domingo, 3 de novembro de 2013

As Doutrinas São Somente Códigos - A Visão Tem Que Ser Maior!

   As doutrinas formalizadas para instituições de cunhos oficiais ou particulares são códigos normativos diversos. No âmbito religioso, estruturam-se, principalmente, em primeira linha, em princípios disciplinares-comportamentais, morais e conscencionais.


     Credo e doutrina, doutrina e credo, são primas-irmãs e andam de mãos dadas. No espiritismo, a oficialidade cardequiana sugere a intenção do livre arbítrio em tudo; e assim é proposto e ensinado através da doutrina aos seguidores e estudiosos. Entretanto, a sistemática interpretação dos postulados transita obviamente para a construção e práticas de um credo.

   Mas o que seria um credo? Os dicionaristas nos dão algumas definições, como, por exemplo: “Conjunto dos princípios básicos de uma doutrina religiosa”; “Conjunto de princípios, regras e ditames, pelos quais se governa uma pessoa, uma seita ou um partido; programa, doutrina: um credo político”.

   Isto seria muito pouco para realmente definir um credo enleado por uma doutrina religiosa, pois sabemos dos inúmeros outros elementos históricos elencados através e em torno dos ditames religiosos. As religiões orientais são diferentes das ocidentais. Detiveram entre elas muitas práticas similares, mas destacaram-se, principalmente, pelos ensinamentos e práticas filosofais e meditativas extremamente aprofundadas por homens inspirados e meticulosos, que fizeram da mente o laboratório da alma.

  As religiões africanas seguiram outros princípios e rumos, alicerçadas sobre o psiquismo e animismos fetichistas de todas as nações de seu grande continente. 

  Suas memórias iniciais vieram de longínquas práticas politeístas, de culturas remotas e já desaparecidas, e do antiquíssimo Egito. Depois, outros elementos adentraram nas suas etnias, resultados de caldeamentos culturais vindos de fora ou com seus próprios e distantes ramos. Esta miscigenação os ajudou mais tarde a encontrar suas próprias identidades e símbolos com deuses e heróis negros e suas sagas. Por milênios, as raças negras vêm se mantendo atávicas nesses elementos idiossincráticos e pelo indissociado amálgama – sociedade-religião.

   Nos demais continentes, as caracterizações de religiões e crenças, variavam também em menor ou maior grau, com relação à forma e ritos. Foi o que aconteceu, como exemplo específico e destacado, com alguns dos povos ameríndios, cujas crenças mantiveram-se, em certos níveis, fundamentadas por extensas mitologias e práticas de magias, e ao mesmo tempo, noutros níveis, estiveram mais refinadas pela ciência, fossem ou não – aquelas culturas – trazidas de povos antediluvianos bem mais adiantados na Terra ou provindos do cosmos. 

   A questão das origens dos povos das Américas e suas tradições religiosas permanece inconclusiva para estudiosos da oficialidade acadêmica, pelo fato de o continente americano, desde milênios, estar formado por uma geografia isolada do resto do mundo. 

   Mesmo em crenças naturais e rudimentares de religiões primitivas, onde não existisse ainda a escrita, e a tradição fosse assimilada pela memória e retransmitida oralmente pelas gerações, ou em todos os sistemas religiosos mais bem elaborados em que o legado de códigos firmados por escrituras sagradas fosse respeitado, houve sempre uma doutrina e um credo, como ainda há. 

   Já a Igreja edificada desde Moisés no Oriente Médio, ensina que nos primeiros séculos pós Cristo, o credo foram repetições diárias que funcionavam como orações para os primitivos cristãos, servindo-lhes como veículo de memória a fim de que não se esquecessem de suas obrigações religiosas. Hoje se reza o credo: “símbolo dos apóstolos”.

   Credo, portanto, é também sinonímia de código.  Por sinal, uma oração também é um código que, por ela, mediante a intenção mental ou pela sistemática verbalização, se pretende forçar algum benefício de natureza espiritual ou material. Este propósito sempre esteve conectado ao invisível através das idades em diversas modalidades, segundo as culturas. 

   Ainda que não houvesse uma métrica calculada, como mandam exaustivamente recitar para os mantras indus e tibetanos, ou não existissem requintados símbolos herméticos a serem conduzidos em suas representações externas, inúmeros grupamentos étnicos dos antigos cantavam e dançavam as mesmas danças num mesmo e repetitivo ritmo, lançando pelos ares gritos e sons aos deuses de todos os elementos, e chegavam a estados de auto-hipnose, êxtases ou euforias para as finalidades pretendidas. De outro modo, mais simples e sofisticado – individual ou coletivamente – falavam aos deuses palavras de sagração ou de poderes mágicos que movessem as forças sobrenaturais. E aguardavam os resultados. 

   E ainda se fazem pedidos e elaborações semelhantes ou bem mais uniformizados e esotéricos, em muitos locais do planeta, numa mistura de códigos e credos.

  A idéia de um movimento religioso, filosófico-religioso, ou de uma religião propriamente dita, fundamenta-se, primeiramente, através da reunião dos elementos doutrina e credo, ambos com parentescos conceituais e estreitas afinidades, sob cujas inter-relações e dependências sobrevive todo um corporativismo educativo. A doutrina inteira tende a dividir-se e subdividir-se em códigos, que geram dogmas pequenos e grandes, alguns transitando imediatamente para o credo, ou todos eles rumando ao credo quando tratar-se de uma doutrina rasa e curta. 

   A doutrina poderá deter muitas abrangências através das premissas estabelecidas, porém unicamente nos limites de suas próprias e virtuais fronteiras. 

   E que são as fronteiras? São exatamente as capacidades dos mentores ou de hierarquizados, em distender as mensagens doutrinárias ao seu ponto máximo, e neste movimento buscar imprimir nas almas seguidoras as visões e o ânimo.  Na religião, especificamente, de que agora tratamos, e no aspecto unicamente orgânico, os dois elementos citados precisam estar incorporados de fé e perseverança para a realização prometida.

   Nesta linha natural de entendimento, nenhuma doutrina religiosa se isenta do credo, mas quando se estabelece a ortodoxia, a doutrina dogmatiza o pensamento que lhe bata às portas, ou que dali mesmo pretenda voar acima das regras fixas e inalteráveis.

   Em outras palavras, a inalterabilidade das regras doutrinárias, ou não transigência, por mais extraordinárias que as doutrinas possam parecer, jamais conseguirá manter ad infinitum o corporativismo ali estabelecido sem prejuízos e retrocessos. O posicionamento hermético das mentes excessivamente regradas, além da ortodoxia, converte a um credo tão consistente que cresce com o tamanho da doutrina, que acasala o pensamento na forma, e derroga toda a liberdade do pensamento mais volátil.

   É importante que percebamos e aceitemos que as doutrinas são necessárias a muitos, mas a visão pode sim transcender aos postulados religiosos pétreos, mormente quando nossa consciência não nos cabe mais como antes, e não conseguimos nos explicar de modo uniforme e retilíneo, como na física. E até a física se supera e se redescobre quando o dinamismo das leis indomáveis do universo pressionam os ciclos predestinados do tempo e ultrapassam facilmente os mais elaborados conceitos dos cérebros humanos, atraindo enigmas jamais antes suspeitados.

   “Conhecereis a verdade e a verdade vos libertará”, uma máxima tão citada, e tão pouco compreendida, pois o autor, Jesus, sendo uma consciência cósmica, como tal liga-se a um infinito. E o que é um infinito senão uma linha mui tênue e imaginária que desenhamos em mente e cada vez mais escapa ao alcance das visões mais privilegiadas e sábias que descem à Terra para aprender e ensinar? 

   E o que será mesmo a verdade, senão nenhuma por si só, mas muitas que se competem e todas que ainda não conhecemos?

Rayom Ra

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