Neste capítulo vamos procurar analisar
aspectos históricos dos patriarcas judeus e suas relações sócio-culturais
formadoras da inicial infra-estrutura do Velho Testamento. Os aspectos
religiosos foram no passado relativamente aceitos sem muitas discussões, muito
embora sem provas concretas suficientes, mas com os historiadores dando crédito
material aos textos bíblicos quando identificavam cidades ou locais fisicamente
conhecidos ou não.
Hoje, porém, esta visão mudou e conturbou
completamente uma possível coerência no processo histórico, sob cujos desdobramentos
os textos bíblicos em diversas ocasiões convergiriam. O que mais causa
divergências e cisões entre arqueólogos, sociólogos, historiadores e
pesquisadores são as diferentes constatações de que as culturas dos povos se
teriam desenvolvido em períodos não coincidentes com aqueles asseverados pelos
textos bíblicos. Em alguns casos, se afastam de tal forma dos relatos
religiosos que robustecem ainda mais a colocação dos argumentos díspares de
quem diverge. Mesmo o Egito não escapa do esquadrinhamento de fatos imprecisos
ou inexistentes e que produzem hiatos na sua memória arqueológica, por não
existir elos sequenciais de elementos concretos corroborantes com as narrativas
bíblicas.
De Adão historicamente nada se pode comentar,
exceto que o texto bíblico descreve propositalmente o paraíso no lugar onde
existiu a antiga Mesopotâmia. O que Adão teria realizado não é cabal nem
procedente, mesmo porque quase nada é dito de seus hábitos em comum com Eva no
Jardim do Éden. A única trilha a seguir no contexto religioso é aquela deixada
por seus descendentes até Noé. Não há, portanto, conteúdo em Adão e Eva como
personalidades, sobre as quais se pudessem analisar e inferir racionalmente
como a história necessita.
De
acordo com nossos cálculos, o começo da povoação da terra com Adão e Eva teria
acontecido há aproximadamente 6046 anos, cifra esta, reafirmamos,
insignificante perante os anais universais e cronologia humana. Aventamos,
porém, que o cálculo judaico de 5769 anos (em 2009), dessa mesma distância de polos
humanos, possa ser explicado pela sabedoria milenar cabalística. A data
popularmente fixada do início de seu calendário é a de 07 de outubro de 3760 a.C.,
e como já nos referimos, apesar da diferença de 277 anos, não muda a espinha
dorsal de nossos cálculos, pois alcançaria os 653 anos que Adão ainda viveria
até atingir 930 anos de idade. Porém, a cabala caldeu-hebraica mantém tradições
herméticas onde se guardam explicações mais profundas não só dos sistemas
numéricos relacionados com as forças divinas, como crônicas e livros sagrados
de uma sabedoria antiquíssima. Esse assunto não abordaremos nesta obra.
Teria sido a Mesopotâmia realmente o Jardim
do Éden? Que a Mesopotâmia foi o berço da civilização dos povos do oriente
médio não há dúvidas. Muito embora ramos étnicos semíticos tivessem alargado o
círculo de seus grupamentos nômades para mais além do Tigre e Eufrates, é
inegável a influência por eles recebida dos povos culturalmente adiantados
viventes na Mesopotâmia. Todavia, o Gênesis bíblico ao prefaciar o Velho
Testamento com a criação da natureza terrena e humana em poucas linhas, sob uma
cosmogonia bastante resumida, não explicaria o necessário, deixando aos
historiadores e pesquisadores modernos uma única saída a fim de tentar entender
a razão e o sentido de tal revelação. E como os operadores da ciência material
são na prática inerentemente agnósticos ou ateus, o concretismo é a única via
de suas pesquisas. Mesmo reconhecendo no ser humano uma psique reveladora de
sensações, pensamentos e toda a sorte de emoções, não é competência da ciência
anelar filosoficamente algo imaterial sobrepondo-se ao material. Nem atribuir
um Deus invisível e intangível a quem a psique, anima, ego ou superego
instintivamente reverencia, se dobra e oferece segundo sua cultura. Na
realidade, permeia-lhe – à ciência concreta – a alma física do anacronismo que
procura exorcizar com esforço racional e tecnológico. E não obstante, um
inevitável paradoxo a obriga a seguidamente reconhecer um paradigma invariável,
persistente e inexplicavelmente constante com a inclinação humana, que vem
revelar sempre na alma dos povos a imorredoura certeza a algo invisível e
superior a todas as demais vidas e formas da natureza.
Dessa maneira, partindo das crenças de genealogias
dêiticas de povos pré-existentes aos judeus, a pesquisa procurou analogias e
paralelos para entender a cosmogonia bíblica. E não foi difícil encontrar
coincidências no Gênesis bíblico com os relatos mitológicos sumérios.
Evidenciava-se que os sumérios tinham chegado
à Mesopotâmia antes do povo judeu, subjugando com suas milícias e adiantada
cultura os semitas ali viventes, conforme já vimos. Alguns registros históricos
apontam 6.000 anos de existência da civilização suméria; outros levantam suspeitas
e suposições de que esse tempo possa ser maior, puxando a lenda do Jardim do
Éden para um período ainda mais recente. Os cananeus, que anteriormente viviam
pela região da Mesopotâmia, seriam antes da invasão suméria pequenas e esparsas
tribos semitas que não podiam representar uma influente cultura. Mas somente
após o êxodo do Egito, e com a civilização suméria decaída e fragmentada, que
os judeus teriam chegado a Canaã dos cananeus na Palestina com sua força
militar e religião monoteísta, lá se instalando. Admite-se que os cananeus,
nessa época, já utilizavam o termo hebreu para designar seu ramo étnico, que os
judeus somente após a conquista de Canaã absorveriam e adotariam. Portanto,
hebreu antes do êxodo, não seria somente epíteto de especial ramo semítico
israelita conforme atribuíam a Moisés e ao povo judeu escravo no Egito.
Além disso, o hebraico é um idioma muito
mais antigo, originário da África e lá existente há mais ou menos 8.000 anos
a.C., levado para a Ásia e depois falado tanto por fenícios como por cananeus.
Sua forma escrita, mais tarde trabalhada pelos rabinos judeus que lhe
introduziriam sinais massoréticos, estabelece similitudes com o aramaico falado
por Jesus e alguns povos da antiga Palestina e Mesopotâmia. Desse modo, os
sumérios teriam sido muito anteriores aos judeus do Velho Testamento e não
poderiam de forma alguma se revestir com um proselitismo judaico, senão o
oposto visto a cultura politeísta suméria, durante milênios, ser a mais forte e
assimilada forçosa ou casuisticamente pelos povos espalhados desde a Síria
Oriental até a Mesopotâmia.
No
capítulo do Gênesis bíblico há a referência ao Deus Criador de todo o universo
trabalhando durante seis dias e descansando no sétimo dia. Jehovah, IHVH
(IEVE), Jah-Eva ou Jah-Hovah, tornou-se o Deus único formador do credo
religioso hebreu monoteísta. Esse Deus, destarte, é muitas vezes mencionado
como Eloha, IHVH Alhim ou Jeovah Elohim. Segundo os hebreus, Elohim eram deuses
conhecidos como co-criadores do universo, da natureza e dos homens. Seriam as
próprias forças criadoras, tantas vezes mencionadas no politeísmo sumério e por
outros povos da Ásia.
Essa relação, ao invés de tergiversar dos
textos bíblicos, vem reforçar a antiga ideia da concepção cósmica por deuses
criadores que o Deus dos judeus sozinho encarnaria e assumiria com o objetivo
de estabelecer uma visão cosmogenética mais simplificada, que terminaria por
não acontecer, visto o relato de o Gênesis ser abreviado, confuso e
aparentemente sem nexo.
Por outro lado, a arqueologia não encontrou
ainda meios para definir uma data precisa, ou o mais aproximado possível, de
quando definitivamente o dilúvio teria ocorrido, se de fato ocorreu conforme
diz o Velho Testamento. Cientistas são categóricos em afirmar que pelos estudos
dos solos, acidentes geográficos e condições ambientais de muitas regiões dos
continentes, até o momento não há indícios de que há milênios tenha de fato
acontecido uma inundação daquela magnitude.
Estudos acurados indicam também que seria
impossível a natureza provocar inundação de uma só vez em todo o planeta,
cobrindo montanhas, oceanos, mares e rios em somente quarenta dias de chuva.
Mesmo chovendo mais do que quarenta dias, se verificaria aumento de volume
ínfimo de água por toda a Terra, embora para nós esse mesmo volume viesse a se
revelar assombrosamente grande. Ademais, segundo ainda afirmam homens da
ciência, a natureza, além de tudo, não reúne condições de formar tanta elevação
de nuvens que possa precipitar uma inundação em escala planetária.
O Noé bíblico, tanto quanto Abraão, Jacob,
José e Moisés, são reconhecidos e respeitados pelo Islam que, principalmente,
consideram Abraão um muçulmano da maior envergadura. Esta atribuição se deve
por sua aceitação e fé a um Deus único, pois nos tempos dos patriarcas não
existia ainda cristianismo ou islamismo.
Noé é frequentemente citado nas prédicas
muçulmanas com elementos adicionais não encontrados no Velho Testamento, como
ilustra uma passagem em que se volta a Deus para lamentar a morte de seu filho,
afogado durante o dilúvio. Deus, no entanto, o consola dizendo que ele
verdadeiramente não era seu filho, pois o procedimento dele era pecaminoso.
Já Ismael, outro filho de Abraão, é
considerado ancestral da linhagem de Maomé, profeta do Islam, e devido a isso
os muçulmanos reclamam totais direitos sobre a Palestina. Os muçulmanos
advertem que os judeus perderam o direito às terras por que as tribos de Israel
haviam mergulhado no pecado ao adotar cultos politeístas pagãos em Canaã, e por
se terem degradado. Deus então os castigou com o cativeiro da Babilônia e
depois os fez dispersar em diásporas pelo mundo, sem país nem pátria.
Sabe-se que o movimento sionista sediado nos
Estados Unidos e Europa, afirmava ter os judeus o direito de voltar as suas
origens na Palestina. Baseavam-se nos argumentos de que eram injustamente
perseguidos no mundo inteiro, principalmente na Europa por autoridades da
igreja processadoras dos progroms, que eram execuções de judeus não
convertidos. O movimento de retomada
judaica, com ajuda do barão de Rothschild no final do século XIX, já
providenciaria assentamentos judeus em primeiras colônias agrícolas na
Palestina. A partir de 1917, os sionistas construiriam assentamentos rurais e
urbanos restabelecendo a cultura hebraica na terra. Em 1933 os judeus já eram
mais de 20% da população palestina.
Em 29 de novembro de 1947, a ONU aprovaria o
retorno dos judeus à Palestina que como estado judeu teria 14000 km2, indo de
Haifa à Telavive e do deserto de Neguev até o Golfo de Acaba, incluindo-se
nesta partilha parte da Galiléia. Os árabes teriam um estado com 11500 km2, da
Cisjordânia à faixa de Gaza. Jerusalém seria elevada a uma posição de destaque
internacional. Essa divisão desagradou os árabes e gerou a guerra que se
estendeu entre os anos 1948 e 1949.
Terroristas judeus promoveriam muitos ataques
contra os colonos palestinos que resistiam à invasão, matando famílias,
queimando suas propriedades e obrigando a enorme contingente de colonos emigrar
para países árabes. Aproximadamente 300 mil palestinos, que insistiriam em
permanecer, passariam a viver em condições sociais inferiores, sem muitos
direitos de cidadãos livres, ou em situações de pobreza em acampamentos. Estas
ações terroristas israelenses são conhecidas como o massacre de Doir Yassin.
A genealogia bíblica estabelece em duas
ocasiões, a cada dez gerações, o aparecimento de um patriarca. A exceção fica
por conta de Jacob – filho de Isaque o primogênito de Abraão – nascido gêmeo de
Esaú. Noé representa a décima geração a partir de Adão, e Abraão é também a
décima a partir de Noé. Porém, há dúvidas quanto à data do nascimento de Abraão
na cidade de Ur, na Caldéia, como acontece com as datas de eventos que incluem
personagens bíblicos. O nascimento de Abraão estaria condicionado ao período
entre os anos 2000 a.C.
a 1500 a.C.
(pelos nossos cálculos teria nascido em 2091 a.C.), e nesse mesmo período se
registraria a reunificação do império sumério após a expulsão dos guti, povo
nômade originário dos montes Zagros, no Alto Tigre. Esses nômades tinham se
infiltrado nas cidades-estados sumérias em 2230 a.C., quando os
sumérios vinham minando o domínio acádio com constantes rebeliões. Os acádios,
por seu turno, povo também nômade provindo do deserto da Síria conquistariam
aos grupos, antes dos guti, as cidades-estados sumérias entre 2350 a.C. e 2340 a.C.
Apesar de alguns historiadores serem
cautelosos num julgamento definitivo sobre a realidade ou não da existência dos
patriarcas bíblicos, outros demonstram o mais profundo ceticismo quanto ao
fato. Grande número de pesquisadores no mundo inteiro, no entanto, está
interessado unicamente em comprovar a veracidade dos relatos bíblicos sem
preconceitos. Achados arqueológicos têm sido para uns a via única comprobatória
de falhas e inverdades dos relatos do Velho Testamento. Duas conhecidas
correntes de estudiosos, nos Estados Unidos e na Europa, divergem em vários
pontos sobre critérios interpretativos dos elementos arqueológicos coligidos. A
Maximalista se apresenta não radical, comedida, postulante da aceitação de
fatos bíblicos como sendo históricos desde que não possam ser contestados nem
sejam comprovadamente falsos. Já a corrente Minimalista desconsidera e julga
falsos os fatos onde não haja evidências possíveis de comprovação.
A nós parece-nos haver grande precipitação
dos Minimalistas em julgar fatos bíblicos dessa forma, pois dificilmente há
consenso ou absoluta certeza de uma amostra arqueológica ou documento histórico
serem eminentemente comprobatórios de mentiras e enganos, ou suficientes de per
si para conclusões definitivamente verdadeiras. Há que haver maiores estudos.
Dúvidas levantadas quanto à existência de
Abraão e, por conseguinte, de outros patriarcas, decorrem também da instituição
de novos hábitos adotados por eles que não seriam nem originais e nem da mesma
época de seus clãs. No caso de Abraão, descobriu-se que hábitos de tribos
semitas idênticos aos esposados ou instituídos por esse patriarca, segundo a
Bíblia, já existiam desde o primeiro milênio da era anterior à Cristo. Um caso
discutido é o modelo de um contrato achado em escavações e atribuído a
pertencer a Abraão, que mais tarde se descobriria ser de data muito anterior ao
patriarca e de prática comum entre antigos semitas. Outro caso é o da
circuncisão instituído por Abraão, a mando de Deus como prova de aliança entre
Deus e sua descendência, mas cuja origem e referência histórica recuam milênios
ao continente africano onde já era hábito de primitivas etnias. Mesmo na
Palestina, os cananeus a praticavam e da mesma maneira os egípcios entre os
períodos do Bronze Médio (2200
a.C. - 1550
a.C.) ao Bronze Recente (1550 a.C. - 1200 a.C.).
Uma história não bíblica conta que Abraão
respeitante ao Deus único, veio ter com Melquisedeque que o abençoou, fortalecendo-lhe
a mensagem de que seus descendentes povoariam a terra como as incontáveis
estrelas se espalhavam no céu. Algumas vezes, os relatores de textos antigos
confundiam Melquisedeque, rei de Salém, com o próprio Deus. Desse modo, Abraão
teria falado pessoalmente com Deus encarnado.
Jacob seria o patriarca a realizar
propriamente as promessas feitas a Abraão pelo Deus único, relativamente ao
povo judeu. Isaque geraria dois filhos gêmeos por Rebeca – sua mulher – chamados Esaú e Jacob. Esaú nasceria
primeiro, vindo Jacob segurando seu calcanhar. Mais tarde, estando Isaque a
morrer, pretendia dar a benção ao primogênito Esaú. Jacob, sabedor de que seu
pai não enxergava bem, e seguindo orientação de Rebeca, vestiu-se com a roupa
do irmão cobrindo o pescoço e as mãos com a pele de cabritos, recebendo de
Isaque a benção.
Jacob
teria tido doze filhos que constituiriam as doze tribos de Israel, porque Deus
trocara o nome de Jacob para Israel. José, seu décimo primeiro filho, acabaria
vendido por seus irmãos a mercadores nômades, sendo levado ao Egito onde um
rico comerciante chamado Putifar o compraria. Mais tarde, interpretaria os
sonhos do faraó reinante na cidade de Mênfis, que segundo a história seria
hicso – povo asiático semita invasor do Egito – onde os hicsos permaneceriam
durante a 15ª. E 16ª. dinastias, sendo depois expulsos. José, já como chanceler
do Egito, mandaria buscar toda a sua família e descendentes, que entrariam no
Egito livremente, mas permaneceriam escravos por 430 anos contados após a morte
de José, sendo finalmente libertos por Moisés.
Neste ponto começa a maior das polêmicas
envolvendo a criação da Bíblia. A tradição sacerdotal (a mesma que religiosa)
atribui a Moisés a autoria dos cinco primeiros livros. Investigadores rechaçam
a existência de Moisés, sua origem hebraica e todos os seus atos fantásticos
praticados no Egito e fora dele, obedientes à vontade do Deus de Israel. Os
fatos concatenados pela arqueologia e pesquisadores não sequenciam uma relação
histórica conducente ao libertador hebreu.
A história argumenta que havia constantes
emigrações de povos semitas ao Egito em busca de água, alimentos ou trabalho
assalariado muito antes do período bíblico do êxodo. Em épocas turbulentas, ou
quando o governo egípcio necessitava de mão-de-obra, os estrangeiros eram
proibidos de sair do país, sendo feitos escravos. Os egípcios, já antes de
Moisés, mantinham possessões nas regiões da Palestina e Mesopotâmia cobrando
impostos nas cidades-estados, e realizando toda a sorte de comércio. Portanto,
era comum o intercâmbio egípcio com povos semitas e povos de outros países
distantes, como a Grécia. Os gregos, por oportuno, gozavam de respeito e
prestígio no Egito.
Quanto a José, sua possível existência é
admitida pelos historiadores pelo fato de terem encontrado provas arqueológicas
identificadoras de hábitos ou de acontecimentos da vida egípcia, coincidentes
com as descrições bíblicas à época em que José lá teria vivido. Mas quanto a
Moisés, afirmam, nada comprova sua existência, sendo também pouco provável ter
existido um Moisés egípcio ou hebreu, ou mesmo parte egípcio parte hebreu.
Ademais, não há qualquer referência nos anais egípcios identificadora da
ocorrência das dez pragas relatadas no livro do Gênesis. Na época da partida do
povo israelita muitos outros semitas lá permaneceriam, e somente mais tarde
viajariam ou não de volta para seus grupamentos étnicos de origem, em pequenos
êxodos, como sempre acontecia. Porém, em existindo de fato aquele êxodo
espetacular narrado no Velho Testamento, de seiscentos mil homens israelitas
além de mulheres e crianças, teriam também se misturado aos israelitas, os
caldeus, danus, filisteus, arameus e tilkers, visto a Bíblia deixar
subentendida a não permanência no Egito de nenhum outro escravo semita após o
êxodo, senão unicamente os livres nativos egípcios.
A história não desata e os religiosos somente
repetem a Bíblia ou ressaltam manuscritos apócrifos. Neste ponto, as duas
correntes são inconciliáveis, mesmo por que o religioso crê, imagina e se
satisfaz. A história, ao contrário, manuseia, tange, rearticula e procura
comprovações sem o que nada pode guardar, afirmar ou restabelecer.
São muitas as lendas de um hebreu que teria
nascido no Egito de mãe judia e lançado ao Nilo com três meses de idade. Esse
ato extremo o teria realizado a mãe de Moisés por que o faraó antes determinara
que todos os recém-nascidos varões, filhos de Israel, fossem mortos pelas
parteiras hebreias Sifra e Pua. Visto os meninos judeus continuarem a nascer
porque as parteiras não os matando mentiam ao faraó, dizendo chegar sempre
atrasadas aos partos, o faraó mandou seu povo lançar ao Nilo todos os meninos
hebreus recém-nascidos.
É dito em êxodo 2; 1 a 5, sobre o nascimento de
Moisés:
“Foi-se um homem da casa de Levi e casou com
uma descendente de Levi. E a mulher concebeu e deu à luz um filho; e vendo que
era formoso, escondeu-o por três meses. Não podendo, porém, escondê-lo por mais
tempo tomou um cesto de junco, calafetou-o com betume e piche, e, pondo nele o
menino largou-o no carriçal à beira do rio. Sua irmã ficou de longe para
observar o que lhe haveria de suceder. Desceu a filha do faraó para se banhar
no rio, e as suas donzelas passeavam pela beira do rio; vendo ela o cesto no
carriçal enviou a sua criada e o tomou.”
Moisés seria criado por sua própria mãe
descoberta nas proximidades do rio, e mais tarde, já grande, iria ter com a
filha do faraó que a partir de então o criaria como filho. A tradição religiosa
afirma ter Moisés realizado coisas grandiosas no Egito antes da saída israelita
do cativeiro. A corrente de desconfiados historiadores continua negando aqueles
feitos e a origem hebraica do salvador.
Neste particular, inferimos que
historicamente o termo hebreu poderia perfeitamente ter sido adotado pelos
judeus no Egito, uma vez que os cananeus, como vimos, assim se denominavam há
milênios, antes mesmo da conquista suméria na Mesopotâmia. Povos semitas já
mencionados emigravam aos grupos para o Egito em constantes e temporárias
viagens, podendo alguns grupos cananeus ter lá permanecido também escravos, e
se misturado aos israelitas. Consoante a regra comum de trocas e absorções
culturais de ramos étnicos na convivência simples ou estreitada, e consoante ao
caldeamento étnico que forçosamente acontece nesses casos, ocorreriam também no
Egito semelhantes fatos. Assim, adicionamos esse ingrediente às discussões
históricas, quando entendem que a designação de povo hebreu se incorporou
idiossincraticamente aos israelitas somente no retorno judeu à Canaã, tendo
existido o êxodo ou não.
A propósito da discussão sobre o êxodo,
decorrem muitas outras dúvidas da existência de locais, povoações e cidades na
época desse grande acontecimento. Os 40 anos de peregrinação pelo deserto, sob
penitência imposta pelo Deus IHVH, são da mesma forma postos em dúvida, e
também devido ao fato de Josué não ter escrito o sexto livro na sua totalidade,
embora não tenha havido maiores preocupações durante séculos para esclarecer o
fato. Uma das evidências constatadas nas investigações sobre Josué, reside nos
diferentes estilos empregados nas narrativas com datas diversas. Os textos
mostram os pronomes “nós” e “nos” revelando que mais de uma pessoa
testemunharia os acontecimentos e colaboraria na manufatura do livro. Outra
evidência ocorre nas descrições dos acontecimentos que teriam lugar após a
morte de Josué, como as conquistas de Hebrom e Dã por Otoniel. Sobre isto,
defende o Talmude, o livro sagrado judeu, que os últimos versos do livro de
Josué teriam sido escritos por seu filho Pinkbas.
Por outro lado, cidades como Ai, Gabaon e
Jericó, segundo comprova a arqueologia, ainda não existiam no século XIII a.C.,
logo não poderiam ter caído em mãos israelitas conforme atestam os textos
bíblicos. A existência do próprio Israel como entidade histórica e a maneira
soberba como vem descrita é fartamente contestada. Os historiadores e
arqueólogos sugerem que ao invés do grande êxodo, Israel teria emergido dos
cananeus e a nomenclatura Israel atribuída às doze tribos de Jacob, também
surgiria na antiga Canaã sob influência egípcia, não sendo, portanto, primazia
do patriarca judeu a originalidade do mencionado epíteto quando Deus substituíra
seu antigo nome. O império egípcio, como vimos, estendia-se além de suas
naturais fronteiras alcançando cidades-estados palestinas e mesopotâmias. Daí,
influenciar cananeus, e, neste caso, israelitas. Os cananeus, tribos árabes
provindas da Ásia à época de suas migrações da Mesopotâmia para a Palestina, se
infiltrariam e se instalariam em locais diversos. A teoria dos historiadores
admite que os israelitas, mediante os extorsivos tributos egípcios, teriam se
afastado da antiga Canaã migrando para as montanhas do Efraim, lá se espalhando
por diversas regiões constituindo outros povoados. Por outro lado, o nome Israel
é uma aglutinação epônimo de Isis (mãe natureza ou alma universal), Ra (deus
solar, pai) e El (sufixo designativo de majestade, poder ou senhor), todos do
panteão de deuses egípcios.
Mais tarde, se verificariam pequenos êxodos
dos nômades israelitas de volta à Canaã, devido aos seguidos conflitos com os
primitivos moradores do Efraim, com ocupação gradual e pacífica das
cidades-estados cananeias, sem existir, portanto, a tomada à força através de
guerras, conforme afirma o Livro de Josué. Desse modo, os israelitas teriam
voltado às suas origens por outros motivos, tendo continuado o culto da
circuncisão, bem como mantido a proibição do consumo de carne suíno. Reafirmam,
assim, os pesquisadores, que esses mesmos hábitos sócio-religiosos, os
israelitas já os possuíam antes das migrações a Efraim, por que teriam sido
passados pelos egípcios aos cananeus.
Todos estes fatos descaracterizariam um
preâmbulo ao aparecimento dos reinos de Davi e Salomão, pois as provas
arqueológicas vêm alinhar elementos concretos de negação ao estabelecido nos
livros bíblicos, reforçando antigas e profundas dúvidas históricas e
desconfianças, que fragilizariam os mitos da existência dos patriarcas e
narrativa do êxodo hebreu. Ao mesmo tempo, assomam cada vez mais certezas de
que o conteúdo do Velho Testamento não seja outra coisa senão uma fábula ou
grande ficção, aliado aos fatos adicionais de que Samaria e Jerusalém, nas
épocas dos reis Davi e Salomão, seriam cidades com populações insignificantes,
portanto não dignas de representar tão majestosos e faustuosos impérios.
Entretanto, a polêmica continua.
[Capítulo IV do Livro "O Monoteísmo Bíblico e os Deuses da Criação" por Rayom Ra]
Texto revisto em 06-11-2016.
Leia também o Capítulo V de "O Monoteísmo Bíblico e os Deuses da Criação":
Clique em" 1. -Arca de Ouro: A Montagem da Bíblia (A)
2. -Arca de Ouro: A Montagem da Bíblia (B)
[Capítulo IV do Livro "O Monoteísmo Bíblico e os Deuses da Criação" por Rayom Ra]
Texto revisto em 06-11-2016.
Leia também o Capítulo V de "O Monoteísmo Bíblico e os Deuses da Criação":
Clique em" 1. -Arca de Ouro: A Montagem da Bíblia (A)
2. -Arca de Ouro: A Montagem da Bíblia (B)
Rayom Ra
http://arcadeouro.blogspot.com.br
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