamos são os pagamentos que temos a fazer a fim de obtermos aquilo que necessitamos, o que queremos.

  A Kabbalah não é fácil; seus estudos são muito difíceis por que são conhecimentos da consciência, os quais estão além da capacidade da mente sensorial, de nossos intelectos. Precisamos trabalhar com a mente interna, a mente abstrata que nesse ponto mal sabemos se de fato existe. Dessa maneira, para realmente entendermos a Árvore da Vida, compreendermos a Árvore do Conhecimento isso nos requer uma quantidade grande de trabalho, e não é fácil.

  Assim é por que Jesus disse que a passagem da porta é estreita e difícil, e o caminho da destruição é largo e fácil. Infelizmente, existem alguns, mesmo dentro do movimento gnóstico, que dizem a Kabbalah não ser necessária, que o aprendizado de todas essas diferentes práticas não é necessário, e isso é muito triste por que demonstra completa falta de compreensão do ensino.

  A Kabbalah expressa a linguagem da alma, a linguagem da consciência, que é simbólica, abstrata. É uma linguagem muito bonita e muito sutil sendo portadora de enorme profundidade. Parece-nos que naqueles casos em que estudantes rejeitam o estudo do Kabbalah prendem-se ao fato de que são preguiçosos, que não entendam e não queiram entender.
E assim eles acreditam que podem seguir sem isso. É como tentarmos ir a algum lugar em que nunca estivemos, de onde não temos um mapa. É tolice. Se desejarmos ir a um lugar em que nunca estivemos precisamos de um mapa. E o mapa está aqui: A Árvore da Vida, a Kabbalah. O mapa está na consciência, descobrimos isso através do estudo e do trabalho. E isso requer-nos diligência, resistência para superarmos as dificuldades.

  Quando éramos crianças a escola, em certas épocas, tornava-se muito difícil, e não compreendíamos por que tínhamos de ir, pois não a queríamos, preferíamos ficar em casa a brincar. Mas não sejamos agora estudantes como antes. Os estudos da Kabbalah são essenciais para sucessivamente navegarmos a mundos interiores.

  Se vamos a outro país e não falamos a língua nativa podemos ser facilmente manipulados e ficarmos perdidos, certo? Se vamos à Ásia, à China e não falamos chinês o que nos acontece? Podemos comer? Podemos conseguir um lugar onde dormir? Que fazermos se não sabemos ler qualquer grafia ou fazer perguntas? Podemos fazer qualquer coisa se não entendemos o que as pessoas de lá estão nos dizendo? Mesmo que saibamos falar um pouco da língua somente com muita sorte encontraremos alguém que nos ajude e seja sincera conosco. Porém, se os abutres que existem por lá descobrirem que não falamos a língua deles, eles tomarão de nós tudo o que tivermos. Não estou falando especificamente da China, estou dizendo que ao viajarmos para outro país, a qualquer outro lugar, estaremos expostos a certos riscos, por mais que saibamos, por mais a salvo que possamos estar naquelas terras. Isso é especialmente verdadeiro com a mente.

  A Kabbalah é um mapa de nossas próprias mentes, de nossas próprias consciências. Quando temos experiências em meditação, experiências fora do corpo, esse mapa é nosso guia. Assim, não é suficiente só pô-la no intelecto, temos de conhecê-la em nossas consciências. Kabbalah é importante, mas não é fácil aprendê-la.

  Há muitas outras dificuldades que encontramos para o despertar da consciência: muitas dificuldades. A intenção fundamental da gnose é o despertar da consciência, superar o sofrimento. O sofrimento existe por que temos um ego, temos um “eu”; temos orgulho, sensualidade, cobiça, inveja, gula, medo. Por conseguinte, suplantar o sofrimento é suplantar a própria mente, o falso ego. Entretanto, não podemos conquistar isso a menos que o vejamos, e vê-lo é sofrimento.

  Temos a tendência de fugir quando vemos algo doloroso ou contraditório em nós; não queremos ver isso. Se alguém nos diz algo sobre nós, tal como: “você está tão impaciente, você está tão zangado, você está tão orgulhoso”, não desejamos ouvir isso, não queremos ser criticados, somente queremos ser elogiados. Mas sabiam que o elogio é veneno para o nosso trabalho? E a crítica é a melhor coisa a acontecer-nos?

  O elogio é tóxico para o trabalho espiritual por que exalta-nos o orgulho e desperta o ciúme em outros. As pessoas vendo-nos a ficar orgulhosas tornam-se invejosas e ciumentas, então se voltam contra nós. Quando edificamos o orgulho então nos tornamos inflados e gordos. O que de bom então o orgulho faz? Por outro lado, se alguém nos critica é bom: a crítica quebra o orgulho, mostra-nos nossas próprias faltas e nos posiciona em algo para trabalhar, isso é bom!

  Tomar-nos-á enorme soma de esforços e paciência para superarmos as dificuldades com que inevitavelmente deveremos nos defrontar se quisermos encarar-nos, se verdadeiramente quisermos estar face às nossas íntimas contradições, às nossas sujeiras. Se alguma vez já treinamos um cão sabemos como é treiná-lo a ir ao banheiro, ao papel. Não é algo fácil, exige paciência e tolerância, porém se o cachorro erra e vai ao banheiro de outra pessoa no mesmo pavimento e desejamos mostrar-lhe aquele erro, ele não quer ver, certo? Ele resiste, luta, não quer ir lá, ele não quer ver isso, não quer que metamos nossos narizes naquilo; ele gane, chora..., somos assim. Quando alguém nos quer mostrar nossas sujeiras, nossos próprios erros, não queremos ver, queremos justificar: “Oh, eu não sabia, oh eu pretendia fazer algo mais, ohh..., aquilo não fui eu”.

  Se persistirmos naquela atitude nosso trabalho será lento. Transformemos nossas mentes. Olhemos ativamente para as nossas faltas. Olhemo-las com alegria. Transformemos nossas vidas.

  Há também sofrimentos relacionados com a prática. Praticar meditação é difícil, é fisicamente desconfortável no início por que não estamos acostumados a nos sentarmos eretos e concentrar nossas mentes; então, quando conseguimos ultrapassar o obstáculo, vem-nos o desconforto de começamos a ver nossas próprias sujidades e isso é muito desagradável. É um tipo de sofrimento que nos faz suportar o sentar e analisar os nossos próprios erros sem justificá-los, sem os desculparmos, e também sem condená-los, mas vê-los simplesmente como são e aprender como mudarmos.

  Reclamamos sobre meditação porque nossas próprias mentes tornam duro aprendermos; queremos uma prática mais suave; permanecemos a buscar por diferentes práticas, queremos alguém que nos explique isso e aquilo. Meditação não é fácil por causa da mente. Quanto antes nos tornarmos sérios acerca da disciplina da mente, não exatamente na prática meditativa, mas pelo dia inteiro, então a meditação se tornará mais suave. Entretanto, temos de ter disciplina para nos sentarmos, temos de ter paciência de nos mantermos tentando.

  É dito na Bíblia que temos de aceitar as dificuldades, temos de esperar por elas. Vencer uma corrida requer esforços. É bom para nós quando estivermos fazendo nossa prática meditativa e verdadeiramente colocarmos isso em perspectiva. O que fazemos quando em meditação é criar mérito, benefícios para nós próprios e para outros. E em verdade quanto de sofrimento é isso de meditar por dez minutos? Reclamamos e resistimos, porém quanto de sofrimento isso nos traz verdadeiramente? Quando sentamos para meditar, e deixem-me dizer, por exemplo, que se não queiramos mesmo por que estamos resistindo ao sofrimento da meditação, lembremos-nos do seguinte: os atletas da meditação meditam 24 horas por dia sem parar.

  Lamas do Tibet vão para o retiro por três anos. Aqueles retiros não são o que entendemos por retiros aqui no oeste. Para nós, irmos para um retiro é irmos para o campo e ao churrasco, ouvir os pássaros, nadar, relaxar. Esse não é o tipo de retiro que estamos exemplificando. No budismo tibetano tradicional os três anos de retiro requerem que se vá a um local bem isolado, usualmente uma caverna, que se permaneça lá por esse tempo e nunca se volte antes. Não somente isso: tudo que se tem a fazer lá é meditar. Não há TVs, vídeo games, livros, revistas, lojas, shoppings ou telefones. O que se tem unicamente é uma caixa de meditação. E vocês estarão se indagando: “caixa”? O que seja uma caixa de meditação? Uma caixa de meditação envolve as pernas e senta-se no chão com as pernas cruzadas, sem possibilidades de deitar-se. O praticante que permanece em retiro por três anos não dorme mesmo durante a noite. Medita a noite inteira sentado ereto, exatamente como tem meditado durante o dia todo. Periodicamente, são dadas outras práticas; ele pratica yantras, que são práticas iogues, recebe instruções de seus mestres e come bem pouco, uma vez por dia.

  Então lembremos exatamente disso quando estivermos em nossa bela e confortável cama, no belo e confortável colchão, a salvo em nossas casas mornas com nossos incensos, velas e músicas e ainda reclamando. Coloque sua prática em perspectiva.

  Isso evoca alguma outra coisa em minha memória sobre as dificuldades da prática. Nas práticas monásticas tradicionais os monges não cozinham para eles próprios. Em verdade, nas tradições asiáticas eles pedem por comida. Uma vez por dia eles vão às casas da vizinhança com uma tigela, uma pequena tigela, e obtém qualquer alimento que lhes seja dado para o dia. Eles não podem dizer: “Oh, pode me dar frituras com isso? Ou pode me dar menos sal? Ehh… Eu não como carne de porco. Ummm… eu não gosto de berinjela”. Daquilo que lhes é dado eles comem com gratidão, e é assim mesmo. Eu menciono isso por que somos muito mimados, muito preguiçosos, queremos todas as coisas, “exatamente isso”.

  Nesse momento, não temos capacidade para suportar todas as dificuldades. Precisamos agora nos treinar enquanto temos a oportunidade. As coisas não serão sempre como são agora. O que será se ficarmos doentes? O que será se ficarmos muito mal, muito doentes? Perderemos nossa oportunidade de praticar. E se morrermos? Se tivermos uma guerra, aqui em nosso país? O quão difícil será então praticarmos? Pensemos carinhosamente sobre essas coisas. Não digo coisas assim para assustá-los, mas sim para motivá-los a serem sérios. Todas as coisas são impermanente e o carma da humanidade é muito pesado. Dificuldades estão vindo, não somente para nossas vidas individuais, porém para nossos ambientes coletivos. Precisamos nos treinar para segurarmos isso.

  No livro Psicologia Revolucionária o Mestre Samael Aun Weor ressalta que todos ostentamos e desfilamos como pavões, como se fôssemos poderosos, mas quando sentimos pequena dor de estômago nos tornamos miseráveis lunáticos, queixosos, choraminguentos, gemedores. E nos diz que se fosse tomado um de nós e colocado sozinho em um deserto, sem nada, veríamos, exatamente, quão fracos nós somos. Isso é verdade: somos ostentadores, orgulhosos e presunçosos, mas em verdade somos muito fracos.

  O sofrimento por que estamos passando agora é algo de que podemos tirar vantagens a fim de nos treinarmos e nos tornarmos fortes. Essa é a natureza do caminho do Bodhisattva: transformar o sofrimento em benefício, nos tornarmos fortes.

  Podemos olhar a isso desse modo: quando um pai ensina a um filho como andar, como dirigir uma bicicleta, o pai dá as instruções e se mantém ali para segurar a mão do filho, equilibrar a bicicleta na medida em que a criança está tentando. Mas a partir de certo ponto o pai precisa deixa-la ir. A criança tem de aprender como fazer sob sua própria direção; mas ela cai, se machuca e chora. Se aquele pai não permitir que a criança faça aquilo sozinha, experimentando aquele sofrimento, a criança permanecerá fraca e ignorante. Ela não aprenderá a andar nem a andar de bicicleta. O pai que disciplina, que entende o que seja melhor para aquela criança, permanecerá aparte mesmo sabendo que é preocupante, permitindo assim que a criança ande de bicicleta, que talvez caia, se machuque e chore, mas sabendo que a criança necessita daquela experiência a fim de crescer. O Bodhisattva faz a mesma coisa com sua mente. Recebemos esses ensinamentos como guia a fim de nos provermos de instruções básicas em como cultivar Bodhichitta e disciplinar nossas mentes. Mas, então, necessitamos de experiências de vida, de nos inserirmos nas circunstâncias de fazer, andando de bicicleta, algumas vezes caindo, outras vezes nos ferindo, e isso é doloroso, mas nos permitindo voltar para a bicicleta e nos manter fazendo. Isso é paciência, a capacidade de suportar e continuar.

  É muito triste quando vemos estudantes que tão logo encontram alguma circunstância a mostrar-lhes suas próprias fraquezas, orgulhos, luxúrias, medos, abandonam e fogem da gnose. Isso é muito triste por que aquelas almas são muito fracas para encarar-se, enfrentar suas próprias realidades, é muito triste. Devemos ter muita compaixão por essas pessoas por que aquele sofrimento é tremendo. E devemos fazer o que pudermos para inspirá-los a tentar novamente, voltar para a bicicleta e continuar tentando aprender como disciplinar a mente. Qualquer um pode aprender isso se tiver vontade de fazê-lo.

  Outro exemplo que me lembro sobre dificuldades da prática: havia um monge no Tibet que estava preso pelos chineses por muito tempo; foi torturado e abusado. Eventualmente, conseguiu fugir e escapou para a Índia, entrando num longo retiro, e ali permanecia praticando. E aconteceu de sua Santidade o Dalai Lama vir até ele para falar-lhe, e o monge disse: “Sabe, é mais difícil de praticar aqui em retiro do que era na prisão chinesa”. É verdade. Onde há muita facilidade e ambiente confortável, não temos inspiração para a prática; é difícil praticar nesses casos. Se não existe um ambiente hostil diante de nós não temos oportunidade de aprender da paciência, da tolerância, da doçura. Por conseguinte, quando os estudantes reclamam sobre suas dificuldades, do quão difícil é a vida, do quão cruel suas esposas são para eles, isso também é triste por que os estudantes estão perdendo a oportunidade de obter vantagens daquelas circunstâncias, de transformá-las para o benefício de todos.

  Quando aprendermos como aceitar as dificuldades, então o sofrimento se torna manobrável. Um bom exemplo disso é quando vamos ao médico. O médico está sempre nos espetando com agulhas, pode ter de fazer cirurgia cortar-nos com uma faca, e aceitamos tudo isso; essa é uma forma de sofrimento, mas não ficamos malucos por isso. Porém, se alguém mais chega e nos espeta com uma agulha e tenta nos cortar com uma faca ficamos realmente irados. A única diferença aqui é uma mudança de atitude. Podemos desenvolver essa mesma atitude para todas as circunstâncias, reconhecer que aquela crítica, os seres nocivos, as coisas prejudiciais que são feitas, realmente podem ser transformadas por nós e não nos causarão a ira.

  Paciência com a realidade da natureza, se pescadores, caçadores e fazendeiros, pensando unicamente em suas sobrevivências suportam o sofrimento do calor e frio, por que não somos nós também pacientes em favor de um mundo de alegria? – Shantideva, Guide to the Bodhisattva’s Way of Life.

 Mas quem perseverar até o fim esse será salvo. – Marcos 13.13

  A terceira forma de paciência ou tolerância está relacionada com ter paciência ou tolerância com a natureza do fenômeno, a natureza da realidade. Eu vi um rapaz que saíra de seu carro e havia um monte de neve nas imediações do veículo, e o rapaz, irado, xingava; estava tão transtornado que dele parecia sair como um fluente curso de linguajar chulo e pensei comigo: “É realmente uma bela coisa a ver antes desta palestra”, pois ele demonstra, exatamente, como não se deve ter tolerância com a realidade da natureza. Ele estaria irado com a neve? Tenho certeza de que se eu perguntasse-lhe isso ele teria se dado conta da futilidade que nele causara todo aquele desperdício de energia, pois era o que ele estava fazendo: justamente desperdiçando energia.

  A vida é sofrimento. Estejamos nesse caminho ou não, as circunstâncias serão dolorosas, a vida caminha com o sofrimento por que essa é a sua natureza. Esse é o primeiro nobre princípio ensinado por Buda.

  Nós não entramos no caminho do despertar da consciência a fim de eliminarmos as circunstâncias negativas ou dolorosas; não é esse o nosso objetivo por que isso é impossível, não podemos. Infelizmente, muitos de nós temos essa ideia por que temos aquela atração pelo paraíso, para o nirvana, e pensamos: “Ah, deixe-me sair desse lugar. Se pudesse morrer eu morreria. Deixaria esse sofrimento acabar”. A morte não é uma resposta, mas saberíamos o que seja? Nem é o nirvana.

  Nirvana e Samsara são ambos impermanentes no sentido de que os planos do nirvana, os mundos nirvânicos, são estados de consciência que podemos experienciar por um período de tempo; porém, tanto quanto o ego esteja presente em nós o nirvana será temporário: nossa permanência será temporária. Assim, em relação a termos a ideia ou o objetivo de entrarmos no nirvana para sempre, não sejamos tolos nesse desejo; é um desejo que em verdade quer se ver livre do sofrimento. Entretanto, o sofrimento persistirá enquanto o ego estiver vivo.

  O verdadeiro desejo pelo nirvana é o desejo que produz sofrimento por que é um desejo por alguma coisa que não temos. E quando não temos alguma coisa que queiramos, sofremos. Quando vemos aquele computador novíssimo que acaba de ser lançado e o queiramos, isso é sofrimento. Quando vemos uma bela casa no quarteirão e a queiramos, isso é sofrimento. E quando em nossas mentes pensamos no nirvana, na liberação, e o queiramos, há nisso um tipo de sofrimento, por que é uma ansiedade por algo que não temos [ainda].

  Sejamos realistas. O sofrimento existe por causa do desejo. Se removermos o desejo o sofrimento vai embora. Eis por que o caminho do Bodhisattva não é um caminho nirvânico, não é um caminho que nos leve ao nirvana: é um caminho que nos leva para além do nirvana.

  Algumas pessoas na gnose usam as instruções gnósticas a fim de ensinar o caminho nirvânico, por que isso é o que eles praticam, e isso é ótimo, porém não é esse o caminho do Bodhisattva, que não é nirvânico. O caminho nirvânico nos leva a termos a capacidade de existirmos no nirvana por um período de tempo, isso é tudo. Se o ego ainda está vivo, isso significa que parte de sua psique ainda pertence ao Klipoth, ao inferno, e significa que o sofrimento continua. É essa a natureza da realidade, e há um tipo de sofrimento que é quando falhamos em reconhecer a natureza da realidade.

  Vocês provavelmente terão ouvido da prece da serenidade. É muito famosa agora devido a coisas com AA. A prece diz algo como: “Deus nos deu a graça de aceitar com serenidade as coisas que não podem ser mudadas, a coragem de mudar as coisas que devem ser mudadas e a sabedoria de distingui-las umas das outras”. Essa prece é uma perfeita explanação da qualidade discriminatória que necessitamos ter a fim de desenvolver essa forma de tolerância.

  Hoje há uma quantidade de neve no chão e há gelo; por que ficarmos com raiva? Não podemos mudar a temperatura. Devemos discriminar entre as coisas que podemos mudar e as coisas que não podemos.

  No Bodhicharyavatara, Shantideva escreve uma bela afirmação que podemos usá-la em todos os casos de tentativas de desenvolver a paciência, e desejo lê-la para vocês; assim terão a noção exata:

  “Se algo pode ser remediado por que entrarmos em desagradável mau humor? E se não pode ser remediado por que cair em desagradável mau humor?”.

  É simples, não? Se nos defrontamos com um problema, ou conflito ou uma forma de sofrimento, e não haja solução para aquilo, então não há razão para ficarmos com raiva ou aborrecidos, pois existe uma solução, porém precisamos utilizar um eficiente antídoto, aplicarmos-nos à solução. Assim, se estamos face a um sofrimento, um problema ou conflito e não haja solução, por que ficarmos aborrecidos? Não há razão se não haja o que possamos fazer, então já encontramos a solução.

  Gostaria de aduzir a isso mais um fator: estando face a um problema, ou a uma dificuldade e não tenhamos a solução, então fiquemos alegres, pode haver uma, encontremos-la.

  Desse modo, em síntese, não há razão para a zanga, a ira, ou para ficarmos aborrecidos.  Se ficarmos aborrecidos, irados ou frustrados estaremos identificados com um desejo, algum tipo de desejo que não está sendo realizado. Nesse ângulo, podemos compreender que a paciência, ou a resistência realmente equivalem-se à serenidade, à capacidade de sermos serenos.

SERENA LUMINOSIDADE

  Somente aquele que sabe como ficar sereno, como trabalhar e como ser paciente pode ser salvo – Pistis Sophia Desvelada.

  Há outra linha nos escritos de Shantideva, que também é boa. Ele diz: “Se eu sou incapaz de suportar mesmo o menor sofrimento do presente, então é por que fui agraciado da raiva que seria a causa da dor infernal?”.

  E podemos estender isso a todos os egos. Quando reconhecemos que o ego é o produtor do sofrimento e todos eles produzem mais sofrimento, então necessitamos eliminá-lo. Mestre Samael disse no Pistis Sophia Desvelado: “Iniciados devem aprender como viver serenamente e gentilmente dentro dos terrores do abismo da noite”.
                                              
  Precisamos aprender a sermos serenos e gentis no interior do abismo de nossas próprias mentes, e dentro da noite, a noite espiritual, a treva. Algo que devemos aprender é como disciplinar nossas mentes, como treinarmos nossa paciência. O processo de fazermos isso é o processo da iniciação. Aprender a serenidade é aprender a disciplinar a mente. Se nossas mentes estão agitadas não temos serenidade, não temos paz, assim não podemos resolver nossos problemas. Uma mente agitada não pode resolver quaisquer problemas; de fato, somente consegue agravá-los. Por conseguinte, se nossas mentes estão agitadas, a primeira coisa a fazer é acalmá-las, relaxá-las, ficarmos serenos.

  Isso é fácil ver-se ao compreendermos a natureza dos quatro éteres. Esses éteres que temos em nosso corpo etérico são como espelhos, como a superfície da água, como um lago. E eles são usados para transformar e transmitir energia. Temos a percepção por meio dos éteres do corpo vital. Tudo o que percebemos é refletido por eles da mesma maneira como um espelho reflete as imagens. Se suas superfícies estão distorcidas com ondas, se o espelho está ondulante e caótico, o quadro que é visto estará distorcido. Desse modo, por essas distorções, não conseguimos ver a imagem original como ela é realmente. É isso que acontece quando nossas mentes estão agitadas. A água estará se movendo muito; então deixemos a água estabilizar-se, deixemos a mente serenar. Quando a mente estiver calma e serena conseguiremos ver o reflexo perfeito de qualquer coisa que necessitemos ver.

  Isso se torna especialmente importante quando evocamos o nome desse bhumi. Estamos tratando da terceira paramita: paciência ou resistência, e esse bhumi é chamado “luminoso” nas tradições budistas. Estamos tratando do mesmo modo do éter “luminoso” relacionado com nosso corpo etérico. O éter luminoso é aquele aspecto do corpo etérico que trabalha a percepção. Não vemos assim a ligação, a conexão? Desenvolver a paciência e a resistência é desenvolver a serenidade, que é desenvolver a calma e a mente estável; e isso é a calma e a estabilidade Bodhichitta, o corpo etéreo.

  Mestre Samael diz que o grande obstáculo à clarividência é a raiva. Isso por que a raiva é uma paixão que mexe com todas as águas e agita a mente. Porém, a raiva não é exatamente a responsável pela exteriorização da linguagem chula ou violência, também assim é o ressentimento, e a depressão. A ira tem muitas formas, mas em todas as suas formas, sejam externas ou internas, visíveis ou invertidas, ela distorce e turva a mente. Eis por que na gnose quando ensinamos como desenvolver a clarividência objetiva, a capacidade de ver objetivamente além dos sentidos físicos – ver claramente, sem obscurecimentos – o mais eficiente antídoto, a mais clara solução é trabalharmos a ira, compreendermos e eliminarmos a raiva, os desejos frustrados.

  Assim, se temos um desejo frustrado relacionado com a meditação, então não seremos capazes de meditar. Estando a mente frustrada isso é a raiva que perturba a água; assim não há clareza, não há serenidade, a mente está agitada. Então, compreendamos essa frustração. Aprendamos como transformar isso, aprendamos disso.

  O lugar desse bhumi, ou nível, e o lugar dessa perfeição, ou paramita, é absolutamente definitiva em sua estrutura com relação aos outros. Sem serenidade, paciência e resistência, não podemos ir em frente; é impossível. É a mesma coisa com as outras paramitas de que já discutimos. Se não possuímos generosidade, se não temos aquela intenção de desenvolver a mente misericordiosa, não conseguiremos entrar no caminho Bodhisattva. Se tivermos a generosidade, aquela generosidade de espírito, bondade amorosa, temos a intenção; então, necessitamos da disciplina a fim de comandar a mente. Porém, se não temos isso não conseguiremos entrar no caminho. Entretanto, se temos a generosidade e alguma disciplina da mente, necessitamos da serenidade. Sem isso não conseguiremos ir adiante.

  Assim, olhemos nossas próprias mentes e trabalhos sobre esses fatores, essas três forças. Essas três forças criam: generosidade, disciplina e paciência, criam o caminho. Se tomarmos uma só dessas três não haverá caminho do Bodhisattva para nós, não haverá possibilidade pela qual possamos trabalhar. Precisamos ter essas três qualidades em desenvolvimento, equilibradas umas com as outras, harmonizadas, sintetizadas. Isso devido a uma causa muito clara, mas entraremos em seus méritos em palestras subsequentes.

  Fechando, lerei para vocês um pouco do Livro dos Romanos do Novo Testamento. Esse livro é um documento muito claro escrito por Bodhisattvas, e o escritor, Paulo, explica muito bem, muito claramente nas primeiras poucas linhas de Romanos 8. Mas a parte que quero ler-lhes é o final de Romanos 8, relativa a alguns conselhos, a fim de conseguirmos desenvolver a tolerância, a habilidade de suportar o sofrimento; de tomarmos o que a vida nos oferece, aceitando aquilo e aproveitando.

  “Quem intentará acusação contra os escolhidos de Deus? É Deus quem os justifica. Quem os condenará? Pois é Cristo quem morreu, ou antes, quem ressuscitou dentre os mortos, o qual está à direita de Deus, e também intercede por nós. Quem nos separará do amor de Cristo? A tribulação, ou a angústia, ou a perseguição, ou a fome, ou a nudez, ou o perigo, ou a espada? Como está escrito: por amor de ti somos entregues à morte todo o dia; fomos reputados como ovelhas para o matadouro. Mas em todas estas coisas somos mais do que vencedores, por aquele que nos amou. Porque estou certo de que, nem a morte, nem a vida, nem os anjos, nem os principados, nem as potestades, nem o presente, nem o porvir. Nem a altura, nem a profundidade, nem alguma outra criatura nos poderá separar do amor de Deus, que está em Cristo Jesus nosso Senhor”.

  Sumarizando: os Bodhisattvas têm Cristo encarnado e nada pode separá-lo deles, exceto eles próprios. Não importa quanto sofrimento, não importa quanta dificuldade, não importa quanta dor, os Bodhisattvas têm Cristo interiormente e aprenderam ligar-se a ele, cultivar seus relacionamentos com aquele Bodhichitta; nada pode detê-los. É isso que Paulo está dizendo. Isso pode inspirar-nos. Possamos não estar ainda no caminho, mas em verdade temos a essência; realmente temos a Consciência. E a Consciência é nossa conexão com nosso Ser interior que pode ajudar-nos, guiar-nos, dar-nos todos os elementos de que necessitamos para crescermos. Porém, lembremos-nos de algo: ele como pai não pode segurar a bicicleta se realmente queiramos aprender a dirigir. Significando que nosso Ser nos permitirá sofrer de tal sorte que cresceremos. Se falharmos em incorporar substância de nossas experiências, adicionando-nos, então permaneceremos fracos como crianças, que nunca aprendem a ser autoconfiantes. O Bodhisattva torna-se perfeitamente autoconfiante, porém aquele ser em quem ele confia é Cristo.

PERGUNTAS E RESPOSTAS

  1) P. – A paciência torna-se passive de modo a…. Como transformar o evento inicial? Dou-lhe um exemplo, diariamente....


  R. - Bem, você trouxe várias coisas com isso. A primeira, eu diria, não é tal coisa como um evento repetitivo. Nenhum evento se repete exatamente da mesma maneira, Não podemos dizer que uma coisa acontece repetidamente uma vez e que a cada tempo aconteça; é diferente. Isso é uma coisa muito importante, pois a natureza de nossa mente é estar adormecida, e vai adormecer por causa do hábito e temos o hábito de pensar. “Já estive nesse quarto, então não preciso prestar atenção nele”. Dai, termos esse tipo de metade sonolento – ou não, mesmo no estado desperto completo. Precisamos reconhecer que nada é a mesma coisa, sempre; as coisas estão sempre mudando de momento a momento. Por isso, mesmo que estejamos nos dirigindo ao trabalho diariamente na mesma rodovia, precisamos realmente prestar atenção por que a rodovia não é a mesma, todos aqueles carros e todas aquelas pessoas não são as mesmas; há diferenças: nós não somos os mesmos. Eu já pontuei isso antes.

  Segundo: devido a nossa reação em relação a uma circunstância que haja mudado, não significa necessariamente que tenhamos estado melhores. Significa exatamente que nossas reações mudaram. Experienciamos uma certa coisa umas poucas vezes e nos tornamos habituados com ela, usuários dela. Entretanto, não significa que paramos o sofrimento todas as vezes que estejamos conscientemente transformando aquilo. Algumas pessoas, na primeira vez que viajam de carro, podem senti-lo desconfortável, assustador, muito desconfortável, porém após um tempo elas se acostumam com ele, então não prestam mais atenção. Não significa que elas transformaram o elemento em suas mentes; que ele estaria reagindo de outra forma do início. Aquele elemento ainda está lá, e não está reagindo do mesmo modo de antes, ou algum outro elemento estará agora reagindo. Devemos, então, ser muito cuidadosos em observar como reagimos às situações, particularmente quando as situações surgem umas semelhantes às outras.

  É normal conhecermos alguém que tenha atitudes muito sarcásticas; que sempre vem a nós falando-nos diretamente em tiradas humorísticas, que a princípio nos magoam; porém, mais adiante, não mais sentimos nada; mas não significa que estejamos transformando; isso significa que estamos exatamente nos acostumando com aquele sofrimento. Sob esse ângulo precisamos observar cuidadosamente.

  Se realmente estamos trabalhando para transformarmos alguma coisa, o que vier a ser novo será nossa compreensão daquilo; ao compreendermos isso então poderemos dizer que algo está diferente. Como, por exemplo, no caso de buzinarem-se. Nossa primeira reação quando ouvimos todas as buzinas é ficarmos agitados, certo? Zangados. Porém, quando vemos à senhora que está desorientada, então não conseguimos ficar zangados com ela. Isso é algo bom de vermos por que nos ajuda a entendermos a futilidade da nossa própria raiva. Isso se torna em um ponto de partida para qualquer outra experiência, como aquela em que nos tornamos frustrados, então nos diremos: “ah, não sei o que está acontecendo aqui. Por que eu deveria ficar com raiva? Deve haver uma razão muito boa para isso ter acontecido”.

  Outro caso interessante é uma história que escutei certa vez acerca do acidente de um carro. A história, basicamente, é que havia um grande acidente com um carro num viaduto e todos os carros estavam bloqueando e retornando pelo viaduto, e todas as pessoas em seus carros estavam com raiva, exceto uma pessoa. E configurava-se que tivesse havido um grande acidente ou algo parecido, mas essa pessoa não estava aborrecida. Mais adiante, essa pessoa percebeu alguém bater à sua porta que lhe disse: “eu vim justamente falar-lhes por que eu estava no carro acidentado, fiquei desnorteado e pude ver a raiva de todas as pessoas, porém vi que havia alguém que não estava como eles. Então, me lembrei de anotar o número de sua placa e vim agradecer-lhe”. Isso talvez seja um conto, mas realmente demonstra algo: que a qualidade de mente tem um impacto sobre as outras pessoas.

  2) P. – Ilegível

  R. Sim, naturalmente. O sofrimento pode impelir-nos a nos comportarmos mais propriamente, se soubermos tirar vantagem disso. Um trauma ou uma situação ruim podem inspirar-nos a agir corretamente. Ao vermos alguém ferido, fisicamente ferido, nos prontificamos a ajudá-lo, mesmo se antes daquele momento o julgássemos um inimigo, certo? Podemos ter uma desavença muito grande com alguém, algo de muita ira, porém se algum acidente acontecer e ele ficar de fato ferido por alguma coisa, imediatamente queremos ajudá-lo. Isso demonstra a futilidade de nossa raiva, a superficialidade da ira e a nossa intenção mais profunda que realmente é boa. Assim, devemos realmente aprender antecipadamente para não termos de ingressar em situações traumáticas e somente então entendermos sobre isso. Podemos nos disciplinar sem termos de passar por esse tipo de sofrimento.

  3) P. Ilegível

  R. Esse é o grande problema e realmente torna-se significante com estudantes da gnose. Aprendemos esses ensinamentos e então alguns estudantes começam a ter essa ideia de que precisam sair por aí contando a todos o que a gnose diz em relação a como eles devam ser. E isso não é realmente um bom hábito. A melhor forma para tratar disso com outras pessoas, quando elas desempenham algo que acreditemos seja errado ou nocivo, é refrearmos-nos e nos olharmos do ponto de vista delas. Tentemos nos olharmos pelos olhos deles a fim de compreendermos como eles nos veem. Na realidade, essa é a medida de um bom pai. Um bom professor pode realmente compreender a mente de outra pessoa e o que ela pode e o que ela não pode receber.

  Na maior parte do tempo, quando estamos em meio às pessoas dizendo-lhes o que fazem de errado e o que devam fazer, isso é recebido de forma negativa por que a maioria de nós é muito orgulhosa para receber aquele tipo de entrada de outras pessoas. Então, depende de nossos relacionamentos. Se formos um pai e filho, então, sim; como pai precisamos dizer ao nosso filho o certo e o errado e dar-lhe o conselho. Mas um filho não pode necessariamente fazer aquilo com um pai e dois semelhantes também não podem necessariamente fazer aquilo, depende de seus relacionamentos. Assim, precisamos ser cautelosos. A intenção de ajudar pode na realidade ferir.

  Ao tentarmos dar um conselho a alguém podemos, na verdade, colocá-lo contra nós sem queremos. Isso nos obriga a uma série de cuidados. Algumas vezes, um bom modo de fazermos isso é o envolvermos sem manipulação e sem orgulho. Talvez dar-lhe um exemplo sobre nós mesmos sem dizer-lhe por que fazemos isso, mas fazendo de forma que seja realmente ao benefício dele e não ao nosso.

  E isso tem uma contraparte: algumas vezes ao desejarmos dizer a uma pessoa como comportar-se ou o que ela esteja fazendo de errado se dá, justamente, por que estamos orgulhosos de nós próprios e nos sentimos superiores a ela, e se assim nos sentirmos não digamos uma palavra; é melhor transformar nossas mentes. E quando dissermos alguma coisa, digamos por estarmos sinceramente consternados por ela, porém sejamos cuidadosos no que dissermos, principalmente se há alguém identificado no assunto. Sabemos bem se nos aproximarmos de um alcoólatra e lhe dissermos que ele precisa parar, normalmente ele ficará enraivecido, a menos que consigamos dizer-lhe no momento certo, mas isso requer habilidade para sentirmos. Pois somos iguais a ele no tocante aos nossos próprios defeitos, orgulhos, raivas e medos; assim, quando agimos por caminhos errados estaremos envolvidos por aquelas coisas, exatamente como um alcoólatra. Nesse contexto é muito difícil comunicarmos isso.

  4) P. – O senhor mencionou pessoas nocivas, seria isso uma contradição…

  R. – Não, não, por sereseu indicava exatamente outras pessoas, outras criaturas. Sabe, uma pessoa nociva, uma entidade nociva ou qualquer tipo. Pois há mais desses do que exatamente seres humanos, há outros tipos de seres no mundo, é a esses a quem me referia.

POR UM INSTRUTOR GNÓSTICO


  Tradução Inglês/Português: Rayom Ra

Rayom Ra
         http://arcadeouro.blogspot.com.br 

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