“A existência que temos agora não é real: é uma ilusão. O que vemos como existência é basicamente engano. Tudo o que vemos, percebemos, experienciamos, tocamos e ouvimos está filtrado por elementos subjetivos de nossa psique; consequentemente, não enxergamos a realidade. É através de uma perfeita morte que adquirimos a percepção do que seja realidade.”
“Losar la tashi delek!” Isto é tibetano para “Feliz Ano Novo!” Hoje é o primeiro dia do Novo Ano Lunar correspondente ao novo ano Aquariano, começado exatamente há duas semanas.
Ao prefaciar a palestra de hoje quis mencionar isto por que um novo ano representa um reinício, um novo ciclo que chega. Eis por que no Oeste simbolizamos o ano novo com uma criança recém-nascida. É como Samael Aun Weor nos passou em seus escritos: “Podemos aprender muito pouco do fenômeno do nascimento, mas da morte podemos aprender tudo.”
Quando há um nascimento – por exemplo, um novo ano iniciando – isso somente se torna possível pelo término de algo mais. O grande ciclo de começo e fim é a base de todas as coisas, em cada nível da natureza. Todas as coisas começam e terminam em grandes ciclos – grandes ciclos ou espirais. Não importa onde olhemos na natureza; em qualquer nível do universo encontramos começos e fins. Em cada fenômeno de matéria ou energia manifestada há um começo e um fim; ou ainda – e também – nada começa nem nada termina. As coisas continuam mudando unicamente em alguns graus, exatamente como num ano que se foi e noutro que tenha chegado.
Ou seja: fluindo através de todos os começos e fins estão as grandes progressões ou movimentos de energia. E aqueles movimentos de energia formam um continuum; um fluxo que não tem começo nem fim, mas que é uma série de começos e fins. Este exemplo encontra-se exatamente no âmago da Gnose: a compreensão e apercebimento do nascimento e morte, mas não somente o nascimento e morte de um corpo físico, também o nascimento e morte de uma alma, de um planeta, de um universo.
Nas poucas e próximas palestras estaremos dando ênfase e analisando o tema da morte. A morte tem muitos aspectos, muitas facetas. Analisaremos e estudaremos a morte de nossos corpos físicos. Bem sabemos ser assunto desconfortável para a maioria das pessoas, mas não precisa ser.
Para o sério gnóstico a morte é o triunfo. A morte é nossa coroa; é a coroação do gnóstico. Isso não quer dizer que o gnóstico busque pela morte física como uma escapatória, um meio de evitar a vida; ou que o gnóstico queira apressar-se para ser morto fisicamente. Não é este o sentido de nossa exposição. A pessoa gnóstica – ele ou ela – trabalha intensamente para preservar a vida e faz de tudo sob seus poderes a fim de protegê-la, incluindo a sua própria vida. Todas as vidas são extremamente preciosas. O que o gnóstico aspira para mais adiante é a morte perfeita: a morte no momento certo, na hora certa, uma vez que essa morte perfeita é o portal para a real existência.
A existência que temos agora não é real, mas uma ilusão. O que vemos como existência é basicamente engano. Aquilo que vemos, percebemos, experienciamos, tocamos e ouvimos está filtrado por elementos subjetivos de nossa psique; consequentemente, não enxergamos a realidade. Através de uma perfeita morte, adquirimos a percepção do que seja a realidade. O objetivo do gnóstico é alcançar uma perfeita morte, e para isto ele se prepara diariamente. É possível dizer-se que a Gnose é uma ciência de treinamento para a morte. É um processo de irmos morrendo e que conduz a iniciarmos novos níveis de nascimento. A trajetória de nossa existência – a partir daí – é orientada para o interior de formas de vida mais elevadas.
A morte é o objetivo para o verdadeiro gnóstico que esteja praticando seriamente, sendo irrelevante ele ser chamado de gnóstico, budista, muçulmano, indú ou cristão. Por gnóstico, significamos alguém que esteja adquirindo consciente experiência espiritual. Pois, para aquela pessoa, o seu processo espiritual é o de ir morrendo – não fisicamente – mas, psicologicamente. O real trabalho espiritual é um processo contínuo de morte psicológica radical, pelo qual tudo o que seja ilusão, tudo o que seja falso, morre, e o que renasce é a verdade, a percepção daquilo que seja realidade.
A fim de começarmos a experienciar esse processo da morte, necessitamos estuda-la, entende-la e não evita-la. Culturalmente, a evitamos. A questão da morte deixa-nos – a maioria de nós – verdadeiramente desconfortável. Fazemos o melhor possível para ignora-la e isso é o nosso maior detrimento. O mais significativo indicador de uma profunda ignorância é exatamente querermos ignorar o principal significado da morte. Notamos que esse hábito vem se tornando mais pronunciado conforme avançamos em idade.
Dentre pessoas mais velhas, encontramos com frequência a tendência em não usar a palavra “idoso.” Elas pretendem dizer: “eu tenho 80 jovens anos”, e sorriem, achando isso gracioso, mas em realidade é tolice. Isso revela o indicativo de que a pessoa não se sente inclinada a reconhecer o alcance de sua idade e nem estaria esperando a morte. Os mais velhos devem ser respeitados e reconhecidos por suas experiências e percepções; entretanto, na moderna cultura do Oeste, eles não são tratados assim, uma vez que nós mesmos não queremos encarar a nossa própria letalidade. Evitamos os idosos porque não desejamos nos tornar como eles. Preferimos não interagir com pessoas idosas e quando assim fazemos, pretendemos que seja o mais rápido possível e que logo estejamos livres daquilo.
Por isso, na cultura do Oeste, nos inclinamos a alojar pessoas mais velhas em algum outro lugar onde não tenhamos de vê-las a toda hora; da mesma forma agimos com pessoas doentes. Tradicionalmente, noutros tempos, o doente idoso era cuidado em casa, mas agora é normal não fazermos mais isso. É um sinal de nossa ignorância, de nossa aversão à realidade, pois não queremos aceitar o fato de nós próprios morrermos. Ficaremos velhos, doentes e morreremos, mas pretendemos ignorar todas essas coisas. Não queremos a aceitação ou a compreensão da morte.
A tradição gnóstica ensina e enfatiza a importância da morte, devido a ser ela de grande relevância no caminho espiritual. Para sermos verdadeiros e experientes praticantes da espiritualidade, não devemos evitar a morte. Verdadeiramente, temos de abraça-la. Para o atento praticante da espiritualidade, alguém realmente com experiência neste caminho – em outras palavras, um verdadeiro gnóstico – a morte cessa de existir como fonte do medo. Contemplemo-la – pois para a maioria a morte é uma viagem que transmite grande medo e incerteza!
Nesse sentido, ficamos terrificados quando ignoramos a verdade. Não sabemos o que nos acontecerá ao morrermos; por isso, temos muito medo devido aos nossos apegos e consequentes sofrimentos. Não queremos perder nossas famílias e nossos amados. Eis porque estaremos ensinando sobre isto nas próximas poucas aulas, a fim de nos ajudarmos a superar nossa própria ignorância.
Espiritualmente, a fim de obtermos sucesso, necessitamos não ter medo da morte; ao invés, é esperarmos por ela e não corrermos em sua direção, mas vivermos cada dia para nos preparar ao inevitável: morreremos, sem dúvida, e nenhum de nós saberia quando.
Em circunstâncias normais, se soubéssemos que um grande evento estivesse chegando, nos prepararíamos para ele. Se estivéssemos para fazer uma viagem ou jornada, faríamos tudo o que fosse necessário para nos preparar antecipadamente, de modo que quando o momento chegasse e tivéssemos de partir, estivéssemos prontos. Entretanto, quem de nós estaria preparado para a morte, que também é uma grande jornada onde todos um dia haverão de nela estar? Não estamos preparados. A verdadeira Gnose é sobre nos prepararmos diariamente – estarmos prontos – de modo que chegando a morte não sejamos tomados de surpresa, ao invés, estejamos cônscios, atentos, não a evitando, não a ignorando, simplesmente aguardando-a.
Em circunstâncias de morte, podemos antever que um gnóstico portador de uma real experiência espiritual, consegue encarar a morte como a oportunidade de uma mudança para algo melhor. Encontramo-nos muito presos à vida, mas não a compreendemos. Temos muito medo da morte e também a esta não a compreendemos. Se compreendêssemos a vida, entenderíamos que ela é agora um fluxo de sofrimento; e se compreendêssemos a morte, entenderíamos que ela é a oportunidade para transformar o sofrimento.
Muitas vezes vemos alguém muito doente que sofre intensamente; então despendemos grandes quantidades de energia e esforços a fim de alongar a vida daquela pessoa. Mas há casos em que seria bem melhor ela logo morrer e vir ocupar novo corpo, a continuar com seu sofrimento por dias, semanas, meses ou anos. Isso acontece devido a não compreendermos sobre vida e morte.
De modo geral, não há entendimento do que acontece quando se morre e isso traz grandes sofrimentos ao mundo, não somente para quem esteve muito mal, mas também para os familiares e àqueles que conviveram muito próximos daquela pessoa. Se entendêssemos realmente o que seja a morte, ficaríamos felizes por quem morre e celebraríamos a oportunidade que ele ou ela teve de se mudar para outra situação.
Na tradição gnóstica, a morte é um tema de grande importância, celebrado e não evitado. E por tradição gnóstica significo todas aquelas tradições no mundo que possuem a real Gnose e verdadeiramente a ensinam, incluindo as tradições de Samael Aun Weor, a pura tradição do tantra na Ásia, dos astecas e maias e a tradição do islam, particularmente relacionada com os sufís, a pura tradição cristã .
Figura 01.
Padmasambhava
A imagem de um Buda sentado mostra o Padmasambhava, também chamado Guru Rinpoche. É possível reconhece-lo pelo seu bigode, sua barba e também pelo seu chapéu, suas vestes vermelhas e seu bastão que ele mantém em seu braço, mostrando vários elementos simbólicos. No topo há uma trindade – um tridente – representando as três forças, três joias, três corpos ou kayas. Abaixo disso vemos um crânio. Isto não é acidental nem decorativo unicamente para assustar. Na verdade está mostrando a função da morte em sua iluminação, em sua realização. Na sua mão, ao colo, ele segura uma concha óssea de um crânio humano e dentro daquela concha há néctar, ambrosia, amrita, o alimento dos deuses.
Esse é um simbolismo muito rico, destacadamente relacionado com a morte – a morte da mente, do “Eu”. São três as transformações de vida e morte onde encontramos o elixir da longa vida, da imortalidade: a ambrosia dos deuses.
Figura 02.
Meditação e Morte
Esta outra imagem de homem mostra alguém meditando numa cabana ou pequena construção para fins de meditação, estando ele com olhos abertos a observar um corpo humano sendo consumido por um lobo e aves.
A maioria das pessoas ao ver este tipo de imagem sente repugnância – o que é uma rejeição. Observemos em nós próprios aquele impulso de não olhar para não ver. Esse mesmo impulso de não olhar para a realidade da morte é um sinal de nossa aversão a ela; um sinal de nossa ignorância. O gnóstico precisa olhar frontalmente para o contexto de todas as experiências, não as evitando ou delas se aproveitando, mas ao invés, as compreendendo.
Esta imagem representa o ensinamento fundamental de todas as formas de budismo e de gnose, servindo para a compreensão da inevitabilidade da morte. Eis por que, em nível de instrução fundamental sutrayana, todos os estudantes passam por um extenso período de meditação, visualizando, imaginando as suas próprias mortes, não uma única vez, mas, diariamente. A maioria das pessoas quando ouve sobre isso, pensa: “isso é tão mórbido! Por que fazer assim? Isso vai unicamente faze-los miseráveis!” É assim a reação do ego, a reação do “Eu”, que é o nosso obstáculo para a iluminação.
A realidade é que todos nós morreremos, mas não nos damos conta disso, não nos conscientizamos; não compreendemos. As evidências são abundantes. Alguém que soubesse de sua morte esta noite mudaria a sua programação? Seriam suas atividades para o restante do dia tão diferentes do originalmente pretendido? Claro, se soubéssemos que iríamos morrer hoje faríamos tudo diferente. Isso prova a nossa falta de conscientização da morte, uma vez que é 100% possível para qualquer um de nós ou para todos nós virmos a morrer hoje.
Ninguém pode discordar disso. Nenhum de nós pode se a morte estiver a caminho. Este edifício poderia colapsar; haver uma explosão de uma rede de gás; uma guerra; uma bomba; uma doença. Poderia existir um sem número de outras causas chegando a qualquer momento, sem nenhuma interferência de nossa parte, de nossa habilidade para subjugar ou controlar. A morte frequentemente vem assim, como o estalar de dedos. Os cemitérios estão lotados com pessoas que foram surpreendidas pela morte.
Se fôssemos cônscios de nossa própria e inevitável morte, o nosso comportamento seria muito diferente. Eis por que é importante estudar: meditar diariamente sobre a nossa própria morte. Mas não é como simplesmente meditar, dizendo-se: “um dia morrerei, então é preciso ser uma pessoa melhor, espiritualista; mais praticante.” Ótimo pensar desse modo, mas a verdadeira prática é passar o tempo visualizando a morte completa de seu corpo.
Tomemos um momento agora. Sintamos o que é estar num corpo. Sejamos realistas de que o corpo simplesmente morrerá. Que a vida irá se retirar dele e todas as suas funções virão estancar. O sangue terminará o seu fluxo, a respiração virá parar o seu movimento, o cérebro se fechará, os órgãos não mais trabalharão e todo o calor começará a se retirar em direção ao coração; então, o corpo finalmente se tornará frio e nunca mais se moverá. Sentem terror? Medo? Eis o motivo de meditar, a fim de que no momento em que a morte nos chegue não sintamos medo.
No instante em que morrermos, o nosso estado mental determinará o que virá em seguida. Se morrermos temerosos, aquele temor nos impulsionará. Ouçam: não queremos aquilo. Queremos morrer em harmonia e paz – equilibrados em nosso estado psicológico – a fim de atravessar o portal da morte conscientes de uma nova vida.
A vida é muito complexa. Vejamos agora tudo da vida sob nossa imaginação. Não exatamente a nossa vida, mas toda a vida; tudo o que seja vivente. Imaginemos a inteireza da vida em cada nível: moléculas “quanta”, células, órgãos, organismos, famílias, comunidades, sociedades, cidades, países, continentes, planetas, sistemas solares, galáxias, universos.
A vida é gigantesca! É muito difícil abranger sua realidade num só pensamento – a essa imensidade – a tudo o que é vivo. Constatamos, porém, o quão complexa, bela e terrificante ela é – e sendo somente um lado de uma grande moeda. Quando viramos essa moeda, ela é morte e ao mesmo tempo ela é exatamente rica, complexa, sofisticada, bela – porém a nós, parecendo-nos ainda terrificante como vida – e ignoramos completamente sua verdadeira realidade, apesar de, através de incontáveis eras, tenhamos passado de um lado a outro da moeda.
Como realmente saber se isto é a verdade? Primeiro: alguns de nós nos lembramos do que aconteceu entre vidas. Mas o restante de nós não lembra. Então, para eles nós usamos análise lógica. Sabemos que algo existe no outro lado, uma vez que temos conhecimento sobre energia. Qualquer um que tenha estudado física ouviu falar de Einstein, e o grande presente que ele nos legou foi este: “Energia não pode morrer. Energia não pode ser destruída.” Cientificamente, esta é uma declaração muito profunda e bela em termos de ciência materialista. Entretanto, também é da maior importância para a nossa alma.
A alma – a consciência – é energia. Podemos testar isso. Quando prestamos atenção a alguma coisa usamos energia. Quando alguém presta atenção em nós podemos sentir isso; podemos sentir a energia dela. Podemos estar de costas para a pessoa, mas no momento em que ela nos olha, quando presta atenção em nós, podemos sentir a sua presença e nos voltamos, inquirindo-nos: “alguém está me olhando?”. Todos conhecem isso, já experienciamos coisas deste tipo. Podemos acusar a energia da consciência, a atenção daquela pessoa. Agora, conosco: nossa consciência é fraca e reduzida; não possuí muita força, não está treinada; mas podemos treiná-la, podemos fazer coisas com ela que a maioria das pessoas mal possa imaginar.
A consciência é uma energia e energia não pode ser destruída. Significa que a consciência não morre. A consciência é uma energia que muda segundo a causa e o efeito. Eis o que precisamos entender: como ela muda, quais são as causas e quais são os efeitos. Ao afirmarmos que a consciência não morre, precisamos também entender como ela se encontra relacionada com a morte.
Existe um grande ensinamento sobre morte e vida – que pode nos ajudar bastante – quando tentamos entender. Se, vida, energia e consciência não podem morrer, como então elas se mantêm relacionadas com esta vida, com as vidas anteriores e vidas subsequentes? Se pudermos aceitar o fato científico de que a energia não pode ser destruída e, consequentemente, a consciência sendo uma energia, não pode também ser destruída – o que lhes acontece após morremos? E o que lhes acontece antes de nosso nascimento? Isto é algo sobre o que não sabemos. Eis por que temos medo. Mas podemos encontrar as resposta a estas indagações ao ficarmos cônscios sobre o que acontecerá nesta noite.
Cada vez que nos deitamos e dormimos, “morremos”, ou seja: a mesma coisa acontece conosco quando morremos, pois a energia da consciência é modificada. Ao invés de a energia permanecer aqui no corpo, no sono, ela se ausenta e experienciamos o que é chamado de sonhos. Após certo período de tempo, durante o qual o corpo físico permanece em descanso, como um cadáver, a consciência é puxada de volta para dentro do corpo.
Talvez, o alarme do despertador soe e alguém nos acorde ou tenhamos o hábito de nos levantar em certo horário; então, o corpo se agita, a consciência volta e por um momento consigamos nos lembrar: “estive trabalhando durante o meu sono, fazendo isto e aquilo.” E após uns poucos minutos nos levantamos, e estando ativos começamos a fazer coisas, não nos lembrando de mais nada do que teria acontecido em nossos sonhos, certo?
A maioria das pessoas lembra muito pouco de seus sonhos e muitos de nada lembram. É exatamente isso o que acontece quando se morre, exceto que geralmente é de forma mais traumática, pois quando se morre isso não acontece na mesma paz de quando vamos dormir a noite. De modo geral, morremos devido a males, doenças, dores e sofrimentos ou através de uma morte traumática em que a nossa consciência é impulsionada a um estado de ser ao qual não temos lembranças; daí, de novo impulsionada a um estado de nascimento traumático e doloroso, sobre o qual também não temos memória.
Se quiserem saber o que nos acontece quando morremos, prestem atenção ao que lhes acontece quando dormem à noite. É exatamente o mesmo processo. A única diferença consiste em que, com a morte, a conexão entre a consciência e o corpo é interrompida. Em outras palavras, nossa energia é retirada do corpo que morre, mas a consciência prossegue modificada pelo carma: por causa e efeito.
Razão pela qual, aquele que visualiza esse cenário estará meditando. E eis por que aquele que medita estar sempre visualizando a sua morte e o desmembramento de seu corpo. Pois ele permanece treinando a sua consciência a fim dela estar preparada para a realidade de que o corpo é impermanente, ao invés de a consciência ficar abraçada ao seu corpo.
O corpo é não “eu.” É o não eu “pessoal.” O corpo é um barco. É como roupas. Quando vamos comprar roupas ficamos muito excitados e apegados. “Ó, adoro minha nova camisa!” e amamos isso por pouco tempo; então, após ela estar gasta, a deixamos de lado e vamos comprar uma nova camisa. O mesmo acontece com o corpo. Ele dura por um certo tempo; e quando ele fica desgastado vamos precisar de um novo corpo. Eis por que nascemos e morremos. A compreensão a esse fato produz equanimidade, desapego. Isso nos permite ultrapassar conscientemente e com conhecimento, a essas transitoriedades ou mudanças.
Figura 03
Esta imagem é uma pintura de um Mahasiddha, um grande praticante de nome Liuppa, um yogui tibetano e mostra este yogui comendo tripas de peixe. Seu apelido é Gut comedor ou comedor de tripas de peixe. Todos pensam aquilo ser algo desagradável. Mas prestem atenção. A aversão provocada é significativa. A razão pela qual esta imagem foi retratada e a história deste meditante nos ter chegado, após centenas de anos, é de nos mostrar um ensinamento representado por sua vida.
Ele não estava comendo tripas de peixe para nos impressionar. Sabemos como as crianças fazem: “Eu vou comer aquela coisa ruim se você não me der uma moeda!” Não é por esta razão que ele estaria fazendo aquilo. Luippa está comendo as entranhas de um peixe como a representar o treinamento que alguém necessita ter em mente, a fim de não ser enganado por quaisquer sensações e as consiga ver como elas são.
Ele estava treinando a mente para estar equilibrada e ter um só sabor – que é o sabor da realidade – e não ser enganado pela sensação prazerosa sem evitar a sensação desagradável, mas sim, conseguir compreende-la e não ter preferências. Esta equanimidade é central para a compreensão da morte. Isto não temos. Todos nós estamos por demais condicionados e se quisermos colocar um termo mais acurado diremos: estamos engaiolados, envoltos pelo prazer e pela aversão de sensações desagradáveis.
Recentemente, tive a oportunidade de observar um amigo comendo sopa de peixe: ele realmente a estava apreciando e após outra colherada ele disse: “não sei o que é isso,” então chamou o garçom e foi informado de que a sopa era de tripas de peixe! Você deveriam ter visto a mudança em seu rosto! Deixem-me ressaltar o que aconteceu em seguida. Antes que soubesse do que era feita a sopa ele a estava apreciando, mas diante daquela informação – tripas de peixe – sua mente recusou-se àquilo, embora a sua língua apreciasse.
Eis o que esta imagem está representando: a tendência que todos nós temos de ser uma vítima das preferências da mente por prazeres. A nós, possa parecer insignificante – que diferença isto faz? Por que não devêssemos apreciar os prazeres da vida? Então, temos aqui esse jogo dualístico que a mente começa a jogar. Significaria que agora devêssemos somente buscar por sensações desagradáveis? Deveríamos, de agora em diante, estar comendo justamente tripas de peixes? Veem como a mente cria armadilhas para essas duas noções da dualidade?
A resposta e o ensinamento representados nesta pintura são de compreender a morte, simbolizada pelo crânio e ossos com que ela se reveste e cada um precisa desenvolver essa compreensão pelo seu próprio paladar, que abrange a todas as coisas como elas são, sem a preferência, a ânsia e a aversão que balançam pelo pêndulo da ignorância.
Conseguem ver o trabalho das três forças? A preferência e a aversão dependem da ignorância. Sofremos por que ignoramos esta realidade; daí, a preferirmos evita-la. Através da compreensão da preferência e da aversão, podemos discernir a ignorância e ao conseguirmos discerni-la podemos adquirir o conhecimento.
Necessitamos desenvolver aquela capacidade de um paladar a um grau muito forte, uma vez que, ao estarmos face à morte, provavelmente estaremos também face à dor e a impotência diante do choro e lamento de nossos amados, bem como às lágrimas de nosso próprio coração, uma vez que não queremos deixar nossas crianças, parentes ou esposa.
Acontecerá. Observem em vocês mesmos quando desejam evitar tudo aquilo. Aquela aversão é a ignorância: é o que faz balançar o pêndulo do sofrimento em nossas vidas. Não evitem! Compreendam! Morreremos! Preparem-se! Comecem agora! Aquele treinamento é um processo de entendimento à aversão; é compreensão; é onde não existem preferências. Ao invés, é repouso em meio a tudo o que acontece, sem abalos.
Eis por que Samael Aun Weor referiu-se a precisarmos nos deixar levar pela corrente da vida. Ele disse isto, embora noutra afirmação ele se referisse a precisarmos nadar contra a correnteza. Ambas as afirmações são verdadeiras. Indo com a corrente da vida significa não devermos nos focar ou trazer a nossa atenção para as mudanças de nossas circunstâncias externas. O que significa que quando alguém nos serve um prato com comida e reagimos com ânsia ou aversão: isso é ignorância. Ao invés, devemos reagir com gratidão e comer, gostemos ou não daquilo que nos é oferecido.
Aquele prato representa não exatamente alimento, mas vida – carma. A vida está vindo a nos servir um prato de amargura, ao mesmo tempo vindo a nos servir um prato de doçura. Nossas reações determinam o nosso futuro. Precisamos entender a corrente da energia, o continuum ou o fluxo das forças que se movem através de nós. A partir do momento em que nascemos algo é posto a se movimentar – a energia é posta em movimento.
Visualizem em suas mentes uma bola de energia, luz, impulsionada através do espaço. Tal energia, tal luz, está constantemente mudando devido a estar agindo – e a cada instante efetivamente age, sendo afetada em sua direção, velocidade, ângulo – conforme esteja impulsionada. Visualizem isso, pois este movimento é de suas consciências. Esta seta ou feixe de luz não está se movendo através do espaço ou do tempo, mas se move na eternidade, sendo a medida de todas as coisas que vocês fazem.
Sendo assim, consigam imaginar que o seu corpo físico é um barco que se encontra energizado e ativado por este fluxo de energia, e olhem para o passado da terceira dimensão, imaginando em seu olho mental uma fita como de filmes antigos, onde cada quadro daquela fita seja um instante no tempo. O que aqueles quadros lhes permitem ver? Luz. Luz que passa através daquele filme. E na medida em que vão dando andamento naquela fita do filme há movimentos, e vocês se veem movendo-se através da vida. Entretanto, a fita do filme tem um começo e um fim – nascimento e morte. Cada quadro daquele filme é um momento de suas vidas que representa ação. A luz passa através de cada quadro do filme – onde ela vai sendo modificada – e através daquelas modificações vocês veem imagens.
Noutras palavras; a cada momento estamos transformando qualquer coisa. À medida que a fita do filme é movida através daquele raio de luz, temos a ilusão da vida. Sentimos e acreditamos que estamos vivendo aqui e agora, mas isso não é real. Sentimos que seja real, parece-nos real, porém não é. Quando morrermos viremos a entender isso. E quando despertos no plano astral, também entenderemos. Ao determos uma experiência em nossa alma, entenderemos que esta vida atual não é a vida real. Chegando a essa compreensão passamos a ver que a fita do filme que se move através daquele raio de luz – e que vem modificando todas as coisas – pode ser mudada.
A assustadora compreensão que sentimos quando nos envolvemos nesse esforço é de começarmos a nos dar conta de que, não somente aquela energia da consciência não morre – e já a temos experienciada antes noutros corpos – como também, basicamente, é a mesma vida a qual temos agora. Sei que a maioria de nós acha que em prévias existências fomos grandes mestres, tais como Joana d’Arc, Maria Madalena, João o Batista ou alguém como eles; entretanto, essa forma de pensar está em nosso ego.
Se quisermos saber o que éramos em prévia existência, olhemos para o que somos exatamente agora, pois somos o que então éramos, com pequenas diferenças. Intimamente, somos as mesmas pessoas, mesmo que nossa aparência física e personalidade sejam diferentes. Este fato não nos faz sentir melhores, mas é a verdade. A fita do filme começa a passar mais e mais. Esse é um fenômeno chamado recorrência, sendo uma lei da natureza.
Nossas tendências psicológicas se repetem, dia após dia, de existência a existência. E em cada nova existência elas se tornam ainda mais complicadas. As suas vidas não estão mais complicadas agora? Ou não estarão passando por fases bem complicadas? Essas fases tiveram conformações em nossas anteriores existências. Queremos mudar as nossas vidas? Então, não evitemos as complicações que nos chegam. Não evitemos prestar-lhes a devida atenção. Ao invés de evita-las, as compreendamos, pois é através da compreensão que chegaremos a estancar as repetições.
Figura 04.
Singhepa
Eis o que está representado nesta imagem. Singhepa é outro Mahasiddha. Este Mahasiddha está representado com um recipiente de água ou líquido na sua mão direita, tendo uma pena de pavão na sua mão esquerda e na cabeça, respectivamente, tem um crânio e um pergaminho ou escritura. Ele está representando que pela compreensão da morte – através da gnose ou conhecimento encontrado naquele pergaminho ou escritura, ao que ele está sempre atento – advém a habilidade para equilibrar as forças, que são os seus dois braços. O líquido, a água, é muito significativo. É também ambrosia, amrita, relacionada com a energia sexual, mas relacionada também com toda a energia. Isso é conhecimento; é Mayim, em Hebreu (literalmente “águas,” um profundo símbolo). Ele está derramando o líquido sobre uma mulher, uma discípula. Em outras palavras, ele está passando-lhe uma gota a cada vez de seu conhecimento.
Na sua mão esquerda ele tem uma pena de pavão que a segura com muito cuidado, num Mudra específico ou postura de dedos. A pena de pavão é um símbolo muito significativo em todas as tradições asiáticas. No hinduísmo, o pavão representa Krishna, Cristo. Porém, no tantra, o pavão é de outra importância. De acordo com a lenda, o pavão come veneno, que é a sua alimentação, e vejam o que ele faz com aquele alimento. Ele come veneno, mas cria a mais bela aparência de penas que qualquer outro pássaro.
Esse pássaro está relacionado com a capacidade de voar pelos ares da mente. O pavão representa um praticante do tantra que toma os venenos da vida – os amargores do desejo e da aversão – e compreende àquilo, transformando-os em beleza e amor. É este o significado do tantra. É um continuum ou fluxo de energia que aprendemos como a ele nos atrelar e transformar. Este é o grande ensinamento que a morte nos traz: transformar a morte em vida.
Todos os cristãos e judeus estão esperando pela ressurreição, ainda que nenhum deles haja inteiramente compreendido que para ressuscitar é preciso antes morrer, e que aquela morte não é física e sim psicológica. Todas as escrituras são unânimes em afirmar que nenhum assassino pode ir para o paraíso, como não poderá ir nenhum adúltero, fornicador, ladrão ou mentiroso. E se honestamente olharmos para o nosso interior, já cometemos física ou mentalmente todos aqueles crimes. Como então podemos estar indo para o paraíso sem que antes aquelas partes de nós morram?
Aquelas partes não morrem com a nossa morte física. A energia não pode ser destruída. A morte não destrói a energia: unicamente destrói o corpo físico e liberta a energia que se esvai daquele corpo. A morte não é o fim, mas um portal. Ignoramos o que seja aquele portal. Precisamos começar a nos conscientizar disso.
Tudo é modificado pelas leis bem como também a morte. E o que nos acontece durante a morte controlada por leis e não por crenças? Há milhões de pessoas que firme e profundamente acreditam que quando morrerem irão para o Paraíso. Porém, elas não sabem o que acontecerá até que aconteça, mas não voltam para nos contar.
Olhemos para a nossa própria vida e questionemos: a crença cria? A crença realmente tem esse poder? Não tem. O que tem poder é a ação. Se a mera crença nos conduzisse ao Paraíso, então todos os grandes santos e profetas de todas as tradições não nos teriam legado tantos ensinamentos. Tudo o que eles teriam a dizer seria: “somente creiam,”, mas não fizeram isso. Os cristãos acham que crermos em Jesus é tudo; e é o nosso ticket para o Paraíso. Entretanto, não há evidências disso. Jesus nunca falou assim.
“Entrai pela porta estreita: porque larga é a porta e espaçoso o caminho que conduz para a perdição e são muitos os que entram por ela. Porque estreita é a porta e apertado o caminho que conduz para a vida, e são poucos os que acertam com ela.” – Mateus 7.13-14
Ele não disse que todos os que acreditam irão para o Paraíso.
“Nem todo o que me diz; Senhor, Senhor! Entrará no reino dos céus. Mas aquele que faz a vontade de meu Pai que está nos céus. Muitos naquele dia hão de dizer-me: Senhor, Senhor! Por ventura, não temos nós profetizado em teu nome, e em teu nome não expelimos demônios e em teu nome não fizemos muitos milagres? Então lhes direi explicitamente: nunca vos conheci. Apartai-vos de mim, os que praticai a iniquidade.” Mateus 7. 21-22-23
Do mesmo modo, na tradição judaica, em "nenhum lugar’’ é dito que o crente irá para o Paraíso, mas “o justo.”
“Pois os braços dos ímpios serão quebrados, mas os justos o Senhor os sustem.” – Salmo 37-27
Quem é justo? Aquele que é livre do pecado, que não tem ódio, nem luxúria, nem preferência pelo materialismo ou apego às coisas como ouro e propriedade, tendo a alma completamente livre dos apegos, mirando unicamente à Deus. No budismo isso é belamente ensinado por uma história tradicional, do seguinte modo:
“'Um homem pediu ao Buda: "Por favor, meu pai está morrendo. O senhor pode rezar para ele, a fim de que ele vá para o Paraíso? O Buda vendo que o jovem era muito emotivo e impressionável, disse-lhe:
"Traga-me dois vasos, algumas pedras, alguma manteiga, alguma cera e uma longa vara.
Cheio de fé o jovem fez isso. Buda então o levou para junto da água de um lago ou rio, e disse: "Ponha as pedras num dos vasos e o sele com a cera. Ponha a manteiga no outro vaso e o sele com a cera.
O homem fez isso. Ele estava convicto de que Buda iria se desempenhar de um ritual para conduzir a alma de seu pai ao Paraíso. E Buda disse:
"Ponha os jarros na água. – E o jovem fez isso – então Buda disse:
"Tome da vara e quebre os vasos.
O jovem fez isso e após um momento a manteiga flutuava sobre a água e se foi. E Buda disse:
"O que determinará para onde seu pai irá é o que está nele, o que ele tenha feito. A manteiga sobe, as pedras afundam.”
Necessitamos buscar em nossas mentes ao que está em nós. As pedras representam materializações, pesos, densidades, orgulhos, ódios, ressentimentos. A manteiga representa a pureza da consciência que não se mistura: é o refinamento; aquilo que é luz. O que nos acontece quando morremos já está determinado por tudo o que está em nós. A qualidade daquele fluxo de luz em nossa mente é impulsionada através do espaço, da eternidade, em cada uma de nossas ações. Cada ação modifica a energia.
Ao agirmos segundo o nosso corpo, o coração ou pensamentos, ao portarmos ódio, modificamos a luz daquele momento por que o ódio não pertence ao paraíso. O ódio pertence ao Inferno; é uma energia infernal. A ação do ódio naquele pensamento, emoção ou ação física causa ao determinado tipo de energia transformar-se em armadilhas, por complicadas leis, significando que a energia se torna densa. Todas as vezes que persistimos em agir sob aquele ódio, o tornamos mais denso. O mesmo sentido – relativamente ao ódio – é também verdadeiro com a inveja, a gula, o ócio.
A cada instante em que aquela tira do filme sobre a nossa vida vai passando, nós modificamos a energia. Significa que o modo como morreremos está determinado pelo nosso exato estado mental atual. Se a morte nos chegar agora, nosso estado mental determinará a natureza de nossa morte. Pensam ser impossível que morrerão? Muitas pessoas acabaram de se deitar e morreram – como num estalar de dedos. Isto aconteceu com meu tio. Quando jovem, ele deitou-se e morreu. Ninguém esperava por aquilo. Na minha família, cada caso de morte foi inesperado. Nenhuma pessoa de minha família esteve aguardando a morte. Elas foram pegas de surpresa e naquele choque, pelo sofrimento e incertezas, todos aqueles fatores modificaram as consciências.
Os últimos momentos em que uma pessoa esteja morrendo definem a sua morte. Eis por que o gnóstico treina para uma perfeita morte: para estar preparado: pronto para que a morte não lhe seja uma surpresa, mas um portal bem vindo. Motivo pelo qual treinamos constantemente, mirando “um sabor”.
Quais sejam as experiências que nos advenham não as aceitemos nem as rejeitemos, mas as compreendamos: transformemos as impressões. Se alguém nos critica, transformemos aquilo em amor. Sempre que alguém nos enalteça, transformemos aquela manifestação em amor. Não personalizemos, ao invés, compreendamos a quem nos tenha dito tais coisas e os efeitos das palavras em nós. Quando a vida nos trouxer amargores não reajamos com aversões: compreendamos, recebendo aquelas impressões e aceitando o nosso carma. Se a vida nos der recompensas, não nos encantemos, mas recebamos tudo como carma, sabendo que as coisas estão sempre mudando – hoje são boas, amanhã são ruins.
Precisamos estar sempre atentos, na crista da onda, a fim de receber tudo equanimemente, com “indiferença.” E essa indiferença não seja a indiferença do não se importar, mas a equanimidade que se importa sem apegos. É como tratar com uma criança. Se formos um pai saberemos que em ocasiões seu filho está muito alegre e dá-lhe abraços e beijos, e nos próximos minutos ele está bravo, gritando e batendo-lhe. Se reagirmos, pioramos as coisas. Se ficarmos zangados, batermos na criança ou se a ignorarmos também pioramos as coisas. Em ambos os casos, precisamos responder com equanimidade e amor. Esta é a atitude precisa que necessitamos ter na vida para o que venha acontecer, ou seja: responder com equanimidade e amor.
Isso requer treino. Estamos não somente aprendendo como transformar energia num certo instante para coloca-la em ações de forças positivas, que elevem a alma, mas também nos treinando a fim de que no momento em que a morte nos chegue – seja isso de modo agradável ou desagradável – estejamos num estado de equanimidade para não sermos surpreendidos. Não que venha ela sorrateira, mas que a vejamos chegar e com sorriso a aceitemos. Esta capacidade aplicada é o que nos traz a habilidade de usar a morte como um portal para transformá-la, e não trata-la do modo como outras pessoas a tratam.
Em próximas palestras falaremos sobre o que nos acontece quando morrermos. A morte é complicada. Não é fácil entende-la uma vez que estamos somente tentando vê-la conceitualmente. Recomendo firmemente que meditem diariamente sobre vida e morte. Estaremos agora falando sobre uma variedade de práticas que podemos pô-las em ação. Usem-nas, por que lhes trarão frutos. Vocês entenderão muito mais. Não é verdadeiramente possível explicar a morte numa palestra ou livro. É como a vida: temos de experienciá-la. A morte não pode ser compreendida através de conceitos. Lembram-se do exemplo que lhes dei sobre quão complicada e expansiva é a vida? Com a morte acontece o mesmo; é também muito complicada, muita coisa acontece, porém tentaremos aborda-la em seus princípios.
Figura 05.
Renascimento
Esta imagem é outra pintura tibetana mostrando casais engajados em ato sexual, havendo aqui dois exemplos distintos. Nas nuvens acima, há um ser e sobre um dos casais há outro ser. A pintura está mostrando uma escolha que temos do que nos acontece quando morremos.
Sabemos que nas várias teorias sobre o mundo espiritual, muitas pessoas hoje acreditam na crença de que “escolhemos as nossas vidas.” Muitas acreditam que quando morrermos iremos para algum lugar paradisíaco, onde vamos escolher nossa próxima vida e ao nos olhar em algum espelho da existência, diremos: “sabe de uma coisa, acho que eu quero nascer aqui e ter esse e esse tipo de vida e precisar dessas coisas para a minha alma.” Essa teoria é toda mentira. É tudo fantasia inventada para vender livros e ingressos para convenções. Não existe nenhuma evidência sobre esta teoria em qualquer escritura, em parte alguma do mundo. Precisamos confiar nas escrituras; nos ensinamentos de autênticos mestres e não de pessoas que vendem livros tentando nos conduzir a alguma conferência.
A realidade é que a passagem através da morte para outra vida é extremamente complicada e difícil e se vocês querem saber como é isso, vejam o que lhes acontece quando dormem. Se não tiverem consciência do que lhes acontece a partir do momento em que caem no sono, até o momento em que acordam pela manhã, também não terão consciência do que lhes acontece entre vidas.
Se quiserem saber de sua próxima existência, de seu próximo corpo, necessitam estar conscientes do que lhes acontece quando estão dormindo fisicamente: precisam estar despertos. Se estiverem despertos a noite inteira, terão então a oportunidade de estar despertos após a morte. Só depende de como passem através do portal. Se passarem através do portal trazendo um trauma, identificado com a causa de sua morte ou portando apego a sua família, aos seus filhos, ao seu carro ou à riqueza que tenha acumulado, estando agora a perdê-la – aqueles apegos eventualmente determinarão o seu estado tão logo tenham cruzado o entremeio. Eis o motivo de precisar treinar duro todos os dias. Comecem agora. Comecem desse modo; assim poderão escolher quando estiverem no entremeio; poderão influenciar. Noutras palavras: poderão negociar com seus carmas.
Como podem ver, o carma não é uma lei mecânica fixa – é negociável – precisamente através da ação, da energia e movimento. Começa por estarmos despertos. Se estiverem com a consciência adormecida não podem negociar. Então: quando eu digo que vocês têm uma escolha aqui, não é como se alguém no paraíso fosse tocar uma campanhia: ding, ding, ding, ding! “Vocês chegaram ao Paraíso! E podem escolher a vida A ou B! Qual delas querem?” Permanecer entre vidas não é uma viagem ao paraíso ou um concurso. Ao invés, é como uma escolha que vocês tenham de imediato. Essa imediata escolha é estar atentos ao momento atual – aqui e agora – ou divagar, fantasiar e sonhar acordados. Estarão fazendo aquela escolha a cada instante.
Na maior parte do tempo, fantasiamos e sonhamos acordados, nos tornando sem nenhum proveito para o nosso estado psicológico, jogando com nossa mente através de conceitos, recordações e desejos para o futuro. Isso é tudo fantasia, ilusão. E se vocês estão agora a fazer isto diariamente, estarão também fazendo todas as noites. Eis por que estão sonhando no trabalho, fazendo sempre as mesmas coisas durante o dia. Eis por que vocês estão sonhando com seus pais, suas crianças, suas irmãs e irmãos. E eis por que estão sonhando os mesmos sonhos todas as noites. Motivo pelo qual não se lembram de nenhum sonho, pois durante o dia estão irreconhecíveis, sonolentos, inconscientes.
Se quiserem despertar conscientemente durante a noite, enquanto os seus corpos físicos estejam dormindo, despertem agora, pois ainda estão em seus corpos físicos. Aquele constante e persistente esforço para ser consciente – estar presente aqui e agora – se tornará parceiro do como experienciem a noite, naturalmente. Treinem a si próprios, visto que o treinamento reside na consciência e quando treinarem isto à noite, terão o potencial de fazê-lo quanto morrerem.
Este é o treinamento. Comecem aqui e agora no corpo físico. Estendam este esforço noite adentro com a prática chamada o Sonho Yoga. Sei que as pessoas geralmente pensam que o Sonho Yoga é sobre ir aos templos para obter experiências com os mestres. Essa é uma parte daquilo, entretanto não é a principal razão para a prática do Sonho Yoga. A principal razão está em que estejam preparados para a morte, de modo que, quando mortos, venha-lhes poder passar conscientemente através do portal, e uma vez as suas almas despertas naquele mundo, possam negociar os seus carmas.
Buda trouxe um ensinamento muito profundo sobre isto, mas que tem sido terrivelmente mal interpretado por muitas pessoas. Disse o Buda Shakyamuni que é algo muito precioso e raro nascer como uma alma humana. Deveríamos valorizar esta oportunidade. É tão raro como é este exemplo: imaginem um oceano. Entendam quão vasto e profundo é o oceano, quão enorme é. Agora imaginem longe, lá no meio do oceano, há uma pequena peça de ouro num cordão e casualmente uma tartaruga emerge do fundo e coloca o seu pescoço através daquele cordão. Eis como as probabilidades estão contra o que temos agora – um corpo físico.
Algumas pessoas interpretaram isto dizendo que é muito raro nascer como um corpo físico. Discordamos. O que a história ilustra é a matemática, as possibilidades. Nascemos dentro de corpos físicos por evolução e carmas, porém a excepcionalidade disso em contraposições a outras existências, a outros tipos de corpos, a outras vidas que já tivemos é a grande diferença. Imaginamos quantas vezes nascemos como um mineral num corpo mineral, como uma planta num corpo de planta, como um animal num corpo animal ou em estados intermediários dentre aqueles corpos. Milhões e milhões e milhões de vezes. É uma janela muito estreita de oportunidades quando se está num corpo humano, mas essa é a janela para realizar o nosso objetivo, que é nos iluminarmos; alcançar a natureza da realidade.
Vejam que essa palavra “realizar” é experienciar a realidade, vê-la. Não teorizar, não conceituar. Vê-la. Conscientizar. No corpo humano que agora possuímos é que podemos fazer isso. Esta vida é extremamente preciosa, mas não temos qualquer consciência disto. Desperdiçamos muito tempo com coisas estúpidas: fofocas, modas, shows de TV, amigos nocivos, atividades inúteis. Esta vida é extremamente preciosa, mas não temos qualquer consciência disto.
Buda expressou algo muito profundo acerca disto: “Se imaginarmos que nossa vida tenha em torno de cem anos, disse ele: “metade da vida gastamos dormindo, dez anos são gastos na infância. Vinte anos são perdidos na velhice. Desses vinte anos: dores, tristezas, sofrimentos e agitações eliminam muito tempo e centenas de doenças físicas destroem muito mais”.
Vejamos toda a matemática. Se tivermos a sorte de viver cem anos, o que é raro, metade daquela vida é gasta no sono. Isto nos leva cinquenta anos. Buda disse que dez anos são gastos na infância, por que não podemos nos auto realizar se estivermos abaixo da idade de dez anos; a menos que já sejamos um grande mestre. E ainda mais, na atualidade, a maioria de nós permanece completamente imatura até chegar aos vinte de idade, mas aos dez anos de idade não temos nenhum senso de responsabilidade. Penso que na Ásia é de alguma forma diferente. Minha esposa é asiática. Quando ela tinha sete ou oito anos, ela cozinhava diariamente para uma família de doze, como também realizava muitas outras tarefas e as escolares.
Eu nunca conheci crianças americanas ou europeias com tal maturidade e senso de responsabilidade. Mesmo que já estejam nos seus vinte anos elas são muito preguiçosas. Elas não fazem outra coisa além de buscar por distrações. Todas querem Facebook, TV ou vídeo games. Então podemos considerar que esses dez anos da infância, realmente hoje em dia representam vinte anos. Olhem suas vidas e podem constatar. Quando vocês cresceram e começaram a tratar as coisas com seriedade? Provavelmente nos seus vinte anos. Então, são setenta anos perdidos de nossos máximos cem anos.
Outros vinte anos são perdidos na velhice. Quando estiverem velhos, todos vocês conseguirão se desempenhar com tudo o que o dia requer? Terão todos os tipos de dores e sofrimentos; suas mentes estarão consolidadas, muito cristalizadas nos hábitos e será bem difícil pensar com clareza. Daí que a velhice não é condutora de energia espiritual avançada.
Nesse sentido, dos anos remanescentes, Buda disse vinte anos, mas penso que atualmente é menos que dez devido a nossa imaturidade, na qual tristeza, crítica, dor e agitação eliminam muito do tempo e da energia. Olhem para as suas vidas. Por quanto tempo vocês passam tristes, depressivos, críticos, com dores ou agitados? É assim como alguns de nós vive diariamente. Então, no que nos resta do tempo estamos fisicamente doentes. Quando nos sentimos aflitos com esses estados, perdemos todo o nosso tempo e energia; e não avançamos espiritualmente.
Onde, pois, naquela equação há tempo para termos equanimidade psicológica e praticar espiritualidade? Uns poucos segundos? Umas poucas horas numa vida inteira? Não é muito. Para chegar àquilo não sabemos quando iremos morrer. Podemos não alcançar cem anos. Entendem o que estou tentando comunicar-lhes? Motivem-se. Acordem. Prestem atenção para as realidades da vida. Isto não é um jogo.
A vida não é exatamente sobre obtermos mais brinquedos e mais posses. Para o gnóstico a vida é obter menos. Temos hoje em dia este fenômeno cultural de querer nos tornar “alguma coisa mais” e recebemos essa influência tão logo tenhamos nascido. Nossos pais querem-nos médicos, grandes advogados ou políticos e se adentrarmos na vida espiritual, queremos ser um grande professor, um grande mestre, um grande escritor. Queremos “mais, mais e mais.” Isso é totalmente ego.
Mas quando nos tornamos mais sérios sobre nossas práticas espirituais, o que realmente necessitamos é nos tornar menos. Eis o motivo de na prática tradicional as pessoas terem renunciado a tudo. Elas desistiram de tudo, não possuindo nada ou de qualquer coisa que lhes tenha sido dada.
Quando os tibetanos foram perseguidos, sendo mortos e expulsos do Tibet, eles lidaram profundamente com isso. Tenho conversado com algumas pessoas chegadas da Índia, ainda com incertezas sobre seus futuros, por que não tinham lugar para onde ir e sendo refugiados não possuíam nada; tudo delas lhes fora tomado, porém levavam tão a sério suas práticas que mesmo quando indianos locais davam-lhes chá – que eles amam tomar – os tibetanos tomavam daquele chá e o ofereciam para mais alguém.
Eles não possuíam nada, carregavam somente suas roupas às costas, mas a devoção à prática era tão séria que não possuíam nem mesmo um tablete de chá. Elas diziam: “não, não, não, grato! Dê isso para outra pessoa. Isso é seu, aprecie. Não queremos ter nenhum apego, podemos morrer hoje. Não queremos apegos a nada, pois no momento da morte não queremos ficar pensando “‘Ó, meu chá”!
Eis o outro caminho onde estamos. Pensamos sobre insignificâncias, coisas tolas no momento da morte: todos nós. Quantos apegos possuímos? Somos apegados às roupas, ao dinheiro, às pessoas, a lugares, à muitas coisas. Cada um daqueles apegos representa o potencial de corrupção em nosso processo de morte.
Se quisermos chegar à perfeição não devemos ter apegos a nada, somente a Deus. Nossa atenção deve ser completa, 100% a fim de alcançar uma união com a clara luz, que é Deus – o Absoluto. Significa, naquele momento da morte, que se nos lembrarmos: “Ah, deixei minhas chaves no móvel! Não paguei a conta da luz!” Isso virá corromper a nossa morte. Sei que soa tolice, mas acontece. Quando se morre, coisas estúpidas vêm à mente, coisas que fazemos agora.
Não pensem que estarão habilitados a controlar todas as coisas que lhes acontecerão psicologicamente quando morrerem. Na maioria dos casos é uma experiencia muito traumática e difícil. Necessário observar muita preparação para que aquilo não deva acontecer-lhes.
O que estamos tentando fazer neste processo é evitar o que é mostrado naquela pintura do casal tendo uma união sexual. Em rápida síntese, o que acontece quando morremos é que a energia projetada através de nosso tempo de vida é uma massa de causa e efeito: é luz, consciência, projetada através da eternidade. E no momento da morte, aquela energia passará por uma transformação, a fim de iniciar uma nova fase – é tudo um grande ciclo.
O portal é poderosamente influenciado pelo estado como se comporta a nossa mente: pelo que pensamos e sentimos ao morrermos; por isso, nas antigas tradições, na preparação de alguém para a morte, era muito importante o modo como os familiares eram orientados, pois se estivessem lamentando: “oh, ele está morrendo, não vá!”, a pessoa prestes a morrer não teria equilíbrio, ficando perturbada.
Se encontrarem ou estiverem tratando uma pessoa prestes a morrer, não façam aquilo. Elas necessitam de amor e encorajamento. Necessitam de paz, serenidade e força, mas se vocês estiveram chorando, apegadas e em sofrimento, corromperão os procedimentos da morte. Falaremos sobre isso com detalhes em futura palestra.
Se nos momentos de suas mortes vocês tiverem esse tipo de pensamento, tal como se lembrar de seus carros que amam; isso lhes afetará. Tendo apego a uma pessoa, à esposa, a uma criança sobre quem fantasiaram durante as suas vidas; se essas coisas surgirem em suas mentes, prejudicarão o pessoal processo da morte. Se morrerem zangados ou temerosos, essas qualidades modificarão a velocidade e função daquele fluxo de luz, uma vez que elas passam ao permeio.
Eis o que está representado nesta pintura. Esta alma – que não é desenvolvida – é um buddhata, o embrião da alma ou Tathagatagarbha, a essência; motivo pelo qual é representado exatamente como uma cabeça: um ego, um “eu”, alguém não desenvolvido que está sendo atraído magneticamente ao ambiente psicológico desse casal.
É magnético, não é uma escolha. Aquela alma não diz: “oh, parecem ótimas pessoas. Eu quero viver com elas em suas casas.” Aquela alma é levada lá por magnetismo, por carma. Existe uma afinidade energética, cármica, entre a disposição psicológica daquela pessoa desencarnada e aquele casal, de modo que, no momento da concepção, a ligação é feita e aquela alma nasce na família por afinidade psicológica.
Significa que, nossa família, aquela que temos agora, está enraizada nesta lei; simplesmente causa e efeito – afinidade psicológica. Se observarmos as famílias podemos constatar isso. Membros de uma família tendem a ter hábitos psicológicos muito semelhantes. Costumamos pensar que é pelo fato de crescerem juntos. Mas não. Nasceram com isso, é cármico.
Por outro lado, esta pintura mostra outro casal e acima dele, nas nuvens, está um ser realizado, desenvolvido: é uma alma, um iniciado, uma pessoa serena. Esta pessoa está desperta e pode escolher vir a nascer ou não, uma vez que está negociando o seu carma. O que ela está fazendo é algo chamado “fechando úteros,” e isso está representado na próxima pintura.
Figura 06.
Fechando Úteros
Este é um iogue em meditação no processo de nascimento. Vemos uma criança emergindo do útero de uma mulher. O iogue traz a sua mão em ato gentil, mas demonstra estar resistindo àquilo que é chamado “fechando úteros.” Esse é um ensinamento tântrico do qual falaremos, relacionado essencialmente com a habilidade do iogue em negociar o seu renascimento. Ele olha para cima, demonstrando estar contemplando o alto, não parecendo enlevado, mas em equilíbrio, consciente; não atraído pelo magnetismo do nascimento.
Nas próximas poucas palestras falaremos com detalhes sobre as muitas facetas da morte: a morte física, a morte mística e a morte espiritual. A morte é algo muito profundo e se vocês estiverem interessados em aprender mais sobre o assunto, meditem. Podem ler muitos livros se quiserem, entretanto reunirão muitos conceitos sobre a morte. Mas se realmente quiserem saber, meditem diariamente sobre a proximidade de suas próprias mortes.
Mas o que isso significa? Como meditar sobre isso? Visualizem o processo de morte. Não visualizem um funeral e toda a parentada chorando por que isso iria unicamente fortalecer o seu orgulho. “Oh, eles vão sentir muito a minha falta. Eu os amo!” Fazendo assim não é um tipo da meditação a que me refiro. Refiro-me a meditar sobre aquilo que vocês não querem meditar: a morte verdadeira. O corpo que vocês ocupam agora em processo final. Visualizem assim: utilizem algum tempo nisso; imaginem e observem o seu estado mental e como evitar não querer manobrar com esta situação, se suas mentes desejam permanecer distraídas a pensar sobre coisas agradáveis. Concentrem-se. Visualizem não somente a morte do corpo, mas a sua decadência.
Raramente somos conscientes de que os corpos que possuímos são por demais impermanentes, muito fracos e cheios de todos os tipos de enxertos verdadeiramente grosseiros. Este tipo de meditação pode trazer um impacto muito profundo para a nossa consciência, não somente de uma grande motivação para um trabalho árduo como também a nos dar uma grande serenidade, dissipando o medo e cultivando enorme compaixão, uma vez que, quando realmente compreendermos que o nosso próprio corpo virá morrer – sem sabermos quando – naturalmente passaremos a entender que o mesmo fator é verdadeiro para todos, pois ao olharmos as outras pessoas tomaremos consciência de que elas virão também morrer.
Começaremos a pensar: “Devo trata-los bem. Devo trata-los com amor e não com ódio, crítica ou sarcasmo; não com crueldade do modo como tenho feito, mas com grande ternura. Se conhecermos alguém associado com isto, que esteja próximo de morrer, não devemos ser maus com ele. Não devemos pragueja-lo, dirigir-lhe palavras grosseiras, sermos rudes com ele ou ignorá-lo. Devemos ser gentis, muito doces. Devemos proceder sempre desse modo, tratando as pessoas com muita compaixão, paciência e muito amor. Esse modelo de meditação sobre a morte não é mórbido nem grosseiro ou debochado. Eis por que Samael disse que pela morte podemos aprender todas as coisas, por que somos capazes.”
PERGUNTAS E RESPOSTA
01. P. – Caso morramos antes de ter a chance de [matar?] nossos egos, e se tivermos outra oportunidade de voltar, como armazenar a informação do caminho a fim de continuar a trilhá-lo em nova vida?
R. – Falaremos bastante e especificamente sobre isso em subsequentes palestras, mas uma breve resposta é simplesmente isto: nossos caminhos mentais nos conduzem a níveis profundos. Experienciamos agora que nossa vida diária é extremamente superficial: a personalidade, o intelecto e algumas qualidades emocionais. Ao morrermos, esses aspectos também morrem. Não levamos nossas personalidades conosco para uma vida material posterior. Em próxima vida construiremos uma nova personalidade.
Significa que se estamos estudando religião ou espiritualidade, mas não nos tornamos conscientes daquela espiritualidade, então todas as informações reunidas por nós, permanecem superficiais e quando morrermos esqueceremos tudo – isto é o que acontece com a maioria de nós. Mas o conhecimento do qual nos tornamos conscientes, aqueles se tornaram parte da alma – profundamente – e não podem nunca ser descartados não importando quantas vezes venhamos renascer, quantas vezes tenhamos morrido. Aquele conhecimento é nosso e não pode nos ser tomado. Isso nos conduz a entender certos tipos de pessoas que já nasceram com gamas de conhecimento. São pessoas que detém um tipo de conhecimento interior profundo.
Algumas vezes, isso é ainda de egos – egos muito aprofundados – e temos o caso, por exemplo, de certas pessoas que se tornaram espiritualmente conscientes da espiritualidade e, desde logo, em períodos da infância, demonstram. O entendimento muito aprofundado é da alma que se tornou consciente do conhecimento daquele nível. Todos nós temos algo daquilo em certo grau, uma vez que nos tornamos conscientes sobre o conhecimento de diferentes coisas. Se quisermos manter este ensinamento e não o esquecer em nossa próxima vida, necessitamos nos tornar profundamente conscientes do caminho. Isto não acontece através da memorização.
Não é como vestir uma roupa e frequentar certa escola e nem seguir alguém nele acreditando ou pagar débitos. É consciência; compreensão; estar consciente; acordado; experienciando e conhecendo pela experiência. Isso não nos vem através de crença ou teoria, e sim através do trabalho. Se quiserem isto, meditem. E muito. Estejam bastante motivados – pois a compreensão sobre a morte é um grande poder motivador. Não por morbidez: e me permitam fazer um comentário sobre isto.
Existem muitas pessoas que estudam e ensinam meditar sobre a morte, tornando-se muito mórbidos, obscuros. Isso é um erro. Observando todas aquelas imagens que lhes mostrei, concluirão que nenhum daqueles mestres é mórbido. Inclinamo-nos pensar da meditação sobre a morte ou sobre anjos da morte, imaginando sempre um ceifador muito alto, pessoa magra toda vestida em preto, com a tez muito pálida.
Anjos da morte ou mestres da morte não aparentam assim. Os anjos da morte – sobre quem falaremos – são belos. Quando em seus ofícios vestem-se com aparência espectral, assustadora, mas isso é simbólico; se deve ao seu uniforme. O ser real, o anjo real é de extraordinária beleza e precisamos compreender aquelas coisas; não unicamente nelas acreditando, aceitando-as ou rejeitando-as
02. P. – Consciências reencarnam também simultaneamente em universos paralelos?
R. – Em essência, a vida é muito mais complexa do que dela consigamos conceituar. Quando usamos os termos consciência, alma, psique não estamos realmente falando sobre uma só coisa, mas de um movimento: algo que está vivo, que se move e não é tridimensional.
Exatamente agora somos todos multidimensionais, embora sejamos só conscientes da terceira dimensão de modo muito superficial, e mesmo assim, totalmente sonolentos, sem a real consciência disso. Entretanto, neste real momento, nossa consciência, matéria e energia penetram através das sete dimensões. Daí que, a resposta é tanto sim quanto não. A consciência está simultaneamente em múltiplas dimensões naquilo que possamos chamar de dimensões paralelas, sem que tenhamos consciência deste fato.
03. P. – Quando ofertamos a outros, sendo generosos com eles, dando-lhes das coisas que possuímos, haverá o perigo de nos tornarmos ligados a eles? Pode isso atrapalhar os seus trabalhos por os confortarmos e doar-lhes..., pode isso postar-se em detrimento deles de alguma forma? E ficarem condicionados a um prazeroso conforto?
R. – Certamente, qualquer um pode condicionar-se a isso, mas qual é a opinião de vocês? Ter compaixão ou ser indiferente? Temos de nos conduzir e ensinar pelo exemplo. Temos de viver do melhor modo que saibamos. Por exemplo: ensinamos gnose, desses conceitos, teorias e práticas para as pessoas coloca-las em exercício com intuitos - porém a vasta maioria das pessoas não os realizará.
Na verdade, podemos dizer com segurança que a maioria das pessoas que ouve esses ensinamentos dará as costas. Então, qual é o carma para isso? Quem é portador do carma? É a pessoa que reage e não o professor. O resultado final é o que temos para auxiliar e esse final é sempre determinado pela ação ou inação.
Precisamos sempre estar fazendo esforços a fim de perceber qual é o melhor caminho para sermos de ajuda, a fim de aliviar o sofrimento; auxiliar a qualquer um, não exatamente a nós, pessoalmente, mas a qualquer um. Isso não nos pode chegar através de uma “regra de ouro,” de “sempre fazer A ou sempre fazer B.”
A verdadeira resposta estará sempre mudando, sempre em movimento. Num determinado momento, o certo é fazer o que está à esquerda e noutro momento o certo a fazer é o que está à direita, uma vez que as coisas estão sempre se alternando. Ou seja: em alguns momentos, precisamos ser indiferentes com uma pessoa. Em outros momentos, necessitamos ser aquilo que é chamado negativo, rigoroso ou severo, e adiante necessitamos ser doces, mas sabendo que o modo certo é algo que somente o Ser pode mostrar-nos através da intuição, da experiência. Estejamos sempre à beira de todas as coisas, sendo perceptivos e abertos. Eis como aprendermos quando é o certo, quando não é o certo e quando precisar mudar.
04. P. – Se o poder da imaginação pode se materializar em nossa transcorrente realidade, pode ser ou nos será perigoso meditar sobre a morte dos órgãos?
R. – Deixem-me prefaciar a resposta que pretendo dar-lhes: há práticas que provavelmente ligar-se-ão à superficialidades, relacionadas à transferência de consciência, que se refiram ao poder que move a alma para um novo corpo, bem como haverá semelhantes tipos de atividades que praticantes avançados podem delas se utilizar. O que tais técnicas demonstram é o poder da energia da consciência que é colocada em movimento.
Em outras palavras: torna-se possível, através de certas técnicas, retirar a alma de um corpo e ajustá-la noutro corpo a fim de que aquele corpo morra. Podemos chamar a isso de um tipo de suicídio ou de um tipo de renascimento. Podemos também chamar de qualquer coisa que queiramos, mas é uma técnica que existe.
Isso demonstra o poder da imaginação, o poder da consciência. Do mesmo modo, podemos tirar energia do poder da imaginação e materializar coisas que não sejam físicas. Há muitos exemplos assim. Alexandra Did-Neel, uma francesa que viveu no Tibet, aprendeu essa técnica e operando-a juntamente com outros iniciados, materializaram um ser que eles ali imaginaram. Eles criaram uma entidade semi viva e aquilo se tornou um problema para eles, com consequências que não foram boas.
A questão então é: podem esses exercícios interferir ou trazer prejuízos ao organismo físico, se estivermos visualizando o processo da morte? Em certos casos sim, mas eu não estou lhes ensinando sobre àquilo. Para que realmente interferíssemos e prejudicássemos o nosso corpo, precisaríamos trabalhar de modo muito intenso com esta prática, combinando-a com certos tipos de mantras e outras energias.
Não creio que alguém aqui esteja operando naquele nível. Trabalhar com visualização para compreender certamente os ajudará e se estiverem preocupados sobre um potencial de prejuízo, façam esta prática do modo como devem fazer qualquer outra prática. Primeiramente orando: “Por favor meu Deus interior, meu Pai interior, meu Buddha Interior, minha Mãe Divina, ensinem-me através desta prática; mostrem-me, ajudem-me compreender, ajudem-me aprender.” Então liguem-se na prática e estarão ótimos. Fazendo esta prática com a intenção de parar um órgão, vocês conseguirão e também conseguirão mostrar a si próprios como isto funciona.
Mestre Samael ensinou-nos um exercício com o qual aprendemos a retardar os batimentos cardíacos, podendo até parar com nosso coração. Vocês podem fazer aquilo se tiverem essa intenção. Contudo, praticando corretamente não morrerão e entrarão num tipo de estado psicológico bastante vantajoso.
O resultado de quaisquer práticas está em nossas mãos. Cada prática que damos, cada exercício dado, pode trazer diferentes resultados, dependendo de como usá-los, mais especialmente a magia sexual. O maior poder de qualquer prática está em que, provavelmente, a maioria das pessoas que se utiliza daquilo se prejudica por que enveredam nos exercícios com luxúria, não transformando. Porém, felizmente, com o tempo, com experiência e maior compreensão, elas param de agir com luxúria e começam a obter bons resultados. Então, sim, cada prática tem um potencial, dependendo em como a energia é usada.
05. P. – Como nos afeta ficarmos condicionados à morte através de filmes, vídeo games e desenhos animados?
R. – Nossa perspectiva cultural da morte nos está, em minha opinião, dessensibilizada de sua realidade, de modo que, agora, em nossas personalidades, nos inclinamos a pensar na morte como um sofrimento inconsequentemente liberto, visto que vemos pessoas morrer na TV, no cinema e em vídeo games e nenhuma forma de sofrimento parece acontecer com isso.
Somente diz-se: “Ó, sim, eles morreram, ok.” Não sentimos aquilo. Não temos compreensão sobre aquilo; entretanto, quando alguém efetivamente morre, nos sentimos completamente oprimidos. Entramos num estado alterado em que não conseguimos manobrar com a realidade e isso nos mostra a fundamental ignorância de nosso ponto de vista sobre a realidade da morte. Falta-nos a realidade.
Noutras culturas isso não acontece. Por exemplo: em algumas culturas asiáticas e algumas da América do Sul, a morte é parte diária da vida. A morte é algo visível. Lá, quando alguém morre a morte dela é vista, não evitada, nem ocultada. Aqui, no Oeste, a realidade da morte é ocultada. Vemos que quando alguém morre num filme ele faz, “ahhhh!” e deita, e quem o assiste permanece quieto. Desculpem-me, mas a morte não é desse jeito. Quando uma pessoa realmente morre é doloroso ver ou ouvir aquilo. Não é como na TV. A morte pode ser dolorosa e perturbadora, porém no Oeste o conceito não é esse devido a estarmos por demais condicionados e programados pela mídia. É algo sobre o quê precisamos meditar. Necessitamos ver melhor a realidade da morte.
Nas tradições tântricas, esse professor, Padmasambhava (Guru Rinpoche), como parte de seu treino, passou períodos de tempo meditando sobre lugares onde corpos sem vida são colocados, que, dependendo da posição social ou status de uma pessoa, ali será o seu lugar. Pessoas não sendo muito ricas terão uma pilha de madeira e podem não ser completamente incineradas, restando partes dos seus corpos. Os mais pobres podem não ser incinerados e serão comidos por animais e seus restos passam a ser deteriorados pelos elementos.
Padmasambhava meditou nesses lugares, indo naqueles ambientes, sentando-se e contemplando a morte. Aquilo não era exatamente estar “frio,” conforme as pessoas agora pensam, quando somente caminham pelo cemitério. Ele assim fez a fim de compreender a impermanência da morte e pela sua compreensão da morte, observação e o entendimento daquela realidade, foi de total e incrível compaixão e poder como mestre. A nós soa como terrível, repugnante e horrível, porém é real.
Cada corpo humano que tenhamos visto morrerá, virá deteriorar e todos os fluídos, vísceras e órgãos se dispersarão. Soa-nos grosseiro, mas é fato. Ademais, quando realmente começamos a entender isso, constatamos estamos sempre desejando que cadáveres caminhem por aí. Sem dúvida, somos todos cadáveres, mas não nos damos conta disso. Todos aqui serão cadáveres. Todos são enxertados com impurezas: pus, excrementos, sangue, urina, todos os tipos de fluidos e tecidos que cheiram mal, com texturas grosseiras, e somos portadores de tudo aquilo, o tempo inteiro, onde estivermos. Vocês se conscientizam disso? De que estamos sentados num saco de excrementos? Por que pensar que somos tão auspiciosos se cheiramos mal? Cheiramos tão mal que temos de usar perfumes e nos banhar sempre por causa do mau cheiro que exsuda de nossos corpos. Estamos evitando a verdade.
Conheçam a realidade desse corpo. Não é tão bela quanto pensamos, mas necessitamos dele. Necessitamos dele para sermos saudáveis, fortes; precisamos cuidar dele e nos prepararmos de modo que quando morrermos possamos deixa-lo conscientemente e, afortunadamente, conseguir um corpo melhor, talvez um que não cheire tão mal.
POR UM INSTRUTOR GNÓSTICO
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Sobre o
autor - Instrutor Gnóstico
Os instrutores que desenvolvem as palestras e os cursos são voluntários com larga variedade de conhecimentos. Cada um deles têm anos de experiência, ensinando e trabalhando com práticas e exercícios que despertam a consciência. Uma vez que os objetivos do dharma, yoga ou gnose sejam seguir o Ser Interior, focar na divindade e não em personalidades terrestres, as palestras permanecem anônimas e não se difundem seus nomes, rostos ou informações pessoais. Eles não possuem títulos ou identidades espirituais; não aceitam seguidores e vivem suas vidas anonimamente, como qualquer outra pessoa na sociedade.
Tradução Inglês / Português: Rayom Ra
http://arcadeouro.blogspot.com
Fonte:https://glorian.org/learn/courses-and-lectures/death/introduction-to-death