[Capítulo 1 da obra A Missão da Umbanda, por Ramatís, pela mediunidade de Norberto Peixoto, e elucidações finais]
Preconceitos
Racistas contra os Espíritos
Assim, foi delineada a doutrina que se
conhece por umbanda, despida de preconceitos racistas por sua origem africana,
no sentido de agrupar em suas atividades escravos, senhores, pretos, brancos,
nativos, exilados, imigrantes descendentes, enfim, todos os povos do mundo,
sediados em solo brasileiro.
- Ramatís: A Missão do Espiritismo.
PERGUNTA: - O que acontecerá com as práticas mágicas populares, que nos indicais
misturadas aos mais diversos sortilégios, tudo sendo entendido como umbanda pelos
leigos? Não temos de ser eletivos, excluindo-as?
RAMATÍS: - Ocorre um conflito entre dois
caminhos. Um é a integração dos cidadãos hodiernos à práxis, bem informados, o
que redunda, senão na renúncia total às tradições que não se encaixam mais na
sociedade, no mínimo na sua reinterpretação de acordo com valores da
consciência coletiva. O outro é a exclusão dos ritos populares, o que não
contribui em nada e denota comportamento sectário. Há ainda os que preferem
fazer ritos ditos "puros", de preferência só com estudo e sem atender
os reclames dos consulentes.
Exatamente por não ter codificação
doutrinária que a engesse, a umbanda se mostra solução original: dedicada
tecelã, movimenta os fios num liame de continuidade para as práticas mágicas
populares, inserindo-as na dominância filo-religiosa negro-ameríndia,
amalgamada com a prática cristã-espírita-mediúnica. A umbanda é inclusiva, não
sectária, sem proselitismo, tecelã de uma colcha viva do Pai Maior, que é toda
luz e se faz com a costura de muitos retalhos, divina agulha que pacientemente
alfineta as almas rumo ao amor, dando o tempo necessário a cada consciência
para a unificação cósmica; daí a diversificação que cada vez mais se fará
unidade. Assim, os sortilégios e os fetichismos serão amainados qual tenaz
camelo que atravessa um deserto causticante.
Refleti que a eleição do ser é de foro íntimo
e deveis procurar agremiação que vos conduza a um estado psicológico condizente
com vossos anseios espirituais. Quando transferis para os outros valores e
crenças internos, exteriorizando-os na forma de padrões de conduta que excluem,
como faziam aos banidos hereges do pretérito, contrariais o amor que nada
impõe, uma vez que orienta e esclarece sem estabelecer julgamentos, dando a
cada consciência a oportunidade sublime de usar a razão, fundamentando a
amorosidade que unifica, não a que separa a coletividade umbandista.
PERGUNTA: - Mas, se "os 'caboclos', 'pretos velhos' e 'crianças' são o canal
de representatividade com os orixás, formando as sete linhas vibratórias da
umbanda", conforme vossos dizeres, concluiremos que os persas, etíopes,
marroquinos, indianos, árabes, egípcios, indochineses, povos nômades do deserto
(ciganos), entre outras formas de apresentação dos espíritos que caracterizam o
agrupamento do Oriente, são entidades excluídas da umbanda, não fazendo parte
dela?
RAMATÍS: - As entidades estruturais, que
plasmam o triângulo fluídico mantenedor da umbanda, do Espaço para a Terra, são
os caboclos, pretos velhos e crianças. Além deles, aglutinam-se "à
volta" do movimento umbandista, fortalecendo a mensagem libertadora do
Cristo Cósmico e as leis universais, equânimes para todos como o raio do Sol
que não distingue telhado em dia inverna!, todas as formas que servem de veículo
da consciência para os espíritos nas diversas latitudes siderais.
Desde seu surgimento numa sessão de mesa, [1]
quando foi verbalizado pela primeira vez o vocábulo "umbanda", com
toda a sua sonoridade mântrica associada ao mediunismo, seus mentores do Espaço
foram insurgentes contra a exclusão, na época, dos negros e silvícolas,
proibidos que eram pelos dirigentes encarnados de se manifestarem, além de não
autorizarem a passividade dos médiuns para espíritos que se apresentassem como
dessas raças, taxados por eles de inferiores e primitivos. Assim, suas bases
são alicerces evolutivos que incluem, sem preconceitos raciais espiritistas,
todas as etnias excluídas por outras religiões: negros, escravos, brancos,
amarelos, nativos e imigrantes na pátria brasileira, descendentes de todos os
povos do orbe terrícola.
[1] Após
a reunião mediúnica na Federação Espírita do município de Niterói, quando foi
anunciada a criação da umbanda, em sua primeira manifestação por intermédio de
Zélio Fernandino de Moraes, o Caboclo das Sete Encruzilhadas, entre outras
normas do culto nascente, ditou as seguintes diretrizes para a umbanda e para a
fundação da Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade: "Assim como Maria
acolhe em seus braços o Filho, a Tenda acolherá os que recorrerem a ela nas
horas de aflição... Todas as entidades serão ouvidas, e nós aprenderemos com os
espíritos que souberem mais e ensinaremos àqueles que souberem menos; a nenhum
viraremos as costas nem diremos não, pois esta é a vontade do Pai". [Maiores
detalhes em Umbanda e sua História, de Diamantino F. Trindade, 2ª edição, publicação
da Editora Ícone, p. 62.]
PERGUNTA: - O trabalho mediúnico com pretos velhos, caboclos e crianças, formas de
apresentação das entidades estruturais da umbanda no Espaço, pode ser
caracterizado, por si só, como umbandista?
RAMATÍS: - Alguns irmãos médiuns, ao serem
apresentados como "aparelhos" pela umbanda, ficam tão entusiasmados
com o caboclo ou o preto velho que se comportam qual um menino que vai à feira
comprar um curió cantador e volta com um pardal de chilreado rouco, disfarçado,
com o abdome vermelho. Assim, não adianta a mais linda gaiola para abrigá-lo se
sua natureza é outra, que não a de pássaro, não tendo o cântico que encanta os
ouvidos. Está claro que a simples forma de apresentação dos espíritos não
significa a essência umbandista, que é fazer a caridade em nome do Cristo.
Nesses casos, nos dias atuais, mais vale a história, a procedência e a
seriedade do terreiro do que o trabalho das entidades em lugares menos afeitos
às diretrizes de segurança mediúnica, como o são as garagens de residências e
salas improvisadas, sem os imprescindíveis preceitos e descargas fluídicas que
existem nos locais consagrados e unicamente utilizados regularmente para o
exercício da mediunidade caritativa.
PERGUNTA: - É necessário o sacerdócio para poder firmar-se em uma casa de umbanda,
e até mesmo conduzi-Ia?
RAMATÍS: - Não. São necessárias a
mediunidade, a humildade e a simplicidade, as quais imantam a cobertura de
entidades da verdadeira umbanda. Os sacerdotes ministram rituais e não precisam
ser médiuns. Zélio Fernandino de Moraes era simples cidadão, jovem, e possuía
mediunidade inequívoca, que aflorou naturalmente, sem depender de títulos
honoríficos, graus sacerdotais ou iniciações conduzidas na Terra. Aliás, o
preparo espiritual de um medianeiro na umbanda começa muito antes de sua atual
encarnação, sendo precedido de intensa sensibilização energética em seus
chacras e em seu corpo astral, que deverão vibrar muito próximo das vibrações
das entidades que o assistirão. Isso é o que representa a cobertura e a outorga
do plano espiritual superior, e tudo o mais feito na Terra, se não antecedido
da sensibilidade psicoastral potencializada pelos técnicos do "lado de
cá", será improfícuo. Obviamente que, existindo verdadeiramente a
sensibilidade mediúnica, os ritos aplicados em centros de umbanda sérios servem
de roteiro seguro ao médium, que se vê apoiado por seus irmãos umbandistas e
tem o reconhecimento da comunidade que o cerca, aumentando-lhe a segurança para
a sintonia com o outro lado.
PERGUNTA: - E quanto às personagens que se apresentam em alguns terreiros, um tanto
folclóricas, carismáticas, até rudes e violentas, mais parecendo do mal,
emotivamente incentivadas pelo imaginário popular, os boiadeiros, baianos e
marinheiros, trata-se de espíritos da umbanda?
RAMATÍS: - Há um aforismo popular, uma
generalização positiva, muito repassado pelos pretos velhos que diz: "Todos os filhos são gente do Cristo, mesmo
sem o saberem". Não deveis confiar em conceituações negativas, como se
todos os espíritos que se apresentam nessas antigas personalidades fossem
ovelhas perdidas do rebanho do Bom Pastor. Jesus, o Senhor da luz crística,
deixou o paraíso para habitar as trevas eivadas de pecadores. O amado Mestre
ensinava usando parábolas simples, permitindo que todos se aproximassem d'Ele
em suas preleções. É evidente que todos vós, em determinado momento da vida
pregressa de vossos espíritos, já fostes entidades "malfeitoras".
Manifestados na Terra sob as formas mais simples, como a de um cavaleiro
boiadeiro, estivador baiano ou intrépido viajante dos mares, existem anjos
latentes que ainda não germinaram.
Em vez de classificarem esses espíritos, que
estão desabrochando o Cristo interno, de meros malfeitores, como se a luz em
sua refulgência fosse cegá-los, as entidades estruturais da umbanda
fraternalmente aceitam e monitoram suas participações, como auxiliares nos
terreiros que têm essa afinidade, em prol da caridade desinteressada, pelo
natural efeito cármico de vidas passadas que os enreda numa exigência evolutiva
recíproca, num agrupamento de médiuns e consulentes.
Em vez de impor virtudes, excluindo os que
ainda não as possuem, deveis modificar o próximo pelos atos fraternos,
acolhedores, imprimindo confiança e amizade. Lembrai-vos da renúncia e
abnegação dos espíritos luminares que impõem sobre si pesado rebaixamento
vibratório para assistir aos retidos no ciclo carnal, plasmando corpos de
ilusão nas formas astrais de caboclos, pretos velhos e crianças, seguindo o
exemplo do Divino Mestre que encarnou entre vós em missão sacrificial.
Os guias da umbanda acolhem amorosamente
todos os encarnados e desencarnados que adentram os terreiros, difundindo a
Divina Luz nas frontes aflitas, mesmo na escuridão, oferecendo oportunidade de
retificação espiritual aos que a aceitam em seus fundamentos doutrinários.
PERGUNTA:
- Existem alguns guias, mentores
espirituais, que acham absurdas essas infiltrações de espíritos sem luz
misturando-se às falanges de umbanda, afora a possibilidade de fascinarem os
médiuns. Isso existe?
RAMATÍS: - Há de se distinguir a forma da
essência, além das peculiaridades das agremiações mediúnicas terrenas para as
quais essas orientações são válidas. Sem dúvida, existem terreiros que não se
relacionam com a umbanda, mesmo que, embora deturpado, esteja grafado em sua
fachada o nome "umbanda". São agremiações amparadas pelo mediunismo
que exaltam a estética apoteótica dos ritos exteriores: entidades
"incorporadas" com paramentos coloridos e longos penachos, vestidos
de "orixás", como se fossem entrar na avenida carnavalesca, tudo com
muita dança, fumo, bebidas, atabaques ensurdecedores para impressionar a
assistência hipnotizada pela "força" (axé), materializada nos transes
vistosos e no cerimonial barulhento. Ao fundo, longe dos olhos profanos, o
"sagrado" é invocado com o corte ritualístico, em triste matança
sanguinária dos irmãos menores do orbe: cabritos, bodes e galináceos. Ao
término dos cultos festivos, a parte menor da comida de cada "santo"
serve para "fortalecer" os médiuns: vísceras finamente temperadas são
saboreadas com bebidas alcoólicas para "reforçar" a sintonia com os
aparelhos; o quinhão maior é despachado na madrugada nos cruzamentos urbanos e
nas portas de cemitérios, o que dá muito trabalho para os guardiões espirituais
de vossas moradas sepulcrais, uma vez que enxameiam dementados do além-túmulo
diante das entregas cadavéricas ainda recheadas de fluido vital.
Por outro lado, observai em vossa vida
cotidiana: médicos incentivadores do aborto diante de jovens moçoilas
desavisadas; contadores sonegadores de impostos; engenheiros corruptos que
aceitam propinas de empreiteiros; advogados enganadores que se apossam dos
proventos das sentenças dos clientes desatentos. Esses desvios comportamentais
dos cidadãos não devem, no entanto, deixar-vos em estado de ânimo afeito às
"adjetivações" generalistas excludentes, como se todos os
profissionais médicos, contadores, engenheiros e advogados fossem assim, todos
iguais. Da mesma forma, não transfirais para o "lado de cá" vossas
disposições parciais, como o fazeis ao imputardes defeitos à totalidade de
certas formas espirituais, que são aceitas em alguns centros de umbanda como
dedicados auxiliares: "os povos nômades são de venalidade ignóbil, os
baianos safados, os boiadeiros bêbados e os marinheiros mulherengos".
Sabeis que, na abundância de terreiros e na miscelânea de práticas mágicas
populares que se associam com o mediunismo, também existem espíritos de
"caboclos" que recomendam despachos sanguinolentos, e entidades que
se apresentam como "pretos velhos" que amarram namorados e separam
casais e que nada têm a ver com a essência da umbanda. No entanto, também usam
as formas estruturais dos guias que regem a Divina Luz do Espaço para a Terra.
Para clarear-vos um pouco mais as ideias,
importa comentar que a fascinação mediúnica não se relaciona diretamente com as
formas de apresentação dos espíritos nem com a densidade vibratória dos irmãos
do além-túmulo, e sim com a falta de moral evangélica. Os médiuns devem vigiar
as interpretações estandardizadas que interferem nas comunicações com o outro
lado: o hipopótamo que sacode o pescoço e se banha na lama não é mais impuro em
suas entranhas do que o tigre que lambe os pelos na planície. O homem pérfido
fala com erudição, traja-se com refinados tecidos, banha-se em espumas
odorantes e enfeita-se com ourivesarias cravadas de diamantes, sem conseguir a
pureza d' alma do rústico lavrador analfabeto de mãos calejadas que nas horas
vagas é dedicado benzedor na comunidade desprovida de assistência.
Mais uma vez repetimos: não transfirais
vossos atavismos milenares ao julgar as aparências transitórias dos espíritos
do outro lado. Porventura, quando estais mediunizado, "incorporado"
com os caboclos e pretos velhos em dia de passes e consultas no terreiro da
verdadeira umbanda, recusais-vos a acolher os malfeitores, os assaltantes, as
prostitutas, os alcoolistas, os viciados em drogas e outros desavisados
trôpegos e perturbados, que, sedentos, achegam-se das ruas procurando auxílio
espiritual? Nunca é demais lembrar-nos de Jesus, que saiu dos templos
assépticos para socorrer os impedidos de entrar: as prostitutas apedrejadas, os
leprosos fétidos, os marginais e incultos, conhecendo-lhes em cada alma a chama
acesa do Cristo interno que jaz nas profundezas de cada criatura.
PERGUNTA: - Existem chefes de terreiro que são contra a manifestação de espíritos
sofredores, mesmo em sessão mediúnica específica, justificando que podem
"danificar" a sutil estrutura dos chacras dos médiuns que estão
vibrados para "receber" os guias e protetores da umbanda. Alegam
também serem arriscadas tais "passagens", em razão da baixa
moralidade desses "estropiados", pois fazem de tudo para
"colar" nos aparelhos, que devem ser preservados. Devemos proceder
assim?
RAMATÍS: - É uma ilusão querer poupar os
médiuns dessas manifestações, pois o contato com espíritos sofredores de baixa
moralidade poderá ocorrer pelo desdobramento natural do sono, por afinidade e
"peso" vibratório correspondente, demonstrando que as atrações estão
latentes no espírito, prontas para aflorar tão logo as condições propícias se
apresentem. Portanto, o que de fato os atrai é a falta de controle do próprio
sensitivo sobre o apego inconsciente aos desejos carnais.
Se a atração é sentida, mesmo que o médium
não sucumba a ela, não terá ele dominado completamente o desejo pelo prazer
sensório. Ao ficar isolado, e não exposto às tentações de toda a espécie pelos
dedicados diretores terrenos, deixando de passar pelas provações que o
exercício da mediunidade oferece no intercâmbio com os espíritos sofredores,
não sairá triunfante nem terá garantia de que não sucumbirá e será
completamente dominado pelos prazeres da vida material, pois os guias e
protetores, com suas vibrações superiores, não poderão estar todo o tempo com
seus pupilos, como fazem as babás zelosas com os bebês em vossas praças e
parques.
Constatai que ao serdes isolados dos
sofredores que enxameiam no mundo do além não sois ajudados na verdadeira
libertação, embora isso seja necessário para os viciados das sensações do corpo
físico nos primeiros estágios de recuperação. A manutenção da condição
vibratória de vossos chacras e dos corpos sutis à "altura" dos guias
e protetores se efetivará pela vivência, que fortalece o discernimento que faz
refulgir vossa luz interna. São a razão e o bom-senso, atuando na transformação
incessante dos maus hábitos e apegos irracionais que sustentam a
"purificação" de vossos corpos e mentes, tornando-vos livres dos
desejos mais grosseiros, refinando vossa mediunidade, desbastando as ilusões
temporárias que vos fascinam diante da perenidade do espírito, sustentando com
firmeza o intercâmbio com espíritos sublimados do outro lado, ao contrário de
proibições simplórias, como desmerecer o trabalho socorrista com a mediunidade,
como se assim vossa pureza como instrumento fosse mantida.
É por intermédio da renúncia diária diante
das oportunidades de gozos sensórios que se efetiva a destruição progressiva
das ilusões e dos apegos, causa primária da escravidão dos homens ao ciclo
"prazeroso" das reencarnações, que resultará na libertação da
consciência dos grilhões que a prendem aos mundos inferiores.
Podeis afastar-vos dos objetos dos sentidos,
distanciando-vos de um boêmio, bebedor ou prostituta do além-túmulo, mas isso
não vos dará a segurança que o Cristo tinha quando andava entre eles e os
socorria, pois o Divino Mestre não tinha gosto e afinidade por esse tipo de
comportamento e d' Ele irradiava a claridade que fazia indicar o. caminho reto
a todos aqueles que O procuravam, indistintamente, como o Sol que diariamente
ilumina vossas cabeças.
PERGUNTA: - Qual o motivo de o desenvolvimento mediúnico ser tão demorado e de
tantos médiuns começarem na umbanda e não conseguirem se manter nos trabalhos?
RAMATÍS: - São raros hoje em dia os casos em
que a mediunidade irrompe inequívoca e os sensitivos fornecem precisas
comunicações dos guias do outro lado. A inconsciência não mais se verifica e
exige-se uma mudança gradual de comportamento para que os médiuns consigam
realizar as consultas, por várias horas "incorporados" com o caboclo
ou preto velho.
O trabalho na umbanda impõe mudanças
profundas nos pensamentos, que precisam de tempo para serem consistentes e
interiorizados no modo de vida do médium em aprendizado. Ele, conscientemente,
deve livrar-se das emoções e dos sentimentos do ego inferior que atingem os
corpos mental e astral. Com a sutilização desses envoltórios do espírito
imortal, por meio da repercussão vibratória ocasionada pela substituição
definitiva da matéria densa que os forma, [2] propiciada por novos pensamentos
constantes e mais elevados, esses veículos da consciência acabam
"refinados", e os chacras serão ajustados naturalmente às emanações
fluídicas superiores dos guias e protetores.
[2] A
matéria ou substância que compõe os veículos da personalidade - corpos etérico,
astral e mental - provém de seus respectivos planos, que englobam diversas frequências
vibratórias, das mais densas às mais sutis. De acordo com os sentimentos e pensamentos
vibrados pelo espírito - que constituem outras tantas "ações" (ação
emocional e ação mental) -, o combustível ou energia requerida para alimentar
essas ações se agrega no correspondente veículo. As "ações" de
elevada freqüência vibratória (os chamados "pensamentos e sentimentos
bons") utilizam a energia sutil e de alta frequência respectiva e
imediatamente agregam ao corpo em questão a matéria sutilizada; as de baixa
freqüência ("sentimentos e pensamentos maus") precisam utilizar
matéria astral e mental de baixa categoria, que se incorpora ao veículo e lhe
baixa o nível vibratório e o peso específico. A evolução interna da criatura se
efetiva com a substituição gradativa da composição energética ou matéria de
seus veículos, ao influxo das ações mentais e emocionais superiores.
A umbanda, por ser um canal aberto de
entrechoque vibratório com o Astral inferior, implica maiores obstáculos aos
médiuns. A prática mediúnica umbandista tem de ser continuada por longo tempo,
sem interrupções, e trilhada com reverência e devoção esmeradas. A lide
umbandista parece fascinante a princípio, e o neófito anseia por ter logo o
"seu" caboclo ou preto velho. Na verdade, da multidão que ingressa
constantemente nas frentes de trabalho da Divina Luz, apenas uma microscópica
minoria está apta a perseverar e progredir. A grande maioria dos aspirantes
logo enjoa do ritual, não se motiva mais a colocar o uniforme branco e se
impacienta com a demora para ser aceita como médium "pronto". Muitos
acabam desistindo por completo ou mantendo as aparências, com o objetivo de só
se beneficiar dos trabalhos, almejando a melhora milagreira das condições de
existência diante da difícil e "injusta" vida. Fora uns poucos, a
grande maioria não apresenta maturidade espiritual para continuar na verdadeira
umbanda, e muitos acabam por buscar locais em que o mediunismo apresenta
resultados mais rápidos, como o são os das práticas mágicas populares, com seus
cortes ritualísticos sanguinolentos e despachos com animais sacrificados. O
mundo e os objetivos pessoais por que esses cidadãos são movidos bloqueiam a
vontade de servir ao próximo, que é o sacrifício altruístico que a umbanda
impõe a todos.
Refletindo
sobre a umbanda
Refletir sobre a umbanda, compartilhando
conceitos com os prosélitos umbandistas, torna-se algo complexo porque, no
universo ritualístico externo, e no mais das vezes no interno, dada a
diversidade do mundo espiritual, a legitimidade daquele que fala ou escreve
sempre é questionada.
Essa situação leva a uma inibição de muitas
lideranças que poderiam participar mais ativamente da porta de entrada dos
terreiros para fora, para a sociedade, unindo-se a outros terreiros, não
somente para dentro, para o público assistente e corpo mediúnico.
Atualmente, nem mesmo nas comunidades
internas de cada agremiação, é possível um consenso. Ao perguntarmos para cada
médium manifestado (incorporado) com uma entidade o que é umbanda, cada uma
terá um conceito e uma orientação diferente.
Talvez essa situação pudesse mudar se
quebrássemos o tabu de não falar em consciência mediúnica, o que nos traria
muito mais responsabilidade como instrumentos dos espíritos no sentido de que
seríamos artífices ativos, em vez de passivos, do que falamos e orientamos. A
manutenção do tabu da inconsciência, um dogma em alguns terreiros, talvez ainda
a maioria, faz-nos ficar acomodados, pois o que é dito e orientado é "culpa"
das entidades, liberando-nos de maiores esforços, lamentavelmente também de
estudar, pois "o guia faz tudo". Conclui-se, assim, que pouco se
estuda no meio umbandista.
As discussões bizantinas nos terreiros sobre
a "verdadeira" maneira de fazer as coisas, em que sempre se encontram
detalhes ritualísticos, ditos fundamentos, que permitem a diferenciação e dão
ênfase à interpretação pessoal de cada líder-chefe, inclusive dos médiuns
"incorporados" em que a entidade dá a sua opinião, não raras vezes
questionando diretamente a chefia dos trabalhos, só fazem demonstrar a extrema
dificuldade de um campo muito fragmentado em sua relação com o mundo dos
espíritos.
É impossível uma uniformidade na diversidade
da umbanda pelo fato de sua natural convergência não significar unidade
ritualística. Outro aspecto é que a fala dos espíritos pode ser questionada a
qualquer momento pelos chefes de terreiros quando contrariados pela orientação
de um guia "subalterno" na hierarquia do espaço sagrado. Dessa forma,
são muito difíceis quaisquer mudanças na maioria dos terreiros que contrariem o
interesse do dirigente encarnado.
Logo, quando se trata de prática ritualística
e fundamento de cada terreiro, conclui-se que dificilmente haverá uma unidade
em toda a diversidade existente. Diante dessa constatação, infere-se que o movimento
de convergência está, antes, ligado a preceitos mais genéricos.
É consenso fazer a caridade desinteressada, o
maior ponto convergente na umbanda.
Há de se refletir sobre como surgiu na
umbanda a vinculação com sua essência: fazer a caridade. Pode haver críticas,
contrariedades, mas não há como negar que o apelo caritativo da umbanda, assim
como sua ligação com Jesus Cristo, foi instituído pelo Caboclo das Sete
Encruzilhadas pela inequívoca mediunidade de Zélio de Moraes.
Esse canal, desobstruído, natural, simples,
não teve nenhuma iniciação na Terra, não fez raspagens e nunca precisou de
sangue ou corte ritualístico para reforçar seu tônus mediúnico.
O apelo iniciático é dispensado pelo Caboclo
das Sete Encruzilhadas, que preparou seu médium em muitas encarnações antes da
atual personalidade ocupada. Pensemos sobre isto: o Caboclo praticou uma
umbanda mediúnica, não iniciática.
O excesso de ritos de iniciação e a ênfase
sacerdotal criam uma casta hierárquica rígida e podem estar sinalizando
ausência de mediunidade em muitos centros de umbanda. As complexidades
exteriores de métodos que somente uns poucos dominam emboloram a simplicidade
dos médiuns, que, em vez de se interiorizarem para perceber o mundo espiritual,
são condicionados a prestar atenção e a decorar incontáveis procedimentos
externos, bloqueando a natureza da manifestação mediúnica que ocorre e
principia dentro da mente, não fora.
Eis um ponto de contrariedade de muitas
lideranças dos terreiros: a vinculação a Jesus e à caridade desinteressada. O
"mal-estar" não está ligado propriamente a Jesus nas tentativas de
dessincretizar a umbanda, mas ao fato de que a moral contida em Seu Evangelho
contraria muitos interesses. Como excluir. Jesus e continuar com o sincretismo?
O que se está tentando dizer é que o
movimento de reafricanização no meio umbandista, dispensando a umbanda da
imagem de Jesus e da caridade desinteressada, libera os adeptos para que cobrem
pelas consultas e pelos trabalhos, para que realizem tranqüilamente os
sacrifícios dos animais, que dessa forma não se confrontariam com a caridade,
já que matar nunca poderá ser considerado um ato de amor; logo, caritativo.
Esse é o fulcro de toda a desarmonia
existente nas tentativas de se criar uma unidade de preceitos, de fundamentos,
uma mínima ortodoxia doutrinária (é obvio que isso não significa cartilha
dogmática) no seio da umbanda.
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Exu, O
grande paradoxo na caridade umbandística
Seria possível aprofundar essa questão,
polêmica por si, como, por exemplo, refletindo sobre as múltiplas facetas de
exu e a diversidade de interpretações existentes nos cultos.
Desde os idos da antiga África que exu deixa
estupefatos os circunstantes. Para alguns umbandistas, mais ligados à tendência
católico-espirítica, é um grande incômodo, e não são permitidas suas
manifestações. Para outros, liberados de constrições culposas, exu ainda é
vestido pelo inconsciente do imaginário popular com capa vermelha, tridente,
pé-de-bode, sorridente entre labaredas. Há ainda os que "despacham"
exu para não incomodar o culto aos "orixás".
"Exu, sendo considerado entidade, não
deve entrar", dizem os ortodoxos que preconizam a pureza de algumas
nações, pois ali não há lugar para egun, espírito de morto.
Existem os mais entendidos nos fundamentos da
natureza oculta que compreendem exu como o movimento dinâmico de comunicação
entre os planos de vida. Entendem que o axé (asé) impulsiona a prática
litúrgica, que, por sua vez, realimenta-o, pondo todo o sistema em movimento.
Exu, vibração indiferenciada, não manifestada na forma transitória de um corpo
astral ou outro veículo do plano concreto, é o que põe em movimento a forma do
axé, por meio da qual se estabelece a relação de intercâmbio da dimensão física
(concreta) com a rarefeita, a dimensão espiritual.
Em conformidade com essa conceituação, exu
passa a ser indispensável, além de o elemento de ligação mais importante em
toda a liturgia e a prática mágica umbandista.
Sendo exu o transportador, o que leva e traz,
abre e fecha, para os africanistas ligados às tradições antigas, como
concebê-lo sem o sacrifício animal para a realimentação da força vital (o asé),
diante do preceito de que o sangue é o perfeito e indispensável condensador
energético com essa finalidade?
Quando nos referimos a africanista, não
queremos dizer negro. Para ser africanista, no sentido de preconizar a retomada
dos antigos ritos tribais, pode-se ter qualquer cor de pele. Existem muito
negros que têm verdadeira ojeriza a qualquer sacrifício, assim como há muitos
brancos a postos com faca afiada.
Pedimos muita reflexão sobre as próximas
afirmações.
Reduzir toda a movimentação das forças
cósmicas e seu ciclo retro-vitalizador ao derramamento de sangue pelo corte
sacrificial é uma visão estreita e fetichista da Divindade. É uma posição
reducionista, que demonstra dependência psicológica. Na atualidade, verifica-se
que essa "práxis" extrapolou os limites de fé dos antigos clãs tribais
e objetiva a manutenção financeira de cultos religiosos e o prestígio de seus
chefes, dado que o sangue está ligado equivocadamente à força, ao poder, à
resolução de problemas e à abertura dos caminhos. Saber manipulá-lo, ter cabeça
feita, ser iniciado no santo, tudo isso simboliza esse poder. Esse apelo mágico
divino atrai, pelo natural imediatismo das pessoas. em resolver seus problemas.
Afirmamos que é plenamente possível
movimentar todo o axé, harmonicamente integrado com a natureza de amor cósmico
e natureza crística da umbanda, equilibrado com sua essência, que é fazer a
caridade desinteressada e gratuita, sem ceifar vidas e derramar sangue.
O próprio aparelho mediúnico é o maior e mais
importante vitalizador do ciclo cósmico de movimentação do axé. Ele é o
"fornecedor", a cada batida de seu coração, do sangue que circula em
todo o seu corpo denso, repercutindo energeticamente nos corpos mais sutis e
volatilizando-se no plano etérico. Dessa forma, os espíritos mentores que não
produzem essas energias mais densas e telúricas valem-se de seus médiuns que
fornecem a vitalidade necessária aos trabalhos caritativos aos necessitados. Há
os espíritos que vampirizam esses fluidos. São dignos de amor, amparo e socorro
os que fazem as falanges de umbanda.
Apelo
mágico da iniciação: raspar a cabeça e deitar para o santo
Vamos levantar algumas questões para
reflexão. No entanto, não visamos ao julgamento de quem quer que seja, pois o
respeito ao livre-arbítrio é soberano.
Por outro lado, muitos ritos das nações se
contrapõem à umbanda pelo lado estético, exterior: o luxo e a criatividade das
roupas usadas contrastam violentamente com a simplicidade e austeridade
umbandista. Assim, embora o caráter
festivo das cerimônias das nações seja confrontado com a utilidade do trabalho
"simplório" da umbanda, são justamente o luxo e as apoteoses que agem
como ímã sobre os médiuns que estão na umbanda.
Mesmo com o custo excessivo das iniciações e
dos adereços, muitos umbandistas acabam se interessando pelas raspagens e por
deitar-se para o santo, por quê?
Seguem algumas constatações dos motivos:
1º - Na umbanda, os médiuns incorporam
espíritos simples para fazer a caridade anonimamente, identificando-se por
nomes simbólicos. Nas nações, os iniciados se transformam em deuses poderosos
que controlam os trovões e ventos, em que a presença do santo no
"cavalo" é motivo de veneração coletiva. A combinação de música dança,
luxo, decoração, comida gera uma fascinação irresistível sobre os espectadores.
2° - Tornar-se iniciado significa prestigio,
e brilhar nas cerimônias confere autenticidade à manifestação do santo.
3° - Os
que são iniciados e continuam em seus terreiros de umbanda, chefes espirituais,
aos olhos da assistência e dos clientes, se tornam mais "poderosos",
com um axé "mais forte", aumentando a procura por seus serviços
mágicos, o que oportuniza maior ganho financeiro, status e prestigio no mercado
religioso.
4° - Muitos acham que "reforçando"
sua mediunidade, fazendo o corte ritual no alto do crânio, assentando o
"orixá", terão mediunidade mais inconsciente, o que tornará seu tônus
mediúnico mais forte.
Cada vez mais se vê terreiros que se rendem
ao apelo mágico desse tipo de iniciação, introduzindo raspagens, camarinhas,
cortes ritualísticos. Numa segunda etapa, preconizam "libertar" a
umbanda, dessincretizando-a, "africanizando-a" nas tradições antigas,
para dispensar o atrito desses ritos com a essência umbandista: a caridade
desinteressada.
Está
faltando mediunidade na Umbanda?
Pensemos sobre a umbanda. Relembremos o
Caboclo das Sete Encruzilhadas e o canal mediunidade, a manifestação mediúnica
cristalina, inequívoca, num jovem de 17 anos. Reflitamos sobre a essência da
umbanda com o Cristo Cósmico, em sua maior representação que foi Jesus na
Terra.
Qual o motivo de o Caboclo das Sete
Encruzilhadas ter associado o movimento nascente, que era preexistente no
Astral muito antes, à caridade, à disciplina, à austeridade do branco, à
igualdade entre todos, à simplicidade sem ritos complexos e sacrificiais?
Na verdade, pensemos que para ser médium
"basta" manifestarem-se os guias, pois nasce-se com eles. Ninguém na
Terra poderá botar ou tirar os espíritos que estão destinados a trabalhar com
os médiuns. Quem tem mediunidade, quem tem coroa para trabalhar, já vem com ela
antes de encarnar, não precisa pagar para ninguém firmar seu santo, assentá-lo
em sua glândula pineal.
A mediunidade é um dom de Deus, de Olurum,
dos orixás.
A umbanda é mediúnica.
Reflitamos sem julgamentos, fundamentados em
fatos.
Somos umbandistas.
O que é ser umbandista?
Fraternalmente,
Yutomi[3]
O
Caravaneiro do Umbral
[3] Espírito indochinês que outrora atuou
muito como guia batedor, pelo fato de ser profundo conhecedor da "geografia"
das zonas trevosas Umbralinas. Auxiliava as falanges da umbanda a se
movimentarem nessas regiões em suas incursões de resgate, o que o credenciou a
trabalhar nos terreiros da crosta elaborando roteiros de incursões a esses
locais.
Fonte: Do Livro: A Missão da Umbanda, por
Ramatís,
Pela mediunidade de Norberto
Peixoto.
Rayom Ra
http://arcadeouro.blogspot.com.br
Rayom Ra
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